Cidades

ENTREVISTA

"A ação do Cimi e dos indígenas foi violenta e criminosa", José Raul das Neves Jr.

Engenheiro-agrônomo e produtor rural, que teve a propriedade invadida por indígenas há dois meses, diz que ele, seu pai e sua mãe não têm outra fonte de sustento

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Filho do proprietário e administrador da Fazenda do Inho, José Raul das Neves Júnior, de 61 anos, vive o drama de ter o único sustento da família ocupado por indígenas guarani-kaiowá há pouco mais de dois meses, sem qualquer perspectiva de desocupação.

Filho de José Raul das Neves, de 83 anos, atual dono da fazenda comprada por seu pai, o imigrante português Manoel das Neves, em 1967, José Raul Júnior, que chegou a presidir o diretório do Partido dos Trabalhadores (PT) em Rio Brilhante, disse estar recebendo solidariedade da classe produtora e também de parlamentares da legenda, como o deputado estadual Zeca do PT e o deputado federal Vander Loubet. 

José Raul Júnior queixa-se da forma que a terra que administra foi invadida e da falta de qualquer estudo ou reivindicação formal dos indígenas no passado. “[A fazenda] nunca constou em documento e em nenhuma reunião sobre terras reivindicadas”, disse. 

Sobre a possibilidade de o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) ter patrocinado a ocupação, fretando dois ônibus a um custo de R$ 20 mil (informação publicada na edição do Correio do Estado desta sexta-feira e que consta em inquérito da Polícia Civil), e quanto à forma que os indígenas trataram seus funcionários, colocando facão no pescoço e com outros atos de violência, ele foi categórico: “Se comportaram como extremistas criminosos”. 

Como está a ocupação na sua propriedade, a Fazenda do Inho? Os indígenas continuam por lá?

Eu acredito que são poucos índios agora. Eles integram a comunidade que estava na propriedade do meu vizinho. Eles moravam na mata da reserva legal da fazenda vizinha à minha. 

Certamente tem poucas famílias no momento, mas, no mês de março, foram despejados pelo menos 80 indígenas na minha propriedade para a invasão. Eles vieram em uns dois ônibus. Parte deles, porém, voltou para as aldeias de origem depois que eu judicializei a questão. 

Você acredita no envolvimento do Cimi na invasão de sua fazenda? A Polícia Civil em Rio Brilhante tem indícios de que eles fretaram os ônibus que levaram os indígenas para a ocupação.

Olha, sobre a possibilidade de o Conselho Indigenista Missionário estar envolvido, eu tive de prestar depoimento na Polícia Civil sobre isso, na delegacia de Dourados. Eu fui indagado se tinha feito pressão na garagem de ônibus, o que em hipótese nenhuma aconteceu.

O que houve foi que meus funcionários da fazenda me avisaram que chegaram dois ônibus naquela noite. Eu não vi nada, não vi placa, não fiquei sabendo de que lado vieram esses ônibus. 

Não sei se foram pessoas do Cimi ou ligadas à Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas], mas delataram, falsamente, que eu fiz pressão no motorista do ônibus, o que não aconteceu.

Conte-nos mais sobre sua propriedade que foi invadida pelos indígenas, a Fazenda do Inho. Desde quando ela pertence à sua família?

Trata-se de uma fazenda com escritura pública e georreferenciamento e que está em dia com o Cadastro Ambiental Rural [CAR]. Meu avô comprou essa propriedade em 1967. Ele comprou da família Pinha [Manoel Pinha], que era de Presidente Venceslau, que, por sua vez, havia comprado do senhor Augusto Nogueira.

O filho do senhor Augusto, Athaide Nogueira, no passado chegou a ser prefeito de Rio Brilhante. O meu avô, primeiro dono da fazenda, Manoel das Neves, era um imigrante português que desembarcou no Brasil em 1937.

Ele veio antes da minha mãe, que ficou lá [em Portugal], grávida do meu pai. Só depois de 11 anos que ele mandou buscar a minha mãe e trouxe meu pai, José Raul das Neves. 

O meu avô Manoel teve de deixar Portugal porque era perseguido pela ditadura do Salazar [Antônio de Oliveira Salazar, que governou o país europeu entre 1933 e 1968]. Trata-se de uma propriedade que tem todos os títulos reconhecidos, totalmente legalizada, e que nunca foi alvo de reivindicações até então. 

Sua fazenda nunca foi alvo? O que houve que levou os indígenas até ela, então? 

