A Controladoria-Geral da União (CGU) recomendou que a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) revise todas as resoluções de concessões de flexibilização da jornada de trabalho, a fim de conceder o trabalho flexível apenas aos cargos que realmente exijam.
O Relatório de Avaliação, divulgado na última segunda-feira (30), considera os pressupostos estabelecidos pelo art. 3º do Decreto nº 1.590 de 1995, que determina que a entidade pode autorizar os servidores que prestam serviços que exigem atividades contínuas de regime de turnos ou escalas, em período igual ou superior a doze horas ininterruptas, em função de atendimento ao público ou trabalho no período noturno, a cumprir jornada de trabalho de seis horas diárias e carga horária de trinta horas semanais.
Entre junho de 2018 e março de 2022, a CGU analisou uma amostra de 299 servidores, de onze setores, que juntos contemplam 54% dos servidores beneficiados com horário flexível - um total de 556 servidores.
O trabalho constatou a utilização indevida dos critérios para flexibilização, considerando que a UFGD concedeu a jornada a servidores que não realizam as atividades mencionadas no Decreto nº 1.590/1995.
A auditoria também declarou haver “fragilidades na atuação da Comissão de Ajuste da Jornada (CAJ) e fragilidades nos controles dos processos de concessão de jornada de trabalho flexível".
Segundo a CGU, nenhum dos onze setores analisados cumpria cumulativamente os critérios de “atendimento ao público”, considerando como público o conceito trazido pelo art. 18 da IN MP/SGP nº 02/2018 que é o de atendimento direto ao cidadão, tampouco demonstraram a necessidade de que o serviço seja executado de forma contínua.
São eles:
- Pró-Reitoria de Administração - PRAD
- Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas - PROGESP
- Prefeitura Universitária - PU
- Pró-Reitoria de Avaliação Institucional e Planejamento – PROAP
- Pró-Reitoria de Ensino de Graduação - PROGRAD
- Faculdade Ciências Exatas e Tecnologia - FACET
- Faculdade de Ciências Agrárias - FCA
- Coordenadoria de Desenvolvimento de Tecnologia da Informação - COIN
- Pró-Reitoria de Extensão e Cultura - PROEX
- Assessoria de Comunicação Social e Relações Públicas - ACS
- Editora
Alguns setores, como a Editora, por exemplo, justificaram que realizam atendimento ao "público em geral", mas não possui elementos que evidenciem a necessidade do serviço ser realizado de forma contínua, em seis horas ininterruptas, em contraponto ao que era realizado com oito horas diárias com intervalo para almoço.
"Ressalva-se que para a flexibilização não é suficiente a extensão do período de funcionamento do setor de 8 para 12 horas. É necessário que se demonstre que essa extensão de horário foi motivada pela real necessidade de atendimento ao público de forma contínua e ininterrupta, por ao menos 12 horas, ou que tal atendimento ocorra no período noturno", diz o documento.
A CGU ainda destaca que muitos dos argumentos que aparecem nos processos analisados não encontram amparo legal para justificar a concessão dos horários flexíveis, como por exemplo:
- Ampliação do horário de atendimento;
- Melhoria na qualidade de vida dos servidores; melhoria do atendimento do público em geral, interno e externo;
- Fiscalização das empresas que executam atividades em horário estendido;
- Atendimento de ligações fora do horário normal de expediente;
- Necessidade de flexibilizar o horário pela existência de atividades relacionadas a outra unidade que flexibilizou;
CAJ
Os documentos disponibilizados pela UFGD à auditoria mostram que a universidade instituiu a Comissão de Ajustes de Jornadas de Trabalho dos Técnicos Administrativos (CAJ), por meio da Resolução COUNI nº 242, de 20 de dezembro de 2017, com o objetivo de analisar e avaliar a possível implantação, bem como assessorar e acompanhar a manutenção da flexibilização da jornada de trabalho.
No entanto, conforme apresentado pela CGU, não houve um estudo da comissão voltado à análise dos serviços prestados por setor da instituição, aspecto considerado essencial para que a concessão de horário reduzido seja feita de forma adequada, e não generalizada.
