A indústria de tabaco aposta nos chamados produtos sem fumaça (smoke free) como uma alternativa menos prejudicial do que o cigarro comum para fumantes que não desejam parar de fumar. A comercialização destes produtos é proibida no Brasil, mas há projeto de lei para regulamentação tramitando no Senado.
Em evento realizado no início deste mês na Suíça, chamado Technovation, o vice-presidente internacional de comunicação da Philip Morris Internacional (PMI), Tommaso Di Giovanni, ressaltou que o debate é similar a introdução da cerveja sem álcool ou produtos zero açúcar no mercado, que não são livres de riscos, mas opções mais saudáveis aos consumidores e que são aceitos como alternativas aos produtos originários.
"São produtos com risco que são substituídos por outros com menos riscos. No caso da cerveja sem álcool, pensou-se que as pessoas não vão deixar de beber, então deram a elas alternativa com menos risco, o mesmo princípio se aplica ao tabaco", disse.
A mensagem apresentada pela multinacional durante o evento foi a seguinte: "Se você não fuma, não comece. Se fuma, deixe de fumar. Se não deixar de fumar, mude para as alternativas de risco reduzido"
Dentro desse mantra, de acordo com Tommaso, a multinacionaPMI desenvolve os produtos sem fumaça, baseados em estudos científicos, com objetivo de dar aos fumantes melhores alternativas.
Segundo a companhia, o cigarro convencional funciona com base na queima do tabaco, que resulta na formação de fumaça que contém mais de seis mil substancias tóxicas e que são apontadas como causas prováveis de doenças ligadas ao tabagismo, como câncer e enfisema, entre outras.
Já os dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) não geram fumaça, mas vapor e, por não haver combustão, há redução de até 95% das substâncias nocivas em relação ao cigarro comum.
O setor ressalta que, apesar de reduzido, o tabaco aquecido não é livre de riscos e é direcionado a adultos fumantes.
Apesar de haver no portfólio os vapes e saches de nicotina de uso oral, o principal produto da PMI é o chamado IQOS, dispositivo eletrônico onde se encaixa um bastão de tabaco que é aquecido. Essa semelhança com o cigarro convencional também é um atrativo para que os fumantes façam a troca, pois o ritual de fumar segurando o cigarro é um componente importante para os fumantes.
"Existem melhores alternativas ao cigarro, e dados científicos demonstram seu potencial de ser menos prejudicial. A peça que falta no quebra-cabeças é o esforço coletivo de governos, comunidade de saúde pública, indústria e sociedade civil para fazer as alternativas acessíveis aos adultos que não irão parar", afirmou Tommaso.
No Brasil,a Anvisa proíbe a fabricação, a importação, a comercialização, a distribuição, o armazenamento, o transporte e a propaganda de todos os dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs), desde os de uso único, os recarregáveis com refis líquidos e os produtos de tabaco aquecido.
Essa proibição não é válida para os cigarros convencionais, que são regulamentados no País.
Conforme noticiou o Correio do Estado, o CEO da PMI, Jacek Olczak, questiona essa distinção.
"Não há um país no mundo que proíbe o cigarro, mas há países que proíbem as alternativas. Enquanto há o debate [sobre a regulamentação] , as pessoas continuam a fumar", pontuou.
Proibição aquece mercado ilícito
O vice-presidente sênior de assuntos externos da PMI, Christos Harpantidis, disse que proibição não implica na redução do número de fumantes, mas empurra essas pessoas para os produtos ilícitos.
Segundo pesquisa divulgada pela Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), que analisou dados de 2018 a 2023 com pessoas de 18 a 54 anos, Mato Grosso do Sul é o segundo Estado do país com maior número de consumidores do cigarro eletrônico, com 4% da população analisada (aproximadamente 31 mil pessoas) consumindo o produto, atrás apenas do Paraná, com 4,5%.
Como os dispositivos eletrônicos para fumar são proibidos no Brasil, todos esses usuários fazem uso de produtos ilícitos, geralmente produtos de contrabando.
Nicolas Otte, diretor de Prevenção ao Comércio Ilícito da PMI, afirma que o comércio ilegal é preocupante, especialmente porque este tipo de produto não tem fiscalização quanto a qualidade e quais os componentes adicionados.
"No brasil há pelo menos 4 milhões de usuários de vapes, que é banido desde 2009, então são usuários de ilícitos. Há uma demanda dos usuários de nicotina e se eles não conseguem legalmente, vão encontrar outro jeito de ter acesso. No nosso ponto de vista [da indústria] é melhor que esses produtos sejam regulados", salientou.
Otte disse ainda que o mercado paralelo é uma perda de oportunidade para o País pois não há arrecadação de impostos, além de manter a criminalidade.
"Antes de se discutir sobre como lidar com o comércio ilícito, a discussão precisa ser sobre o porquê há o comércio ilícito. São politicas inadequadas e excessos de impostos que puxam o consumidor para os produtos baratos, que são os ilícitos. Nós, como indústria, seremos felizes em sentar e conversar sobre regulamentação, porque é do nosso interesse" disse.
"É necessária a regulamentação, pois de outra forma vai continuar a crescer uso de vapes ilícitos, e não sabemos o que tem no liquido, de onde vem. O que é melhor: fechar os olhos enquanto o comércio ilícito cresce ou aceitar os dispositivos eletrônicos como uma melhor alternativa? Ninguém diz que é livre, mas tem menos risco", acrescentou.
Otte concluiu dizendo que os produtos ilegais acabam por manchar a reputação dos produtos legalizados, pois há uma série de problemas causados pelos produtos sem fiscalização e que são atribuídos a toda a categoria.
Regulamentação
O projeto de lei que regulamenta o consumo e o comércio de cigarros eletrônicos (PL 5.008/2023), de autoria da senadora sul-mato-grossense Soraya Thronicke (Podemos), está em tramitação no Senado.
Atualmente, o projeto está em análise na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), onde seu relator é o senador Eduardo Gomes (PL-TO).
Para a senadora, a regulamentação permitirá um melhor controle do comércio, inclusive com o combate às vendas ilegais, e viabilizará uma melhor proteção dos potenciais consumidores, especialmente crianças e adolescentes. Ela avalia que, na prática, a proibição hoje vigente é ineficaz.
A iniciativa conta com o apoio da indústria do tabaco e de parte da população. Em consuta pública realizada no site do Senado, a maioria dos particupantes se declarou favorável a regulamentação.
O texto proíbe a venda ou o fornecimento para menores de 18 anos e prevê que quem desobedecer essa regra estará sujeito a multa de R$ 20 mil a R$ 10 milhões, além de detenção de dois a quatro anos.
O projeto também determina que os dispostivos eletrônicos para fumar deverão ter registro junto à Anvisa, à Receita Federal, ao Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).