Eu vou explicar. Em 2005, o Ministério Público Federal teve uma reunião com representantes dos indígenas. Desta reunião, surgiu um termo de ajustamento de conduta [TAC] que obriga a Funai a fazer demarcações de terra em todo o estado de Mato Grosso do Sul, sobretudo na região Cone-Sul.

Isso foi amplamente divulgado na época. Apesar de a reunião ter contado com diversas autoridades, eu não vi assinatura de nenhuma delas nesse TAC. Mas, enfim, surgiu esse compromisso de demarcação, sob pena de multa diária, e nesse termo estavam identificadas várias áreas indígenas.

Uma muito famosa, por exemplo, é a Amambaipeguá, nas cidades de Caarapó e Amambai, palco de vários conflitos com os proprietários.

Em cinco ou seis destas áreas identificadas, foi determinado que se fizesse um estudo antropológico. Havia, por exemplo, a Brilhantepeguá, aqui perto, no município de Douradina, perto do Rio Brilhante. 

Havia nesse TAC umas oito áreas, porém, em nenhuma dessas terras indígenas constava a minha propriedade, a Fazenda do Inho. Tinha terra indígena em Panambi, em Carumbé, tudo ali para o lado de Itaporã. Mas nada na margem esquerda do Rio Brilhante, onde está minha fazenda. 

O que ocorre é que este grupo de indígenas que invadiu a minha propriedade é o mesmo que invadiu a Fazenda Santo Antônio da Nova Esperança, pertencente à família Cerveira, uma família tradicional de Dourados. 

Mas, se a sua fazenda não está entre as áreas que a Funai determinou a demarcação, como os indígenas chegaram até ela?

Esses indígenas que invadiram a nossa região, inclusive a minha fazenda, são todos aldeados na Lagoa Rica, em Douradina. Esse grupo, no passado, havia invadido a Fazenda Spessato, em 2007. Na ocasião, eles haviam deixado a aldeia e invadiram a propriedade, na região do Panambi.

A reivindicação era pressionar a Funai para realizar os estudos antropológicos com mais rapidez naquela área, que constava no termo de ajustamento de conduta.

Houve certa mobilização na época com os sindicatos surais, e os indígenas acabaram deixando a fazenda depois de um acordo, do qual participaram o finado deputado Ary Rigo, o Ministério Público Federal e a Funai. O acordo consistia em o poder público promover melhorias estruturais na aldeia, o que foi feito.

Em 2008, alguns indígenas voltaram a deixar a aldeia, atravessaram o Rio Brilhante para o lado de cá e invadiram a área da reserva legal do meu vizinho.

Na época, eles eram liderados pelo cacique Farid Mariano. Eles ficaram ali na reserva legal, e a minha propriedade, na BR-163, fica de para-choque – e o mato era justamente a divisa comigo. 

Para você ter uma ideia de como a minha propriedade nunca esteve em qualquer estudo ou plano, houve um dia em que o Ministério Público Federal, com diversas autoridades, chegou na minha propriedade. Na ocasião, havia um pedido de reintegração de posse no meu vizinho.

Eles estavam complemetamente perdidos, nem sabiam onde os índios estavam. Foi depois disso que eles deixaram a área, voltaram para a beira do asfalto por um ano.

Mas aí voltaram ao meu vizinho e lá ficaram por 17 anos. A causa da invasão, que era para pressionar para demarcar a terra indígena em Panambi, que fica do outro lado do rio, acabou se perdendo.

Mas qual a justificativa deles agora para a invasão de sua fazenda e a de seu vizinho?

Isso é que é interessante. Agora, praticamente do nada, surgiu um nome: Laranjeira Ñanderu. Esse nome nunca existiu no termo de ajustamento de conduta anterior. Nunca constou em documento e em nenhuma reunião sobre terras reivindicadas. Fizeram isso para justificar as invasões.

JoséFoto: Acervo Pessoal

Perfil

José Raul das Neves Júnior
Engenheiro-agrônomo

administra, em Rio Brilhante, a fazenda adquirida por sua família em 1967. 

"A minha fonte de renda, da minha mãe e do meu pai é exclusivamente essa propriedade. Agora, o meu pai, de 83 anos, só tem uma aposentadoria de um salário mínimo do INSS e não tem plano de saúde”. 

 

Tem buscado medidas judiciais para ter a posse da fazenda novamente?

Sim. Entramos com uma ação. Ela tramita na 2ª Vara Federal de Dourados. Estamos pedindo para que nos devolvam a posse, para que possamos voltar a trabalhar. A fazenda é nosso único sustento. Seria bom que a liminar fosse analisada com uma certa urgência.

