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opinião

Jully Heyder da Cunha Souza: "Que advocacia a OAB vem moldando?"

Advogado, Ex-Secretário-Geral Adjunto da OAB/MS

Redação

22/11/2014 - 00h00
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Jean Jacques Rousseau (1712-1778) marcou a história ao propor uma radical ruptura com o absolutismo imperante em sua época, defendendo uma moderna ideologia republicana e, com efeito, legando para a posteridade uma nova forma de pensar a sociedade e o Estado. Mas dentre as muitas ideias preconizadas por Rousseau, ainda em vigor na atualidade, uma delas chama especial atenção. Em seu “Discurso sobre a desigualdade” (1754) o filósofo afirmou que: “a sociedade poderia ser moldada por suas instituições políticas”. De fato, de Rousseau para diante, estamos sempre a buscar um modelo de Estado que possa melhorar a vida em sociedade e que bem represente a vontade do povo, garantindo, nos limites da lei, o máximo de liberdades possíveis.

Mas deste corte que fazemos no pensamento do filósofo francês (- as instituições podem moldar a sociedade!!!), surge uma reflexão de extrema importância nos tempos atuais, principalmente no Brasil, que é a seguinte: - Que tipo de sociedade nossas instituições políticas estão a moldar?

Não se achará um otimista (probo) que defenderá com orgulho os frutos que a política no Brasil vem produzindo na sociedade. Ao contrário, o morfologismo que tomou de assalto nossa política, fruto do processo de desconstrução de nossas Instituições através do fortalecimento de uma espécie de “patronato político”, como designou Raymundo Faoro, vem disseminando a mais perversa e cruel chaga que uma sociedade pode enfrentar, a Corrupção.

Mas não é apenas a corrupção traduzida no desvio do dinheiro público. É a corrupção das ideias, da moral, da ética, dos princípios e valores que sustentam a sociedade. Até as famílias, atualmente, estão em risco. As autoridades deixaram de ser governantes e passaram a ser gestores de negócios, abandonando o bem-estar do povo para tratar de implementar planos de poder, aparelhando a máquina pública para beneficiar um grupo específico ou enriquecer os que estão à sua volta. E o mais grave, o mais grave de tudo, é a consequente perda da identidade própria das instituições políticas, confundidas com os plantonistas palacianos. 

Antes de falar em Reforma Política, portanto, é preciso pensar em restabelecer a credibilidade e identidade das nossas instituições, para que as ações reformistas apontem ao caminho que fortaleça efetivamente e recupere a representatividade perdida.

Neste contexto, a OAB surge com uma proposta de reforma política, juntamente com outras entidades, tentando incutir a ideia de tratar-se de uma iniciativa de toda a sociedade. Entretanto, tal propaganda deve ser tida com muita reserva, uma vez que as propostas apresentadas, em quase tudo, coincidem com a agenda do governo. Eleições em dois turnos para o parlamento, com lista fechada, por exemplo, parece ser uma opção muito mais prejudicial do que benéfica à representatividade das minorias.

A OAB/MS, por sua vez, já alardeou seu endosso ao plebiscito para uma nova Constituinte (está no site da Instituição), a mais escabrosa e desavergonhada tentativa de golpe à Constituição desde a redemocratização. Isto talvez explique o fato de, em plena campanha eleitoral, o plenário da Seccional da OAB ter se tornado palanque político para um dos candidatos a governador. 

É claro como a neve, mas não alvo como ela, que a OAB tem sido paulatinamente dominada pelo mesmo fisiologismo que contamina a política no Brasil. A instituição vem perdendo a sua identidade e independência, sendo tocada segundo os interesses pessoais de quem a conduz. Mas isso deve mudar. Não se pode mais aceitar que a instituição seja pautada por interesses, que não os institucionais.

É preciso que a Ordem retome sua identidade própria e restabeleça o diálogo institucional com os poderes, principalmente o judiciário, abandonando a política do compadrio, da leniência e da troca de favores que atualmente se vê escancarada. A OAB não deve conquistar benefícios ao advogado em troca de seu silêncio sobre questões da maior relevância, sob pena de abjeção própria.

Nos últimos meses a OAB/MS vem se tornando uma unidade meramente recreativa, cujas prioridades são campeonatos de futebol, corridas de rua, jantares e participações em solenidades com discursos vergonhosamente laudatórios. Sucumbiu.

Passa da hora de reaver o crescimento da instituição, sua independência e credibilidade, para que a advocacia recobre seu valor e o advogado volte a ser respeitado em suas prerrogativas. Afinal de contas, se as instituições políticas podem formatar a sociedade, o mesmo ocorre com a OAB em relação à advocacia. E que advocacia a OAB vem moldando?

EDITORIAL

O sistema de transporte faliu?

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem e devem agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público

15/12/2025 07h15

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A crise do transporte coletivo em Campo Grande chegou a um ponto que ultrapassa o desconforto cotidiano do usuário e passa a provocar perplexidade institucional. Um serviço essencial, que garante o direito de ir e vir, simplesmente ameaça parar, enquanto parte das instituições que deveriam atuar na defesa do interesse público assiste a tudo à distância, como se o problema fosse apenas administrativo ou financeiro.

