O desembargador Vladimir Abreu da Silva, no plantão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) na madrugada desta sexta-feira (19), concedeu habeas corpus para o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MS), Jerson Domingos. Ele foi preso ontem, quinta-feira (18), durante a terceira fase da Operação Omertà.
No pedido, o advogado do conselheiro, André Borges, argumentou que a prisão ocorreu em razão de Domingos ter parentesco com o empresário Jamil Name, preso desde setembro de 2019, e os fatos que levaram à prisão não são recentes. “Veja-se bem: a maioria absoluta dos fatos são antigos (2009 e 2019). Apenas um mísero fato é de 2020, sem qualquer importância. Sem que quaisquer fatos tenham representado efetivo atrapalho/embaraço às investigações. São apenas conversas (de um homem conhecido por ser da paz, agradável e de bom coração) sobre viagens, preocupação com familiares, busca de informações, etc.”, escreveu.
Borges sustenta ainda que Domingos é idoso e tem diversos problemas de saúde, o que agravaria seu estado caso continuasse preso. “E não é só: o impetrante é idoso (quase 70 anos) e tem quadro de saúde agravado [...], inspirando cuidados que sabidamente não são garantidos no cárcere [...], enquadrada tal situação também na Recomendação 62 do CNJ [Conselho Nacional de Justiça] (recentemente renovada, para evitar a contaminação em massa da Covid-19 [...]: crescimento de 800% de casos em presídios)”, apontou.
Em sua decisão, o desembargador destacou que os fatos não sustentam a manutenção da prisão, apesar da gravidade das acusações. “Não se está a dizer que os fatos não merecem investigação aprofundada e produção de provas em juízo, porém, os elementos constantes até o momento não são robustos o suficiente para autorizar a manutenção da prisão”, argumentou.
O conselheiro do TCE estava em uma fazenda em Rio Negro, quando foi convocado pelo advogado a se apresentar à polícia. Ele foi transferido para o Centro de Triagem Anísio Lima, de onde deve sair ainda hoje.
NOVA FASE
O Grupo de Apoio Especial na Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Estado (MPMS), com apoio da Delegacia Especializada em Repressão a Roubos a Banco, Assaltos e Sequestros (Garras), deflagrou ontem a terceira fase da Operação Omertà. Além de Domingos, pelo menos outras seis pessoas foram detidas, de um total de 20 mandados de prisão.
Nesta fase, as equipes de investigação combatem ramificações da milícia armada supostamente chefiada por Jamil Name, supostos planos para matar autoridades, entre elas, promotores do Gaeco e o delegado Garras, Fábio Peró, além de uma conexão do grupo com pessoas ligadas a Fahd Jamil (um dos alvos da operação), em operações que envolvem compras de armamentos.
As equipes foram a vários locais na Capital e também a Ponta Porã, além de outras cidades do interior, como Ivinhema, sob a tutela do juiz da 7ª Vara Criminal, Marcelo Ivo de Oliveira. Entre os presos está o delegado da Polícia Civil, Márcio Obara, três policiais (civis e militares) e uma sobrinha de Jamil, Cinthya Name.
Fahd Jamil, conhecido como “Rei da Fronteira”, não foi preso pelos policiais do Garras. O filho de Fahd, Flávio, também é procurado.
Também houve cumprimento de mandados de busca e apreensão na residência do desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Joenildo Souza Chaves. Em setembro do ano passado, quando a primeira fase da Operação Omertà foi desencadeada, um cheque de R$ 100 mil, de Joenildo, foi apreendido dentro de um armário no quarto de Jamil Name.
SOBRINHA DE NAME
Logo cedo, três pessoas foram presas: Benevides Pereira, o Benê; Lucimar Calixto, conhecido Mazinho – ambos funcionários da empresa de sorteio de prêmio Pantanal Cap –; e Cinthya Name, sobrinha de Jamil Name – que também é proprietário do Pantanal Cap. Além desses, chamam atenção a prisão do delegado da Polícia Civil Marcio Obara e os mandados em nome de outros três policiais.
Obara é ex-titular da Delegacia Especializada em Repressão aos Crimes de Homicídios (DEH), que investigou crimes não solucionados com autoria apontada para a organização de Jamil Name. Ele não é citado diretamente na primeira fase da Omertà, mas uma testemunha indica o pagamento de R$ 100 mil para um delegado que atuaria na área de homicídios.
Outro policial envolvido é Rogério Luís Phelippe, que atuava como motorista do deputado estadual Jamilson Name (sem partido) e seria responsável por organizar a segurança de integrantes do grupo e criar listas de pessoas no alvo da milícia. Dois policiais, Frederico Maldonado, conhecido como Fred, e Célio Monteiro, chamando de Manga Rosa, completam a lista de agentes com mandados emitidos.
FORO PRIVILEGIADO
O Correio do Estado apurou que Jerson Domingos, mesmo estando em atividade como conselheiro do TCE, não tem direito a prerrogativa do foro privilegiado nesta operação policial. O Gaeco aplicou, agora e na fase anterior da Operação Omertà, jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que dá foro privilegiado às autoridades somente por crimes ou delitos cometidos relacionados diretamente ao cargo que exercem.
Como as investigações sobre milícia armada avançam sobre laços familiares – Domingos é cunhado de Jamil Name e tio de Jamil Name Filho, os dois supostos chefes da organização –, a prisão não teria relação com a função dele como conselheiro da corte de contas.