Sendo assim, na UFGD, ao invés das concessões de horário flexível estarem relacioadas a funções específicas de cada setor, ocorreu o movimento oposto: os setores que se adaptaram para atender aos servidores que fizeram requerimento para trabalhar em horário ininterrupto de seis horas diárias, sem redução de salário, resultando em servidores trabalhando seis horas ininterruptas e outros trabalhando oito horas, com horário de almoço, atuando no mesmo tipo de serviço, conforme explica o relatório apresentado pela CGU.
Fragilidade
Durante a auditoria, também foram encontrados casos em que o servidor havia mudado de setor ou assumido algum cargo de chefia, mas sem sofrer alteração na resolução que havia aprovado o horário reduzido. Segundo a CGU, isso demonstra a dificuldade que a UFGD possui para mensurar a totalidade de servidores que atuam sob essas resoluções.
"Por se tratar de exceção, as concessões de jornada flexível deveriam ser revisadas periodicamente pela UFGD, com vistas a verificar, dentre outras situações: a) se o serviço continua exigindo a necessidade de execução em turno ininterrupto; b) se o servidor que faz uso dessa modalidade ainda continua executando as atividades naquele setor; c) se o servidor assumiu algum cargo de chefia que o impede de ter acesso a esse benefício", diz relatório.
Recomendações
Após as irregularidades encontradas, a CGU recomendou que a UFGD revise todas as resoluções de concessões de flexibilização da jornada de trabalho, a fim de concedê-las apenas aos servidores que de fato necessitem, seguindo o decreto que atribui a flexibilização apenas a atividades contínuas no regime de turnos ou escalas e de “atendimento ao público”, considerando como “público”, os serviços prestados diretamente ao cidadão.
Também foi recomendado que o CAJ reconsidere suas atribuições, e que a Universidade realize estudos em relação às atividades desenvolvidas pelos diversos setores, com o objetivo de identificar em quais a flexibilidade pode ser oferecida.
Além disso, a UFGD deverá aprimorar os controles sobre os processos de concessão de jornada de trabalho flexível, de modo que reflitam a situação atual dos servidores, revogando inclusive as resoluções que não
estão de acordo com a situação atual do servidor.
E, por fim, pede que sejam feitos ajustes nos cadastros dos servidores para cálculo adequado da carga horária.
Esclarecimentos
Em resposta ao Correio do Estado, a UFGD informou que o relatório da CGU não encontrou "irregularidades", mas, sim, apontou recomendações à Universidade, e mencionou que os tópicos citados anteriormente já vêm sendo observados pela instituição.
Além disso, a UFGD relatou que a primeira versão do relatório havia sido enviada pela CGU à Universidade em 9 de agosto de 2022, e que o documento já apresentava recomendações para a revisão dos processos de flexibilização de carga horária.
"Cabe contextualizar como o relatório foi elaborado e por quais motivos: em 9 de agosto de 2022, a CGU encaminhou à UFGD a primeira versão do relatório, contendo recomendações para a revisão dos processos de flexibilização da carga horária dos servidores que trabalham em turnos contínuos. Tal flexibilização, aliás, não se trata de “farra” e, sim, de direito adquirido em 2017 por servidoras e servidores públicos federais após anos de batalhas por melhores condições trabalhistas", diz nota.
Segundo a Universidade, após o relatório inicial, foi nomeada uma comissão em reunião do Conselho Universitário (COUNI), órgão deliberativo máximo da universidade, com atribuições de atender a todas as recomendações.
"A CGU, por sua vez, foi devidamente comunicada sobre tais ações e aceitou as propostas da comissão no que diz respeito à revisão em todo o processo de concessão de turnos contínuos aos servidores", informou.
A Universidade explica que as atividades do COUNI devem ser realizadas de agosto de 2022 a agosto de 2023, e ainda se encontram em andamento, e reforça que o objetivo dos turnos contínuos " além de conceder melhor qualidade de vida à categoria dos técnicos administrativos da universidade, é garantir a qualidade das atividades e dos serviços realizados, já que, dessa forma, o atendimento ao público se estende por mais horas, contribuindo com o desenvolvimento didático, científico, tecnológico, socioeconômico, cultural e artístico das comunidades interna e externa".
A UFGD reforça que a auditoria realizada pela CGU também abrange as demais instituições públicas do país que concedem carga horária flexibilizada para seus servidores.


