O arquiteto e urbanista chinês Kongjian Yu, de 62 anos, conhecido no mundo todo por seu trabalho ligado às mudanças climáticas, morreu no começo da noite de terça-feira, após a aeronave em que ele estava, ao lado de mais dois documentaristas, cair no Pantanal de Mato Grosso do Sul. O dono do avião era o piloto e também morreu no acidente. A aeronave, Cessna 175, prefixo PT-BAN, fabricado em 1958, tinha histórico de irregularidades.
O acidente aconteceu no início da noite de terça-feira, segundo informações da Polícia Civil, que investiga o caso, a areonave tentou pousar na fazenda Barra Mansa, localizada a cerca de 100 quilômetros da área urbana de Aquidauana, porém não conseguiu e o avião arremeteu. Pouco tempo depois os funcionários da fazenda perceberam o fogo e foram até o local, momento que encontraram o avião em chamas e as vítimas já mortas.
Além de Kongjian Yu também morreram o documentarista Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz, o diretor de fotografia Rubens Crispim Júnior e o piloto Marcelo Pereira de Barros. As causas do acidente estão sob investigação do Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado (Dracco), por meio da delegada Ana Cláudia Medina, e do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa).

Ainda não se sabe o motivo da queda, porém, a delegada informou que a aeronave não estava permitida para operar em táxi aéreo e já tinha sido alvo da polícia em 2019, durante a Operação Ícaro, quando foi apreendida.
Na época, como conta a delegada, o avião apresentava irregularidades de manutenção e também operava em táxi aéreo sem a devida permissão. “O avião foi apreendido e o proprietário, o senhor Marcelo [Pereira de Barros] sofreu indiciamento na época. Ele só conseguiu reaver a aeronave em 2022, restituído via judicial, mas só poderia voar após regularizar uma série de problemas encontrados”, relatou Medina, ao Correio do Estado.
Ainda conforme a delegada, essa regularização só foi feita em dezembro do ano passado, quando entregou toda a documetação aos órgãos competentes. O primeiro voo teria acontecido só em janeiro deste ano.
“Nós vamos investigar em que contexto se deu essa contratação deste táxi aéreo, já que ele estava impedido de fazer esses voos”, completou Medina.
O piloto, Marcelo Pereira de Barros já teria tido outras quedas com esse avião, antes da operação ocorrer, porém, conforme a delegada, elas não haviam sido informadas. Marcelo, conhecido como Marcelo Pantaneiro, operava na região há vários anos e conhecia o Pantanal.
Além das irregularidades da aeronave, Medida também aponta que a pista estava operando além de sua capacidade, já que não possuía iluminação para receber aeronaves à noite e o acidente ocorreu por volta de 18h.
“Eles chegaram sábado no Pantanal e estavam visitando várias fazendas para saber como era o dia a dia das pessoas lá, naquele dia foram em três propriedades e aquela seria a última do dia, o último pouso e aconteceu esse sinistro. Parece que também há irregularidades na pista, ela é uma pista visual, sem iluminação, então deve funcionar até o por do sol, que ontem [terça-feira] foi às 17h39min, então já tinha passado do horário”, afirmou Medina.
Ontem o dia foi de correr com a liberação dos corpos, segundo a delegada, por isso a prioridade foi acionar os familiares e informar sobre o fato, além de ouvir as testemunhas, porém, nos próximos dias a Polícia Civil e o Cenipa, que até o início da noite de ontem ainda não havia chegado em Aquidauana, devem se debruçar sobre as causas do acidente.
Ainda de acordo com a titular da Dracco, além dos três ocupantes da aeronave, outras duas pessoas também faziam parte do grupo, mas não estavam no avião. Eles foram ouvidos e, como estavam muito abalados pelo fato, foram liberados para retornarem às suas casas.
DOCUMENTÁRIO
O grupo estava na região, segundo a apuração da Polícia Civil, para realizar um sonho do arquiteto, que era conhecer o Pantanal e também registrar imagens de Kongjian Yu para um documentário produzido pelo grupo sobre o arquiteto e o conceito de “Cidades-esponjas”, defendido pelo chinês.
O grupo teria feito várias imagens em outras propriedades pantaneiras e acompanhava Kongjian no Brasil.
Ele veio ao País para participar, no dia 19 deste mês, da abertura da 14ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo, realizada no Parque Ibirapuera. Mas estava no Brasil desde o dia 4 deste mês, quando participou da Conferencia Internacional do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU-BR).
O arquiteto era um dos nomes mais respeitados da arquitetura paisagística mundial. Professor na Universidade de Pequim e fundador da premiada Turenscape, seu trabalho revolucionou o urbanismo sustentável com projetos como o conceito de “Cidades-Esponja”, voltado à integração ecológica nas metrópoles.
No dia 31 de agosto, Kongjian Yu participou de uma reportagem no programa Fantástico, na qual apresentou seu conceito como a solução para as enchentes. O arquiteto transformou o trauma de quase ter se afogado na infância em um conceito que hoje inspira mais de 250 cidades.
Na reportagem, Yu defendeu que água não é inimiga e propôs projetos que devolviam espaço aos rios para combater desastres climáticos.
Segundo o arquiteto Carlos Lucas Mali, conselheiro federal do CAU-BR representando o Mato Grosso do Sul, ele chegou a conversar com Kongjian Yu na última sexta-feira, quando ele contou que viria ao Pantanal para fazer um estudo sobre o Bioma, que tinha muita vontade de conhecer.
Conforme Mali, a morte do arquiteto lhe causou grande tristeza, principalmente pelo fato dele ter morrido em Mato Grosso do Sul. “Era um dos maiores nomes da arquitetura e o que mais entendi sobre as mudanças climáticas. O que nos causa tristeza, além da morte, é o fato dele ter vindo morrer no Pantanal, foi uma grande perda”, lamentou.


