“A palavra é uma gaiola com o pássaro do lado de fora”, gosta de dizer, mais ou menos assim, o poeta Bráulio Tavares.
Trata-se de uma metáfora para representar o alto poder de combustão semântica de qualquer termo ao abandonar o seu “estado dicionário” (Drummond) e cair nas graças da criatividade de qualquer pessoa.
Para a escritora e revisora de textos Dáfini Lisboa, a palavra nada mais é do que a representação da expressão humana. Mas a jovem literata sabe bem que, na hora de passar um simples “bom dia” para o papel, muita gente trava e não consegue escrever uma sílaba sem hesitar.
Foi para tirar do labirinto aqueles que facilmente se encurralam com a produção de textos que a também pesquisadora de 34 anos, nascida em Campo Grande e formada em Letras, preparou a oficina “Escrita Criativa e Empoderamento”, que será oferecida gratuitamente, na manhã deste sábado (24), a partir das 9h, na Biblioteca Pública Isaías Paim (Av. Fernando Corrêa da Costa, nº 559, Vila Carvalho).
A atividade integra a agenda do 23º Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler), em Campo Grande, e as inscrições podem ser feitas por telefone – (67) 3316-9161.
Em um breve encontro de duas horas, pessoas de qualquer idade, desde que saibam ler e escrever, podem ter a chance de desbloquear as ideias sob a condução da educadora, que já atuou na equipe de revisão do Correio do Estado.
CRIAÇÃO
Os meandros da criação literária já foram desvendados, ou renovados, por autores de cepa mais clássica, como Henry James (1843-1916), ou de vanguarda, a exemplo do surrealista André Breton (1896-1966).
Mas Dáfini Lisboa centra o foco em uma metodologia norte-americana, posta em prática a partir dos anos 1930, que a oficineira anuncia como pioneira e dona de uma espécie de patente.
“A escrita criativa [EC] é um termo já consolidado para se referir a oficinas, disciplinas, programas de escrita literária ou laboratórios de criação de textos ao redor do mundo. A proposta é aplicar técnicas e gêneros diferentes para trabalhar a escrita de forma geral”, explica a responsável pela oficina.
A prática da EC, afirma, envolve a criação de textos autênticos e envolventes, o contato com textos de outros autores e a troca de conhecimentos entre as pessoas.
“Por isso a oficina ajuda com questões de desbloqueio criativo, podendo usufruir de técnicas da escrita criativa mesmo aqueles que precisam escrever textos acadêmicos, jurídicos ou outros tipos de textos que sejam mais técnicos, rígidos em suas construções e formalidade, por exemplo”, diz Dáfini.
“De forma geral, a metodologia de oficinas desenvolvida em Iowa serve de base para muitos dos cursos no restante do mundo. Algumas das obras mais recomendadas por professores de EC são traduções de materiais norte-americanos, como ‘Para Ler Como um Escritor’, de Francine Prose, e ‘A Jornada do Escritor’, de Christopher Vogler. Mas já temos um desenvolvimento, um histórico, um referencial brasileiro no conceito”, afirma a educadora.
BRASILEIROS
Dáfini Lisboa cita algumas oficinas excelentes no Brasil, como as ministradas por Assis Brasil e por Marcelino Freire.
“Essa área tem se consolidado cada vez mais no País, sendo alvo de pesquisas acadêmicas e de publicações no mercado editorial brasileiro, produzidas por escritores e professores de oficinas”.
Quanto ao empoderar-se no momento da escrita, a oficineira diz que pensa em termos de um “empoderamento criativo”, capaz de fazer com que as pessoas “se entendam capazes de realizar atividades criativas que elas não se considerariam aptas a realizar, tomando consciência de suas capacidades e de sua voz”.
PARA TODOS
Durante a oficina, os participantes são apresentados ao conceito e aos benefícios da escrita criativa. Uma melhor articulação do raciocínio, novos olhares sobre o mundo e os outros, além de mais foco e atenção, estão entre os itens do upgrade que a oficina pode proporcionar.
“Enfatizo a questão de que todos, mesmo quem não tem ambições literárias, podem exercitar a sua capacidade de contar histórias de modo criativo e garantir seu domínio sobre a linguagem. Também trabalho muito a questão de não se julgar, de deixar a escrita fluir de forma autêntica”, destaca a autora, que faz pesquisa de mestrado sobre escritoras sul-mato-grossenses e integra a União Brasileira de Escritores (UBE-MS).
Dáfini Lisboa já ministrou outras oficinas, tanto para acadêmicos quanto para a comunidade em geral, como é o caso do novo projeto, com os conceitos de escrita criativa. Na segunda-feira (19), ela levou a proposta de EC para os alunos do Ensino Médio da Escola Estadual Luisa Vidal Borges Daniel.
MACHADO E JANE AUSTEN
“Não vou citar nenhum caso específico, mas é muito interessante observar como os próprios participantes se surpreendem com o resultado, expressando-se de forma mais emotiva e poética, por exemplo. A oficina também serve como um momento de descontração, e naturalmente surgem momentos engraçados, com criação de textos com finais cômicos e surpreendentes”, relata Dáfini.
O gosto da revisora pelas letras vem de berço. “Meu pai é jornalista e professor de Língua Portuguesa. Tive a influência de ver meus pais lendo e me incentivando à leitura e escrita desde pequena”, afirma.
“Aprecio diversos gêneros literários e autores, dos clássicos aos chamados de entretenimento. Tenho voltado a ler as obras de Machado de Assis e tem sido muito interessante poder refletir sobre o meu entendimento na época em que eu li na escola e nos dias de hoje. Sou fã de Jane Austen, tenho todas as obras dela. Também adoro livros de fantasia e consumo muito, nos formatos tanto impresso quanto audiobook”, desmancha-se.
Para a turma de sábado na Biblioteca Pública, serão aceitos apenas 20 alunos. Uma oportunidade de levar as ideias para um passeio fora da gaiola.





