Imagine um mundo em que você poderia tocar os objetos, andar pelas pessoas na rua, ser bem atendido no supermercado ou ter as informações corretas no aeroporto, por exemplo. Tudo isso seria possível hoje - se não estivéssemos falando de um mundo virtual. Descrita pela primeira vez ainda no século XIX e após anos de aprimoramento das máquinas envolvidas no processo, o futuro das imagens em três dimensões é palpável: a intenção é ultrapassar a percepção humana.
Nos anos 2000, avanços significativos foram feitos com o uso desta tecnologia na indústria cinematográfica, como a construção do filme já icônico na área, Avatar, do diretor James Cameron. Mas é nas ferramentas do dia a dia que se podem perceber as mudanças mais sensíveis.
Nos últimos dois anos, uma série de eletrônicos com a tecnologia 3D foram lançados, de câmeras domésticas a notebooks, passando pelas primeiras super TVs com preços pouco populares e as mais recentes, que dispensam o uso dos óculos ou que usam óculos mais leves, mais confortáveis e mais baratos.
No início de 2011, a LG lançou o primeiro smartphone que pode visualizar e gravar vídeos em 3D sem o uso de óculos especiais. O Optimus 3D usa a tecnologia paralaxe para criar a ilusão da imagem em três dimensões em uma tela plana por meio de uma espécie de entrelaçamento de duas telas posicionadas em ângulos diferentes. Mas até onde a tecnologia das três dimensões para imitar a realidade do mundo físico pode chegar?
Para o coordenador do Departamento de Entretenimento Digital da Unisinos em São Leopoldo (RS), João Ricardo Bittencourt, o desafio do 3D para o futuro imediato são as projeções de elementos sintéticos sobre imagens reais e o trabalho com a realidade aumentada. Para ele, a resposta desta questão é encontrada voltando alguns anos atrás e se inspirando no Second Life, uma ferramenta na qual os usuários criam uma vida virtual paralela e podem comprar, encontrar amigos, trabalhar em um escritório, por exemplo - tudo virtualmente, sem sair da cadeira do computador.
Segundo Bittencourt, os avanços dos equipamentos para construção das imagens em três dimensões tendem a criar imagens dobráveis e fluidas - como fogo e água - cada vez mais definidas e, em um último estágio, trazer a experiência do Second Life para a vida real, em que o holograma faria parte real do cotidiano. "(A discussão sobre este assunto) está mais no domínio da ficção científica", ressalva o coordenador.
Já o especialista em Meios Eletrônicos Interativos e coordenador do Laboratório de Sistemas Integráveis da USP, em São Paulo, Marcelo Züffo, mergulha mais profundamente no que se refere ao que o 3D pode significar. Ele prevê um futuro mais distante, tanto no campo cronológico como no das ideias. No entanto, o que Züffo enxerga é completamente factível.
Para ele, o homem deu somente os primeiros passos quando o assunto é aproveitamento e aplicação do conceito das três dimensões no dia a dia. Züffo também prevê que entre 2012 e 2014 todos os televisores sejam produzidos em 3D Ready - um conceito que engloba um conjunto de diferentes técnicas e processos pelos quais é possível ver uma imagem tridimensional, com ou sem o uso de óculos.
Zuffo aponta que, deixando as máquinas e a construção da imagem em si de lado, um grande obstáculo para o desenvolvimento desta tecnologia é a difícil massificação, também consequência do alto preço da produção destas imagens, que, por sua vez, dependem do alto custo de aparelhos para que se possa visualizá-las. "O desafio é a produção de conteúdo, aplicações em educação, medicina e treinamento", explicou.
A perspectiva que se abre após esta barreira ser ultrapassada deve intensificar e otimizar o ensino nas escolas, por exemplo, como aponta Bittencourt. "Já pensou que legal seria aprender química em um espaço 3D interativo? Ou no caso de realidade aumentada, fazer um curso de conserto de computadores e poder ver manuais?", exemplifica o coordenador.
Para além da ficção científica e dos filmes da franquia Star Wars, pensar que, no futuro, atendentes de supermercado ou informantes de aeroportos, por exemplo, sejam meros hologramas é pensar em uma realidade bem mais palpável que a dos estúdios de Hollywood. Mas, na prática, para que substituir uma atendente humana por um holograma, uma imagem projetada em um espaço tridimensional programada para falar, sugerir e dar preços?
Sem entrar na discussão sócioeconômico de uma medida desta natureza, se imaginarmos um ambiente de uma joalheria de um grande shopping, por exemplo, em que todos os atendentes fossem hologramas, o sistema de fechamento das portas e acionamento da segurança do local no caso de um assalto seria mais eficaz e não haveria feridos.
Se a necessidade é a mãe da invenção, como afirmou o filósofo grego Platão há mais de dois mil anos, o que os especialistas da construção das imagens tridimensionais parecem querer provar é que, neste caso, é a fome pela invenção que deve guiar as necessidades da humanidade daqui para diante. E também a vontade de brincar um pouquinho de Deus, criando um universo paralelo em que se pode ter o controle de absolutamente tudo que existe - virtualmente.