Acusado de desviar R$ 8 milhões da Apae, o fisioterapeuta voltou a ser preso por obstrução da Justiça; Caixa aponta "falha sistêmica" no bloqueio dos valores
O ex-coordenador da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), Paulo Henrique Muleta Andrade, preso novamente nesta segunda-feira (10) por envolvimento em desvio milionário da entidade, driblou a Justiça e conseguiu sacar mais de R$ 412 mil de investimento, mesmo com a determinação de bloqueio de contas.
Conforme o processo, o saque foi possível por uma falha sistêmica da Caixa Econômica Federal, qe bloqueou as contas, mas não as aplicações financeiras.
Em agosto do ano passado, foi determinado o sequestro de bens e valores no valor de R$ 8,9 milhões do acusado,
Em representação, o Ministério Público Estadual (MPMS) narra que no cumprimento da ordem judicial de bloqueio, contatou-se um montante muito baixo na conta bancária do ex-coordenador, de R$ 57,1 mil, e o órgão oficiou a Caixa solicitando esclarecimentos.
A instituição bancária respondeu que houve um "fato de extrema gravidade", pois no cumprimento da ordem judicial, por falha sistêmica, não foi realizado o bloqueio em sua totalidade, não atingindo os investimentos do acusado.
A Caixa informou ainda que Paulo Henrique tinha um investimento, na modalidade LCI, no valor de R$ 412,4 mil e, valendo-se da falha no sequestro de valores, sacou o montante e o depositou em outra conta, em nome de outra pessoa.
Prisão preventiva
O fato novo levou o MPMS a pedir a prisão preventiva do ex-coordenador da Apae, que já havia preso em 2023, mas foi solto com a imposição de medidas cautelares.
"Diante da conduta perpetrada pelo investigado Paulo Henrique, constato que, de fato, ele se valeu de uma falha no não cumprimento integral da ordem judicial de sequestro de valores, de forma deliberada e astuta, o requerido sacou o investimento e o depositou em outra conta bancária mantida na mesma agência, em nome de terceira pessoa, o que demonstra inequívoca intenção de impedir, ou de qualquer forma, embaraçar a investigação e a ação penal e de ocultação de patrimônio desviado do erário público", sustentou o MPMS.7
Ao analisar o pedido, o juiz da 2ª Vara Criminal, Robson Celeste Candeloro, considerou que o caso comportava a decretação da prisão preventiva, pois há provas da existência do crime e indícios sufientes da autoria.
Segundo o magistrado, os fatos novos demonstram forte indicativo de autoria, por parte do acusado, de obstrução à justiça, lavagem de dinheiro e uso da liberdade para assegurar o proveito do crime.
O juiz cita ainda que há elementos concretos que demonstram intenção de fuga do ex-coordenador da Apae, que pediu autorização para viajar à Espanha, para supostamente participar de um casamento.
A suspeita torna-se maior pois, anteriormente, ele já havia manifestado, através de mensagens, desejo de fugir para a Itália, conforme noticiou o Correio do Estado na época.
Desta forma, o juiz decretou a prisão preventiva de Paulo Henrique, que foi cumprida nesta segunda-feira, na operação Occulto.
Operação
A operação batizada de "Occulto" cumpriu um mandado de prisão e quatro de busca e apreensão em Camapuã e Campo Grande.
Esse nome faz referência tanto às ações para esconder o dinheiro desviado, bem como ao fato de que o ex-coordenador da Apae chegou a pedir cidadania italiana para sair do Brasil.
O ex-coordenador é relacionado na investigação, junto de terceiros, pelo uso de empresas de fachadas para simular vendas de produtos para a rede pública de saúde.
A investigação do MPMS aponta que o grupo desviou o total de R$ 8.066.745,25 de dinheiro público, eepassado pela Secretaria de Estado de Saúde (SES) de Mato Grosso do Sul, e que serviria para tratamento de ostomizados.
Esquema
Em 29 de novembro de 2023, oito pessoas foram presas por suspeita de corrupção ativa e passiva, peculato, lavagem de dinheiro e fraudes em licitações e contratos públicos.
Depois disso, cerca de 2,6 mil pessoas ostomizadas chegaram a ficar sem as bolsas coletoras de urina ou fezes.
Nesse suposto esquema investigado, as fornecedoras desses materiais eram privilegiadas em troca de propina, o que levou ao afastamento de Paulo Muleta da coordenação técnica do Centro Especializado em Reabilitação (CER) da Apae.
Descoberto o esquema de corrupção, houve descontinuação dos contratos suspeitos e novo processo de compras com outras três empresas, o que gerou um hiato no fornecimento e, consequentemente, fez com que muitos ostomizados pagassem até R$ 1,5 mil mensalmente para comprar as bolsas.