E, neste período, do que você e seu pai estão vivendo?

Esta é uma boa pergunta. Ainda não paramos para pensar. As coisas estão simplesmente acontecendo. A fazenda está em nome do meu pai, José Raul das Neves, de 83 anos. Minha mãe também tem mais de 80 anos. Eu sou o administrador e cuido da fazenda com meu sobrinho.

O meu pai, tirando a renda da fazenda, tem uma aposentadoria do INSS de um salário mínimo e não tem plano de saúde. Minha mãe não tem plano de saúde.

E eles deixaram vocês plantarem o milho da safrinha? Conseguiram colher a soja que haviam plantado?

Com muito custo, tiramos a soja, mas quase que não deixaram. Tínhamos começado a fazer a colheita da soja quando ocorreu a invasão. Daí, depois de a fazenda ter sido invadida, o deputado Vander Loubet, com o MPF, intermediou um acordo para que conseguíssemos colher a soja.

Tivemos só dois ou três dias para isso. Ainda assim, deixamos grãos para trás em um varjão, não tinha jeito de colher ali. 

Tínhamos plantado em torno de 70 hectares a 80 hectares de milho. Mas com certeza perdi tudo, porque não pude acompanhar toda a cultura, o crescimento. Eles têm o controle sobre as porteiras, mas mantêm trancadas, e ocuparam a sede e as casas.

E como vai pagar as contas?

Como disse, ainda não parei para pensar. O que eu tenho é uma dívida grande, que contraí com a cooperativa e também com o Banco do Brasil [para financiar a safra] de aproximadamente R$ 700 mil. Ainda que eu pudesse plantar o milho agora, também não daria, porque perdi o prazo. 

Quando a sua fazenda foi ocupada, houve zombaria no campo da direita pelo fato de você ser filiado ao PT? Você teve apoio dos produtores?

Olha, isso que eu estou passando não pode ser misturado dentro de uma ordem política. Independentemente do partido político que os proprietários acreditam ou são filiados, a verdade é que temos mais de 150 fazendas produtivas invadidas por indígenas, propriedades que estão judicializadas, em um processo em que se pede a reintegração de posse, muitas delas há 10, 15 ou 20 anos.

Não adianta muito eu buscar solidariedade com grupos políticos. Eu tenho tido solidariedade dos meus colegas produtores rurais. A forma como os indígenas e o Cimi agiram comigo é uma violência. Um ato criminoso. 

Isso lhe aterrorizou?

Sim. Eles entraram na casa do meu funcionário. Meu caseiro estava dormindo no quarto dele, foi acordado pelos indígenas e ficou em cárcere privado. Colocaram um facão no pescoço dele, com um porrete em direção à cabeça dele, tiraram o celular. Isso me aterrorizou.

Na minha casa da fazenda, tomaram posse da minha sala, dos meus sonhos, do meu trabalho. Da minha história, da história do meu avô. E também tem uma parte grande dos jornalistas que escolhe o lado de quem invadiu e não nos procura para ouvir a nossa versão.

Tenho também a solidariedade de alguns colegas, como Zeca do PT e Vander Loubet. Mas não sei se vou conseguir resolver alguma coisa. 

E os indígenas têm plantado alguma coisa na sua propriedade, colhido alguma fruta?

Nada. Eles dependem da cesta básica da Funai, o Distrito de Saúde Indígena vai lá prestar assistência e a prefeitura esporadicamente dá assistência também. 

Está otimista?

Olha, eu estou vivendo uma situação extremamente delicada. Eu não tenho mais fonte de renda, ela simplesmente acabou, com essa invasão. Estou vivendo a duras penas. A minha fonte de renda, da minha mãe, do meu pai e do meu sobrinho era exclusivamente essa propriedade.

Sobre o suporte dado pelo Conselho Indigenista Missionário [aos indígenas], eu considero um órgão extremista. Não tenho muita esperança. Mesmo que eu consiga uma reintegração de posse, eles [Cimi] vão atuar para que não seja cumprida. 

 

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PREVISÃO

Domingo em MS será de chuvas que podem chegar até 100mm, diz Inmet

Previsão coloca todos os 79 municípios do Estado em alerta amarelo e laranja de chuvas intensas

14/12/2025 10h40

As previsões são de chuva para este domingo (14)

As previsões são de chuva para este domingo (14) FOTO: Paulo Ribas/Correio do Estado

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Seguindo a tendência da última semana, este domingo (14) em Mato Grosso do Sul deve ser chuvoso, com precipitação que pode chegar até os 100 milímetros (mm), de acordo com os alertas emitidos pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

Assim como grande do País, o Estado também está dentro do aviso de perigo potencial (amarelo) para chuvas intensas no decorrer do dia, e deve seguir até às 10h desta segunda-feira (15). Sem exceção, os 79 municípios sul-mato-grossenses estão inseridos neste alerta.

