A mudança na forma de conceder a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), projeto que é tocado pelo governo federal e que pretende baratear o custo do documento em Mato Grosso do Sul e no restante do País, pode contar com uma ajuda de peso. Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, o secretário nacional de Trânsito, Adrualdo de Lima Catão, disse que a empresa norte-americana Uber se ofereceu para ajudar no projeto CNH para Todos.
Há cerca de duas semanas, o ministro dos Transportes, Renan Filho, anunciou que está em estudo um projeto que prevê suspender a obrigatoriedade de frequentar Centros de Formação de Condutores (CFCs), as conhecidas autoescolas, para obter a CNH nas categorias A (motocicletas) e B (veículos de passeio).
O novo modelo, segundo o governo federal, pode reduzir o custo do documento em até 80% – em Campo Grande pode chegar a até R$ 5 mil em alguns lugares.
Diante dessa confirmação, o debate entre especialistas sobre a viabilidade e a confiabilidade dessa ideia aflorou nos últimos dias. Durante conversa com a reportagem, Adrualdo Catão explicou que o projeto não quer acabar com as autoescolas, mas sim baratear a emissão do documento, por meio de aulas remotas e com professores independentes.
“Não queremos retirar a obrigatoriedade do ensino e do aprendizado, apenas das autoescolas. Por que só se pode aprender nas autoescolas? Uma pessoa que tem renda baixa, mas tem celular e internet, vai poder estudar de graça, já que muitas vezes o curso teórico custa mais de R$ 700,00”, destaca o secretário.
Catão acrescenta que aqueles que se mostram contrários ao projeto são de um setor que está se sentindo prejudicado, mas de maneira equivocada, já que eles tendem a ganhar com a nova alternativa.
“A autoescola para funcionar é obrigada a ter uma sala para diretor, dois banheiros, até a medida do quadro negro é definida na resolução, isso não tem cabimento. ‘Ah, vou perder meu negócio porque não é mais obrigatório’, claro que não, é uma loucura”, afirma.
O secretário explica que os instrutores serão certificados pela Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), por meio de um curso que hoje, segundo ele, é “burocrático”, mas também terá um acesso mais democratizado, com acesso remoto por meio do portal da Senatran.
Adrualdo Catão anunciou também que a Uber, empresa estadunidense que presta serviço de transporte privado, foi ao Ministério para tentar uma “parceria” neste projeto, a fim de modernizar, baratear e desburocratizar todo o processo, envolvendo muitas pessoas no mercado de trabalho e tirando o “monopólio das autoescolas”.
“Eu [Uber] vou ensinar seu motorista por meio do seu curso [Senatran]. Quando ele se certificar, ele vai receber no aplicativo a nomeação de instrutor, que qualquer cidadão vai poder ter acesso para confirmar a veracidade do certificado e, assim, contratar os serviços do profissional”, explica o secretário.
Ao Correio do Estado, a empresa se manifestou sobre essa possível parceria com o Ministério dos Transportes para baratear a CNH.
"A Uber não apresentou qualquer proposta de parceria ao Ministério dos Transportes. Em reunião técnica com a equipe do ministério, realizada em 05/08, foram discutidas ideias de como usar a tecnologia para facilitar o acesso da população à carteira de habilitação", disse a Uber em nota.
PROBLEMA APONTADO
Adrualdo Catão apontou que a maior parte da letalidade no trânsito é causada pela falta de CNH, ou seja, aquelas pessoas que dirigem, mas não têm documento. De acordo com ele, 20 milhões de brasileiros estão irregulares.
“As pessoas dizem que não têm CNH por causa do custo, esse é o fator primordial. Aproximadamente 60 milhões têm idade para ter a CNH e não têm e 85% querem ter. Aí você vai ver os problemas relatados por essas pessoas para não emitirem o documento, e os dois mais apontados são tempo e custo, justamente os dois que queremos resolver com este projeto”, disse.
A reportagem do Correio do Estado mostrou que a cada 10 condutores parados em blitz em Campo Grande, ao menos 4 não têm o documento ou estão com a CNH irregular, conforme Ivanise Rotta, secretária do Gabinete de Gestão Integrada da Vida no Trânsito (GGIT).
Ela também acrescentou que, dos acidentes com mortes registrados na Capital, 70,8% têm ao menos uma das partes sem carteira de motorista. Dados do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul (Detran-MS) apontam que, no primeiro semestre deste ano, foram flagrados 7,7 mil condutores sem CNH em todo o Estado, em fiscalizações do órgão.
Para efeito de comparação, o secretário Adrualdo Catão comparou os dados do Brasil com os do México, que ele afirmou ser um país semelhante na questão socioeconômica, mas mais liberal para emitir a carteira e com uma menor taxa de letalidade no trânsito.
Para tirar o documento no México, basta ser maior de idade (18 anos), apresentar os documentos exigidos, pagar uma taxa e a pessoa sairá com a CNH em mãos. Porém, em alguns estados, os exames teóricos e práticos são facultativos.
UBER X TÁXI
Quando a Uber chegou a Campo Grande, há 11 anos, também houve resistência, principalmente dos taxistas, que temiam ser “extintos” por causa da ferramenta, que prometia cobrar um preço muito menor do que o oferecido pelo serviço na época.
Com o passar dos anos, foi possível perceber que ainda existem taxistas atuando na Capital, em uma quantidade menor do que anteriormente, mas o setor não foi completamente extinto.
Em dezembro do ano passado, o Correio do Estado reportou que o município de Campo Grande conta com 525 alvarás ativos concedidos a taxistas. No entanto, menos da metade deles atua nas ruas da Capital. Hoje, o Brasil é a nação com mais motoristas parceiros da Uber no mundo, com 1,4 milhão de pessoas gerando renda por meio da plataforma.
Em 2021, a empresa gerou valor significativo para a economia brasileira, com R$ 36 bilhões, segundo informou a Uber. Ela também inspirou outras marcas no segmento, como a 99 e a InDrive, que hoje dividem mercado.
*Matéria atualizada às 17h31 de domingo (10)