O transporte público não é um favor concedido por concessionários nem um serviço opcional do poder público. Trata-se de uma obrigação legal e constitucional, que deve ser prestada de forma contínua, adequada e eficiente.

Ainda assim, a combinação de atrasos no pagamento de subsídios por parte do Município e crises financeiras alegadas pela concessionária – que, diga-se, precisa ser muito mais transparente sobre sua real situação – resultou na convocação de uma paralisação marcada para hoje.

Esperamos, sinceramente, que ela não ocorra. Mas o simples fato de ser cogitada já é um sinal grave de falência do modelo atual.

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem – e devem – agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público. O silêncio do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública causa estranheza.

Estamos falando de um serviço que afeta diretamente milhares de trabalhadores, estudantes, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Não há como tratar esse impasse apenas como um conflito contratual entre prefeitura e concessionária.

Essas instituições existem justamente para atuar quando direitos coletivos são ameaçados. Têm instrumentos legais para exigir informações, fiscalizar contratos, mediar soluções e, se necessário, responsabilizar gestores e empresas.

A crise do transporte público é um típico caso em que a atuação preventiva e firme poderia evitar danos maiores à população.

Esperamos, portanto, uma atuação urgente dessas instituições na mediação do impasse, antes que a cidade seja penalizada com a interrupção de um serviço vital. E, se o conflito acabar inevitavelmente judicializado, que o Judiciário aja como deve agir: com celeridade, sensibilidade social e foco no interesse público, e não apenas na letra fria dos contratos.

Afinal, quando um sistema essencial entra em colapso e as instituições se omitem, a pergunta deixa de ser retórica e passa a ser inevitável: o sistema de transporte público faliu ou falharam as instituições que deveriam garantir o seu funcionamento? Instituições existem para funcionar – e precisam fazê-lo de fato, especialmente quando a cidade mais precisa.

ARTIGOS

Às portas do Judiciário - contratos bancários fraudulentos

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais

13/12/2025 07h45

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Após as fraudes praticadas contra aposentados, pensionistas e beneficiários do INSS terem vindo à tona, cresceu enormemente o número de demandas judiciais que visam ao cancelamento de contratos de empréstimos, principalmente os realizados de forma virtual.

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais, gerando contratos nulos por natureza, os quais acabam sendo invalidados judicialmente.

Tratando-se de situações que envolvem idosos, os atos abusivos praticados pelos bancos provocam, por força do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003), maior reprimenda judicial, sendo passível de apuração não só no âmbito cível, como também no criminal, tendo em vista a proteção especial em razão da vulnerabilidade presumida.

Contudo, embora a regra seja clara, temos nos deparado com situações em que vítimas de fraudes têm sofrido não só com os descontos promovidos a título de parcelas mensais não contratadas, como de serviços não autorizados, que torna indigno o valor líquido das aposentadorias, benefícios ou pensões a receber.

Em boa hora, felizmente, o Judiciário tem determinado o cancelamento desses contratos, condenando as instituições que assim atuam não só à restituição dos valores ilegalmente descontados, mas ao pagamento da devida indenização por danos morais, decorrente da lesão causada aos direitos de personalidade, amplamente consagrados na Constituição Federal.

O que atordoa é o percurso que a vítima dessas situações percorre até o momento em que se livra de vez do infortúnio das cobranças.

É que, embora seja cabível, juridicamente, um pedido antecipado de decisão que suspenda os descontos que vão incidindo sobre o já tão comprometido valor a receber, nem sempre esse pleito é concedido ou o é de forma tardia, o que vai pondo a vítima dessas fraudes em situação financeira mais delicada.

O ideal seria que a regra fosse no sentido de se determinar judicialmente a suspensão imediata dos descontos ilegais, já que a parte mais vulnerável (que é sempre o consumidor) não dispõe de meios econômicos para reverter uma situação de miserabilidade a que pode chegar, diferentemente dos afortunados bancos.

No entanto, para que as tutelas judiciais provisórias sejam concedidas, exige-se o preenchimento de requisitos legais mínimos, previstos na Lei Processual Civil, quais sejam: probabilidade do direito; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo; e reversibilidade dos efeitos da decisão.

Nos casos em que o banco não comprova a pactuação por contrato firmado ou quando a suposta contratação se deu de forma virtual, mas não se comprovou idoneidade da assinatura eletrônica, deve o negócio ser cancelado.

Caso haja comprovação de má-fé por parte do banco, impõe-se a restituição dos valores descontados em dobro. Não se comprovando, entretanto, o que é mais incomum, deve o valor ser restituído na modalidade simples, o que significa devolver somente o valor cobrado.

Para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, entretanto, não se exige nessas situações, por exemplo, que tenha havido negativação do nome da vítima nos serviços de proteção ao crédito, mas a própria má-fé já valida a condenação nesse sentido.

Ainda é árdua a luta dos que sofrem com esses abusos, todavia, a Defensoria Pública é uma forte aliada do consumidor, especialmente os mais vulneráveis.

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