Artigos e Opinião

ARTIGO

O tarifaço e o Custo Brasil da cidadania do consumo

Consumista, gastador e irresponsável, o Brasil foi perdendo a capacidade de gerenciar suas crises econômicas

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No fim da década de 1980, o Brasil se despedia dos anos de chumbo do Regime Militar e acompanhava uma transformação radical no processo de globalização. No mesmo ano em que o País voltava a eleger um presidente, o Muro de Berlim ruía do dia para a noite, literalmente. Após 50 anos de “modernização conservadora” (1930–1980), conforme a expressão do saudoso sociólogo Luiz Werneck Vianna, um novo Brasil nascia.

Naquele período, tanto Lula quanto Collor, candidatos à Presidência no segundo turno de 1989, defendiam um novo projeto de desenvolvimento nacional, afastando-se da tradição nacional-estatista. Lula pregava a valorização profissional e financeira do trabalhador, enquanto Collor enfatizava a abertura comercial e a liberalização da economia. Apesar das diferenças programáticas, um fio condutor unia as duas candidaturas: o acesso ao consumo como projeto social.

Quase 40 anos depois, Lula está em seu terceiro mandato presidencial, tendo concorrido em todos os pleitos possíveis, com exceção da década de 2010. Nesse período, não houve uma transformação estrutural na forma como a política econômica se apresentou aos cidadãos. Com exceção da fracassada política da Nova Matriz Econômica, liderada pela ex-presidente Dilma Rousseff, todos os presidentes se esforçaram para que o consumo do cidadão brasileiro jamais fosse abalado.

Juros altos, combate à inflação e câmbio flutuante tinham como objetivo relacionar superavit primário ao poder de compra da população. Essa tendência permaneceu firme até a crise de 2008, quando o chamado boom das commodities colocou nosso projeto de País no divã. A partir daquela conjuntura, tornou-se insustentável manter a dívida pública estável sem uma série de políticas reformistas. Nos últimos 15 anos, o que se viu foram tentativas frustradas de conter o gasto público em detrimento de uma política de investimento produtivo e industrial.

Consumista, gastador e irresponsável, o Brasil foi perdendo a capacidade de gerenciar suas crises econômicas e de lidar com as transformações globais. Salvo raras e fundamentais exceções, como o agronegócio e algumas empresas, como a Embraer, nosso capital ficou retido na capacidade de movimentar uma economia de baixa produtividade e alto consumo. Sem poupança e sem investimento, ficamos à mercê de tempestades geopolíticas como a crise da Covid-19, o apetite chinês e a resposta da sociedade americana com a vitória de Donald Trump.

O recente imbróglio envolvendo o governo americano e o governo de Lula revela uma disputa entre potências pelo controle do escoamento de matérias-primas fundamentais para seus desenvolvimentos. Da Groenlândia à Patagônia, tanto China quanto Estados Unidos desejam controlar canais, minerais, estradas e indústrias alimentícias que permitam manter seus principais parques industriais.

Ao sermos taxados em 50% sobre produtos a serem exportados, deflagra-se uma condição especial em nossa economia, que não consegue competir minimamente com a indústria mundial de alto valor agregado, como nanotecnologia, inteligência artificial, tecnologia militar, entre outros. Cada vez mais informais e sem uma base sólida para a cultura do empreendedorismo, passamos a compor um novo estado de dependência econômica.

Nesse estado, um novo tipo de imperialismo se aproxima silenciosamente. Sem levantar canhões nem disparar mísseis, a economia primária brasileira passa a ser dependente de um poder que não exporta ideologia, mas sim um capitalismo de caráter primitivo, que monopoliza o comércio nas pequenas cidades, controla o fluxo de mercadorias nos grandes centros e arremata todos os nossos leilões. Trata-se de um imperialismo “TikTok”, que nos aliena sem reproduzir tal processo em seu lugar de origem.

EDITORIAL

Judiciário não é palco nem mercado

Restringir a atuação como coach e impor limites a determinadas docências, especialmente aquelas transformadas em verdadeiros cursos caça-níqueis, é fundamental

13/12/2025 07h15

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A decisão do presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Edson Fachin, de proibir que magistrados atuem como coaches, seja nas redes sociais ou fora delas, não é apenas correta como necessária.

Trata-se de um freio institucional que chega em boa hora a um Judiciário que, nos últimos anos, tem convivido com excessos de exposição, vaidade e práticas que colocam em xeque a sobriedade exigida da magistratura.

Não é de hoje que esse limite vem sendo testado.

Há cerca de dois anos, causou perplexidade o caso de um ex-juiz federal que passou a vender cursos na internet ensinando “táticas” para ganhar recursos judiciais. O paradoxo salta aos olhos: quem julgava recursos passou a faturar dinheiro “por fora” ensinando advogados a vencê-los.

Ainda que se alegue liberdade profissional após deixar a toga, a prática é, no mínimo, eticamente questionável e contribui para corroer a confiança da sociedade na imparcialidade do sistema de Justiça.

A medida de Fachin reconhece um problema real: tem faltado comedimento à parte da magistratura brasileira.

Em tempos de redes sociais, palestras remuneradas e cursos de viés mercadológico, alguns juízes parecem ter esquecido uma máxima antiga, simples e ainda extremamente atual: o lugar em que o magistrado mais deve falar é nos autos.

A autoridade da toga não se constrói com likes, seguidores ou discursos performáticos, mas com decisões técnicas, fundamentadas e discretas.

