A segunda oitiva da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Transporte Coletivo de Campo Grande desta segunda-feira (16) ouviu o diretor jurídico e administrativo do Consórcio Guaicurus, Leonardo Martins Marcello.
Em suas declarações, Leonardo afirmou que o contrato firmado entre as duas partes - prefeitura municipal de Campo Grande e Consórcio Guaicurus - é feito de direitos e obrigações das duas partes e que, “à medida que uma parte não cumpre o seu direito e a sua obrigação, a outra não tem direito de cumprir”.
Leonardo explicou que foi feita uma pericia judicial, por uma empresa escolhida por um juíz para a elaboração de um laudo pericial, que averiguou um apontamento de receitas inauferidas, que sem correção de juros, chegou num montante de R$377 milhões, no período de 2013 a 2024.
O vereador Coringa ressaltou que, caso a prefeitura não tenha condições de pagar o montante, o Consórcio também não irá cumprir a parte de renovação das frotas, mesmo já havendo duas cláusulas sendo descumpridas pela empresa, que é a da idade média da frota e a aquisição do seguro.
Leonardo explicou que o problema veio desde o início, quando a prefeitura lançou o contrato de concessão.
“O contrato de concessão é quando o poder público concede a exploração de um serviço público em troca de remuneração, que no caso do transporte público é a tarifa. Quando você participa de um processo licitatório para aquisição, o poder público se vale dos investimentos do particular para fazer investimento do serviço e remunera esse capital investido. Essa remuneração está prevista em 12,20%. De acordo com o laudo pericial, até o ano de 2019, a gente teve uma receita de 1,6%, uma diferença de 11% de remuneração”.
Conriga ainda questionou sobre a possibilidade de a própria prefeitura fazer a quebra do contrato, já que, segundo ele, “é impossível a Prefeitura pagar 337 milhões, mesmo que parcelado, até porque nós temos em compromisso com a Santa Casa, que está numa situação bem difícil, precisando de quase 40 milhões da Prefeitura”.
Leonardo ainda explicou que a prefeitura tem direito de rescindir o contrato, desde que pague os prejuízos acumulados ao longo do contrato. Segundo ele, o Consórcio já havia feito uma proposta para a prefeitura, mas que ela não havia dado atenção.
“No ano passado, nós já iniciamos uma discussão com a Prefeitura nesse sentido.Fizemos algumas propostas de repartilhação, só que infelizmente a prefeitura não deu atenção e inclusive apresentamos planilhas para a prefeitura de investimento em frota, em troca de recuperação, de forma escalonada, inclusive, atendendo até, é consciente da dificuldade financeira que o município atravessa. A proposta foi feita, porém, a prefeitura até agora não se manifestou”.
A vereadora Ana Portela perguntou ao diretor financeiro sobre a diferença de custos entre os anos de 2013 e 2014, que, mesmo com o número de passageiros se mantendo linear, houve um aumento dos custos da receita do Consórcio e um prejuízo de mais de 2 milhões.
Leonardo disse que os vereadores estavam ignorando os custos de inflação e prejuízos da rentabilidade.
“A concessão parte de dois princípios básicos: os investimentos e a rentabilidade daquilo que você já investiu. O contrato precisa garantir os investimentos que foram feitos, e isso o poder concedente precisa garantir. Por mais que a gente tenha uma receita, isso não signifca que ela seja o que o contrato previu. A receita, por mais que tenha entrado, ainda está em déficit”, disse.
O diretor também alegou que até 2019, período que é alegado que o Consórcio teve mais “lucro”, não foi o suficiente para ressarcir os investimentos que foram feitos.
“Muito embora a gente tenha tido esse lucro, a gente investia sim, tanto que até 2019 não tínhamos problemas com a idade da frota. O problema com a idade da frota, ele nasceu a partir de 2019, quando a diferença de remuneração ficou muito mais evidente.E o consórcio ao longo do tempo, por conta dessa queda acentuada de receita, não teve capacidade econômica de fazer os investimentos. Como investidor, vou até fazer um desabafo, parece que é errado o Consórcio ter lucro!”.
Ele também mostrou que, mesmo tendo uma rentabilidade de 1%, o Consórcio manteve, até 2019, uma frota com idade média dentro da estabelecida em contrato e que a idade da frota “era pra ser muito pior”.
“É óbvio que nós também temos que avaliar tudo isso no contexto humanitário, que é os passageiros, que é a humanização, que é o transporte, e pensando nisso, foi tomada a decisão de 2023 e investir o que nós tínhamos disponível. De lá pra cá, a coisa piorou e aí, infelizmente, a gente não conseguiu manter a idade da frota”.
Para Leonardo, o ideal é que haja uma tarifa que faça a remuneração correta do Consórcio, conforme consta no contrato. “Se o município quiser que a gente assuma terminal, invista em frota com ar condicionado, assuma pontos de ônibus, nós estamos dispostos. Só que, pra isso acontecer, a gente não pode investir recursos em um sistema que não te remunera. E quem precisa garantir isso é o poder concedente”.
Ele também afirmou que a Agereg tem todos os dados do Consórcio pois é dever deste entregá-los. Ao afirmar que os documentos não foram entregues, Leonardo afirma que a Agência de Regulamentação cria uma “cortina de fumaça” para não enfrentar o problema, pois vai “desaguar no poder público”.
“Goste ou não, a prefeitura vai ter que fazer os investimentos. Aí que é a questão: a prefeitura está disposta a fazer os investimentos necessários?”, questionou.
Leonardo também afirmou que a tarifa técnica ideal para manter a empresa e proporcionar uma prestação de serviços adequada deveria ser de R$9 e que o número foi determinado através de estudos realizados e através da média nacional. A tarifa técnica é a tarifa real por passageiros e não corresponde à tarifa paga pelo passageiro, que é a tarifa pública.


