Um novo estudo americano mostrou que o uso de aparelhos para o tratamento de perda auditiva é capaz de reduzir significativamente o risco de demência. Entre os participantes que fizeram uso dos dispositivos, houve uma diminuição de 60% dos casos de doenças neurodegenerativas.
O trabalho, publicado na prestigiada revista científica Journal of American Medical Society (Jama), reforça a importância do uso dos aparelhos, que ainda é pouco difundido. Estima-se que apenas 17% das pessoas com perda auditiva moderada ou grave os usam.
A correlação entre demência e a perda auditiva já é conhecida pelos pesquisadores há alguns anos, sendo esta considerada um dos principais fatores de risco para o declínio neurológico. Raquel Molina, professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), diz que há algumas hipóteses que podem explicar essa relação.
Além disso, os autores do trabalho apontam que, nos Estados Unidos, pessoas que podem pagar pelos aparelhos geralmente têm acesso a melhores cuidados de saúde. No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) fornece aparelhos auditivos, lembra a professora Raquel Molina, embora haja uma fila de espera.
Neste ano, foram publicados os resultados de um estudo que revela evidência dos efeitos da perda auditiva no agravamento do declínio cognitivo na população brasileira. O trabalho incluiu 800 brasileiros com idade média de 50 anos e mostrou que a dificuldade de audição aumenta a progressão do declínio cognitivo.
Pesquisas como essa reforçam a importância da prevenção. Silvana Maziviero, pesquisadora e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), afirma que existem perdas que são tratáveis com muita simplicidade, como a presença de rolha de cerume no canal auditivo. “Tem pessoas que convivem com esse cerume por anos sem perceber”. Infecções e otites também são causas tratáveis e reversíveis.
Por outro lado, perdas auditivas progressivas e lentas que ocorrem com o envelhecimento exigem o uso de aparelhos auditivos ou cirurgias com próteses implantáveis. Nesses casos, a especialista ressalta a importância de detectar e intervir o quanto antes no problema. “Quanto mais precoce a gente reabilitar, melhor. Quando o paciente chega mais tarde, é mais difícil”, diz.
Para fazer o diagnóstico ainda nos primeiros estágios do problema, é preciso que a família fique atenta aos sinais, como a dificuldade de comunicação. Isso porque o paciente, quase sempre, não consegue perceber as próprias dificuldades.
Para contribuir com a identificação de problemas auditivos, a Organização Mundial de Saúde (OMS) também disponibilizou neste ano um aplicativo para celular, o hearWHO, que avalia a capacidade de audição.
Além da perda auditiva, a prevenção da demência no fim da vida envolve a atenção a outros fatores de risco. Segundo um estudo brasileiro do ano passado, por meio do tratamento e da prevenção de 12 fatores de risco, quase metade dos casos de demência no País seriam evitados. Entre eles, baixa escolaridade, obesidade e hipertensão também figuram como causas importantes de neurodegeneração na população.
Para Maziviero, também é preciso reduzir o preconceito contra o uso de aparelhos auditivos, ainda cheio de estigmas. Segundo ela, o cuidado com a audição, especialmente nos dias atuais, é fundamental para termos um envelhecimento mais saudável. “É uma poupança que a gente está fazendo, uma reserva auditiva para daqui a alguns anos”.
*SAIBA
14 fatores associados aos casos de demência*
- – Baixo nível educacional;
- – Colesterol alto;
- – Consumo excessivo de álcool;
- – Depressão;
- – Diabetes;
- – Falta de atividade física;
- – Falta de contato social;
- – Hipertensão;
- – Lesões graves na cabeça;
- – Obesidade;
- – Perda de audição;
- – Perda de visão;
- – Poluição do ar;
- – Tabagismo.
* Levantamento publicado na revista The Lancet, em 2024.