Restringir a atuação como coach e impor limites à determinadas docências, especialmente aquelas transformadas em verdadeiros cursos caça-níqueis, é fundamental. Não se trata de censura nem de cerceamento da liberdade intelectual, mas de preservação da função jurisdicional.

O juiz não é um influenciador digital, tampouco um vendedor de fórmulas de sucesso processual. É agente do Estado, investido de poder para decidir conflitos com independência e imparcialidade.

Isso, porém, não significa defender um Judiciário hermético ou alheio à sociedade. Ao contrário: as cortes precisam, sim, se comunicar melhor nestes novos tempos, explicar decisões complexas, dialogar institucionalmente com a população e prestar contas de seu funcionamento. Comunicação institucional é necessária; autopromoção individual, não.

No fim das contas, o que está em jogo é o respeito à própria instituição. O Judiciário é, talvez, o Poder que mais precisa ser respeitado para que a democracia funcione. E esse respeito não é um privilégio – é uma obrigação que começa dentro de casa.

Seriedade, sobriedade e autocontenção não são virtudes acessórias para magistrados; são requisitos essenciais para quem exerce uma das funções mais sensíveis do Estado.

ARTIGOS

Novas regras do Banco Central sobre ativos virtuais: um marco de maturidade regulatória

Brasil consolida seu papel de protagonista na integração entre inovação financeira e solidez regulatória, aproximando-se dos padrões internacionais de governança e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo

12/12/2025 07h45

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Em 10 de novembro, o Banco Central do Brasil deu um passo histórico ao publicar as Resoluções BCB nº 519, nº 520 e nº 521, que inauguram um novo ciclo de regulação do mercado de ativos virtuais no País.

Com essas normas, o Brasil consolida seu papel de protagonista na integração entre inovação financeira e solidez regulatória, aproximando-se dos padrões internacionais de governança e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (PLD/FT).

Mais do que um conjunto técnico de regras, essas resoluções representam um amadurecimento institucional do sistema financeiro brasileiro diante da realidade cripto. Até então, o setor operava em uma zona cinzenta regulatória, com supervisão limitada e grande diferenças de informações entre prestadores e usuários.

Agora, o País passa a estabelecer bases claras para a operação de Sociedades Prestadoras de Serviços de Ativos Virtuais (Psav), além de definir, pela primeira vez, o tratamento cambial para operações internacionais com criptoativos.

A Resolução BCB nº 519/2025 impõe um padrão de governança que coloca as Psav sob um nível de exigência comparável ao das instituições financeiras. Exige-se segregação patrimonial, controles internos robustos e políticas de PLD/FT equivalentes às do sistema bancário.

Essa medida mitiga riscos de uso indevido dos recursos dos clientes e reduz o espaço para fraudes e práticas abusivas. Pontos sensíveis em um setor historicamente marcado por volatilidade e escândalos.

Já a Resolução BCB nº 520/2025 institui o processo de autorização prévia para funcionamento das Psav, com vedações expressas à oferta de crédito e à captação de recursos de clientes qualificados.

O objetivo é proteger investidores e garantir que as operações com criptoativos não contaminem o sistema financeiro tradicional com riscos de liquidez e solvência. A exigência de sede no Brasil e critérios rigorosos de idoneidade e gestão de riscos também reforçam o compromisso com a responsabilidade corporativa e a transparência operacional.

Por sua vez, a Resolução BCB nº 521/2025 corrige uma lacuna importante ao enquadrar as operações internacionais com criptoativos, como operações de câmbio, sempre que houver conversão de moeda ou transferência internacional de valores.

Essa regra coloca as transações de cripto sob a mesma lente de compliance cambial que rege outras formas de movimentação financeira internacional, prevenindo brechas para evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Para bancos e instituições financeiras, o novo marco regulatório representa tanto uma oportunidade quanto uma responsabilidade. A integração dos serviços com ativos virtuais ao portfólio bancário passa a ser viável, desde que sejam obedecidos os novos parâmetros de segurança, segregação de recursos e reporte regulatório.

Ao mesmo tempo, essas instituições terão de repensar suas estruturas de governança e compliance para acomodar o ecossistema cripto dentro de uma lógica de controle prudencial.

Alguns pontos, entretanto, merecem atenção especial: a vedação de crédito com recursos próprios em operações cripto, a segregação total de fundos de clientes, o reforço dos controles de PLD/FT, e o tratamento cambial obrigatório em transações internacionais.

Tais exigências sinalizam que o Banco Central, de maneira mais que devida e assertiva, pretende equilibrar o incentivo à inovação com a blindagem contra riscos sistêmicos e ilícitos financeiros.

Contudo, o período de adaptação será curto. As regras entram em vigor a partir de 2 de fevereiro de 2026 e as obrigações adicionais de reporte internacional passam a valer a partir de 4 de maio de 2026.

Empresas que já atuam no mercado precisam, portanto, iniciar imediatamente seus processos de adequação, revisando estruturas societárias, sistêmicas, políticas de custódia e mecanismos de compliance.

Por fim, as novas resoluções não devem ser vistas como um freio à inovação, mas como um sinal evidente de maturidade regulatória do País.

Ao oferecer um ambiente seguro, transparente e supervisionado, o Banco Central cria as condições para que o Brasil se consolide como um polo confiável de desenvolvimento em blockchain e ativos digitais. É o início de uma nova era em que a confiança institucional passa a ser o ativo mais valioso do universo cripto.

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