Marcada por vaias e descaso, a audiência pública realizada na quarta-feira passada (15), na Câmara Municipal de Campo Grande foi considerada pelo pai de Sophia Ocampo, de dois anos, Jean Carlos, e por seu marido, Igor de Andrade, uma forma do poder público tentar silenciar a luta por justiça do casal.
Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, Jean e Igor relataram que em diversos momentos da audiência se sentiram censurados e afirmaram que o objetivo não foi honrar a memória de Sophia, morta precocemente aos dois anos de idade. Para eles, as autoridades presentes usaram a oportunidade para promover uma imagem positiva e negar a negligência das instituições ao conduzir a busca de Jean pela guarda da filha.
Para Igor Andrade, em muitos momentos da solenidade o casal precisou ouvir diversas versões inverídicas sobre como foi o atendimento feito aos pais de Sophia e à própria menina, inclusive com autoridades alegando que todo suporte possível foi dado à criança e ao casal durante os registros de boletim de ocorrência e acompanhamento do caso.
“Nesta audiência era uma mentira atrás da outra e a gente não podia fazer nada. Foi mais uma forma de silenciar tudo que está acontecendo e desmotivar as manifestações”, avaliou Igor.
O marido de Jean, que se considera pai de coração da Sophia, ainda recordou que em diversos momentos o público presente, por estar ciente da luta do casal desde o registro do primeiro boletim de ocorrência, se manifestou contra diversas declarações que tentavam passar a idade de que as instituições realizaram a proteção integral da criança.
“É até irônico, porque,quando a prefeita Adriane Lopes foi a público, ela falou que Campo Grande é a Capital que mais notifica casos de violência contra a criança por ter as equipes mais preparadas para as situações”, afirmou Igor, recordando-se que a mandatária foi vaiada pelo público ao fazer tal alegação.
O casal ainda aponta que, além de tentarem transmitir ao público uma boa imagem da gestão pública, os presentes na audiência também trataram o casal de forma homofóbica, mesmo que de forma velada, por se tratarem de dois homens que são casados e estão buscando por justiça por sua filha.
“Em nenhum momento durante a audiência eles falavam da Sophia, eles só viam a gente, só viam dois homens gays casados. O único comentário que ouvimos foi sobre criar uma Lei Sophia Ocampo, mas nem explicaram qual o intuito da lei”, afirmou o casal.
Por sua vez, a advogada que acompanha o caso, Janice Andrade também afirmou que a fala de ambos foi cerceada durante o evento, já que eles tinham o tempo estipulado de dois minutos para se manifestarem, o que, segundo a advogada claramente não era o suficiente para se relatar a luta que durou mais de um ano.
“Tiraram a nossa voz, censuraram a gente, porque, eram dois minutos para fazer e quando o tempo estava acabando faziam sinal para cortar o microfone e foi um dos momentos em que o público também vaiou”, relembrou.
A advogada ainda lembra que após o assassinato de Sophia, os pais receberam o apoio da Associação Henry Borel, fundada após o menino que dá nome a entidade morrer aos quatro anos de idade vítima de maus-tratos por parte do padrasto.
Com a solidarização pelo caso, a Associação propôs participar da audiência pública por vídeo chamada, já que não no formato presencial não seria possível. Contudo, de acordo com Janice, a Câmara pediu um prazo para avaliar se seria possível a participação neste formato.
"Falaram que iam resolver a questão do link e só no último dia. às 17h00 me ligaram para falar que não seria possível porque não teria como fazer essa audiência”.
Vale ressaltar que durante a pandemia de Covid-19 os vereadores participavam das sessões parlamentares por videoconferência, mesmo formato que seria necessário empregar para garantir a participação da Associação.
Neste dia, a intenção era contar com a participação dos advogados e advogadas do Instituto Brasileiro de Enfrentamento de Violência Familiar. Além disso, plano era que pai de Henry Borel, Leniel Borel, também teria um tempo de fala durante a audiência, o que não foi possível.




