Por unanimidade, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu na manhã desta terça-feira (11) instaurar Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra desembargador Marcos Brito e o desembargador aposentado Sideni Soncine Pimentel por envolvimento em um suposto esquema de venda de sentenças judiciais no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul revelado por investigação da Polícia Federal.
Além da abertura do PAD, os conselheiros também decidiram manter afastado o desembargador Marcos Brito, que está longe do cargo desde outubro de 2024. Caso ele seja condenado pelo CNJ, a punição será a aposentadoria compulsória. E, mesmo assim, vai continuar recebendo salário de magistrado.
No caso de Sideni Soncine Pimentel, que no mês passado pediu e teve atendido seu pedido de aposentadoria voluntária, o efeito prático em caso de condenação no CNJ será a mudança de aposentadoria voluntária por compulsória, mas sem alterar seus rendimentos de aposentado.
PARASITAS
Por conta da aposentadoria, o advogado que defendeu o ex-desembargador nem mesmo se preocupou em entrar no mérito das denúncias de suposta corrupção e se ateve a pedir ao CNJ que arquivasse o pedido de abertura de PAD pelo falto de o desembargador já estar aposentado.
O corregedor do CNJ, Mauro Campbell Marques, porém, recusou o pedido de arquivamento dizendo que o procedimento deve ser levado até o fim "para que aquele que se hospeda na magistratura ou é parasita da magistratura para cometer crimes, não possa utilizar sequer a nomenclatura de juiz de direito ou desembargador aposentado".
Tanto Marcos Brito quanto Sideni Soncine foram afastados em 24 de outubro do ano passado em meio à operação Ultima Ratio, da Polícia Federal, que resultou ainda no afastamento de outros três desembardagores. Dois destes, Alexandre Bastos e Vladimir de Abreu, seguem afastados.
Durante os sete minutos em que defendeu Marcos Brito, a advogada Talita Paim de Lima alegou que não existiam provas na investigação da Polícia Federal e que seu cliente já estava cumprindo pena havia mais de um ano por estar sendo vítima de "uma verdadeira caça às bruxas e vítima de sensacionalismo midiático".
Alegou, ainda que a Polícia Federal estaria impedindo seu acesso às investigações e que não existem provas que incriminem seu cliente. Enfatizou, ainda, que faltam provas que o relacionem irregularmente ao lobista mato-grossense Andreson de Olveira Gonçalves, que chegou a ser preso e que é apontado como interlocutor da venda de sentenças também no Superior Tribunal de Justiça.
Para contestar a investigação, alega que, em vez de enriquecimento ilícito, como está sendo denunciado, Marcos Brito teria perdido entre 10% e 14% de seu patrimônio no período investigado pela Polícia Federal.
Mauro Campbell, porém, entendeu que as denúncias da PF são pertinentes e citou uma série de transações financeiras supostamente irregulares nas contas do desembargador. Citou, por exemplo, indícios de lavagem de dinheiro em nome de um filho, de um motorista e de assessores do Tribunal de Justiça, principalmente em contratos de arrendamento de terras.
Exemplificou, ainda, que o desembargador é proprieário de uma fazenda de cerca de mil hectares em Campo Grande e que a compra de gado pelo valor de R$ 1.119.474,73, feita por seu assessor (Rafael), sem lastro bancário, é indício de suposta lavagem de dinheiro.
CHEQUE SUSPEITO
Outro indício apontado pelo corregedor de que o desembargador fazia parte de um amplo esquema de corrupção é a apreensão em sua casa, no dia 24 de outubro de 2024, de uma caixa com R$ 46.800,00 em relógios de luxo e jóias.
No mesmo dia, segundo o corregedor, a PF também apreendeu em seu carro um cheque no valor de R$ 182 mil em seu veículo. O cheque fora emitido pelo advogado Newton Júnior Martis Arteman e as circunstâncias da emissão deste cheque, segundo o corregedor, ainda estão sob investigação.
FAMÍLIA PIMENTEL
Contra o desembargador aposentado Sideni Soncini Pimentel também pesaram as denúncias de enriquecimento ilícito, principalmente por conta de supostas necociatas entre os escritório dos filhos dele com os filhos do desembargador Vladimir de Abreu, que também está afastado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
Sideni, com intermiação de dois filhos advogados está sendo acusado de ter recebido propina para dar decisões favoráveis em uma série de ações judiciais envolvendo compra e venda de fazendas.
Durante o período de investigação, cita o corregedor do CNJ, o patrimônio de Rodrigo Pimentel, filho de Sideni, teria aumentado em 174 vezes e a suspeita é de que parte deste patrimônio tenha sido fruto da negociação de sentenças judiciais.
Com relação à filha, Renata Pimentel, o corregedor aponta sua intensa movimentação com compra e venda de carros de luxo, que ultrapassam os R$ 4,1 milhões em curto período e a aquisição de imóveis, no valor de R$ 2,7 milhões. Os recursos, entendeu o corregedor, teriam origem duvidosa.
DEMORA
A abertura do PAD no Conselho Nacional de Justiça não significa, necessariamente, que Marcos Brito, que ainda está no Tribunal de Justiça, seja punido antes de se aposentar. Se ele quisesse, também poderia "penduar a chuteira" aposentar, assim como fez o desembargador Sideni, que se aposentou aos 74 anos, em outubro passado.
Marcos Brito nasceu no dia 7 de novembro de 1958 e está prestes a completar 67 anos. Ele é magistrado desde novembro de 1988 e somente neste emprego tem mais de 36 anos de contribuição. Então, supondo que não tivesse nenhuma contribuição anterior, poderia ter parado de trabalhar no serviço público há quase dois anos.
Assim como a maior parte das ações judiciais que passam pelas mãos dos magistrados, as questões administrativas, que é o caso de um PAD, também normalmente não têm muita celeridade no Conselho Nacional de Justiça
Contra o desembargador aposentado Divoncir Maran, que em abril de 2021 soltou um traficante condenado a 126 anos de prisão, foi aberto um PAD em setembro 2023 e até agora não foi julgado. Ele está aposentado desde abril do ano passado, quando completou 75 anos..
Contra a desembargadora aposentada Tânia Borges, que já foi punida por ter tirado da prisão seu filho, preso com munições e drogas, tramita um caso no CNJ desde 2018. Ela foi acusada de manter ele com integrantes da chamada máfia do cigarro.


