Desde que a concessão do transporte público ficou a cargo do Consórcio Guaicurus, quase 80% das multas não foram efetivas.
Foram registradas 3.122 multas aplicadas pela Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran), das quais 3.186 tiveram recurso apresentado pela empresa.
Entretanto, até agora, 818 casos foram julgados e apenas 180 multas foram efetivamente aplicadas.
Ou seja, quase 80% das multas aplicadas ao conglomerado de empresas não são efetivadas.
Ministério Público
As informações constam no inquérito civil nº 06.2017.00002300-4, que tramita na 31ª Promotoria de Justiça de Campo Grande sob a responsabilidade do promotor Humberto Lapa Ferri.
Segundo consta na própria resposta da Agetran ao Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), do total de recursos analisados em segunda instância, 22% tiveram a cobrança confirmada e o valor cobrado da empresa que administra o transporte coletivo de passageiros.
Investigação
A investigação foi aberta em 2017, porque até aquele ano o Consórcio não havia pago nenhuma das multas aplicadas desde o início de sua gestão no setor, que ocorreu em 2013.
Segundo consta nos autos, entre 2013 e 2016 foram emitidas pelo menos 3.122 multas à concessionária de transporte público, cujo valor estimado pela promotoria chegaria a R$ 2 milhões, caso todas fossem pagas.
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Agereg
Conforme a Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos (Agereg), quando esta gestão teve início, em janeiro de 2017, foi percebido que 3.186 multas aplicadas que haviam sido contestadas pela empresa em segunda instância estavam paradas porque não havia órgão capacitado para julgar os pedidos.
Isso porque, quando o Consórcio contestava alguma infração imputada a ele e o caso era julgado improcedente pela Junta Administrativa de Recursos de Infração de Transportes (Jarit), a empresa tinha direito de recorrer à segunda instância, porém, de acordo com a Lei Municipal nº 4.584/2007, essa competência cabia à Agereg, que havia se tornado um órgão apenas consultivo a partir da Lei nº 5.554, de 2015.
“Quando assumimos, percebemos que havia um conflito de normas legais que impossibilitavam o julgamento em segunda instância. Passava para a Agereg, mas não temos o poder de julgar mais, somos um órgão apenas consultivo. Por isso criamos o Jajur [Junta de Análise e Julgamento de Recursos de Transportes] e fazemos julgamentos desses recursos”, afirmou o diretor-presidente da Agência, Vinícius Leite.
Multas e valores
Desde que a Agereg começou a atuar, no fim de 2018, o órgão já conseguiu julgar 818 processos, dos quais apenas 180 foram considerados corretos e seguiram para pagamento das multas.
Os valores começaram a ser pagos em maio do ano passado e até o fim de 2019 já haviam sido efetuados 130 pagamentos, que totalizaram R$ 85.478.
Os dados constam no processo e são até 2019, já que neste ano não houve prosseguimento sobre o pagamento ou não dos dividendos.
Problema com a lei
Para o promotor que investiga o fato, o maior problema no abono dessas multas estava na Lei nº 4.584/2007.
“Temos uma legislação em que dois representantes do órgão julgador são quem estão sendo julgados. Na Jarit tem um representante da concessionária e um funcionário. Ou seja, é você colocar alguém para julgar você mesmo”.
Ainda de acordo com o promotor Humberto Lapa Ferri, dois pontos nessa lei eram o principal problema para que as multas aplicadas fossem validas.
O primeiro era sobre os representantes do Consórcio na Jarit (com dois membros dos cinco) e na Jajur (onde há um representante), e o segundo é sobre a forma como as multas eram aplicadas.
“Nessa lei, para se aplicar multa à concessionária, era obrigatório que o preposto assinasse, mas ele nunca assinava, e em algumas substituições precisavam conseguir duas testemunhas, mas os fiscais [da Agetran] diziam que não conseguiam testemunhas”, argumenta.
Alterção na lei
Para que alguns problemas encontrados durante a investigação fossem solucionados, foi emitida pelo MPMS uma recomendação à Prefeitura de Campo Grande, no ano passado, solicitando que as juntas tomassem medidas para aprimorar os trabalhos, além da inscrição da concessionária no Cadastro da Dívida Ativa do município e também que essas incongruências na Lei nº 4.584/2007 fossem alteradas.
Prefeitura de Campo Grande
Em resposta, em outubro do ano passado, a prefeitura afirmou que encaminharia um projeto de lei à Câmara Municipal com o objetivo de fazer essas mudanças na lei.
O documento foi entregue à Comissão de Transporte da Casa em outubro do ano passado, entretanto, antes que ele chegasse a plenário para votação e aprovação, o texto retornou ao Executivo a pedido dele.
Este ano, porém, o Executivo enviou novo texto, que foi aprovado e já está em vigor, no qual altera pontos da Lei nº 4.584/2007.
Para Humberto Lapa Ferri, a principal mudança foi “a alteração de exigência de assinatura do preposto da concessionária [que nunca assinava] e a exigência de 2 testemunhas do auto [ambas as exigências abolidas]”.