Em sua descrição, o Inmet avisa para chuvas entre 20 e 30 mm/h ou até 50 mm/dia, acompanhadas de rajadas de vento de até 60 km/h. Mesmo diante disso, a entidade diz que há “baixo risco de corte de energia elétrica, queda de galhos de árvores, alagamentos e de descargas elétricas”.

Das cidades de Mato Grosso do Sul que estão inseridas neste alerta amarelo, 19 estão em outro de um patamar mais elevado de perigo, o nível laranja. Para estes municípios, o Inmet fala que há chance alta de precipitação de entre 30 e 60 mm/h ou 50 e 100 mm/dia, com ventos intensos de até 100 km/h. Confira abaixo as cidades de MS presentes neste aviso:

  • Anaurilândia
  • Aparecida do Taboado
  • Bataguassu
  • Batayporã
  • Brasilândia
  • Eldorado
  • Iguatemi
  • Itaquiraí
  • Japorã
  • Jateí
  • Mundo Novo
  • Naviraí
  • Nova Andradina
  • Novo Horizonte do Sul
  • Paranaíba
  • Santa Rita do Pardo
  • Selvíria
  • Taquarussu
  • Três Lagoas

Nas orientações, o instituto sugere à população destas cidades a não se abrigar debaixo de árvores, pois há riscos de descargas elétricas, além de desligar aparelhos elétricos e quadro geral de energia. Em caso de emergência, contatar a Defesa Civil (telefone 199) e o Corpo de Bombeiros (telefone 193).

Estragos

Nesta sexta-feira (12), a cidade de Paranhos, a 462 km de Campo Grande, foi alvo de um forte temporal que deixou um rastro de destruição no município.

Conforme registrado pelo Inmet, a região registrou, entre as 4h e as 18h de ontem, uma precipitação acumulada de 181,6 mm.

A intensidade das chuvas causou a queda da ponte de madeira que passa sobre o Rio Destino e dava acesso ao Assentamento Beira Rio e às aldeias Ypo`i e Sete Cerros na zona rural do município.

Em outro ponto do mesmo rio, uma ponte de concreto foi completamente carregada pelas águas. A estrutura dava acesso à Fazenda Itapuã e ao Assentamento Vicente de Paula e Silva.

Para acessar a cidade, moradores de ambas as regiões afetadas pela queda das pontes terão dar a volta pela Rodovia MS-165, pela linha internacional que separa Brasil e Paraguai.

Com o grande volume de chuva, o Rio Iguatemi chegou a transbordar encobrindo uma ponte, na altura que liga a cidade de Paranhos a Rodovia MS-156, entre Amambai e Tacuru,

Outra inundação ocorreu na zona urbana de Paranhos, onde o Lago Municipal encheu por completo.

*Colaborou Mariana Piell

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ALERTA

Sífilis continua em ritmo acelerado de crescimento no país

Situação é mais grave entre mulheres jovens e gestantes, diz médica

14/12/2025 10h15

Sífilis é uma doença infecciosa que evolui lentamente em três estágios

Sífilis é uma doença infecciosa que evolui lentamente em três estágios Foto: Ministério da Saúde

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Dados do Ministério da Saúde, divulgados em outubro deste ano, mostram que a sífilis continua em ritmo acelerado de crescimento no Brasil, acompanhando uma tendência mundial. A situação é mais grave entre as gestantes: entre 2005 e junho de 2025, o país registrou 810.246 casos de sífilis em gestantes, com 45,7% dos diagnósticos na Região Sudeste, 21,1% no Nordeste, 14,4% no Sul, 10,2% no Norte e 8,6% no Centro-Oeste.

A taxa nacional de detecção alcançou 35,4 casos por mil nascidos vivos em 2024, o que revela o avanço da transmissão vertical, quando a infecção passa da mãe para o bebê.

Segundo a ginecologista Helaine Maria Besteti Pires Mayer Milanez, membro da Comissão Nacional Especializada em Doenças Infectocontagiosas da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), a luta para controlar os números da sífilis congênita se estende desde a década de 1980.

“Na realidade, sempre tivemos problema com a questão da sífilis no Brasil. Ainda não conseguimos encarar a redução dessas cifras há muitos anos”, disse à Agência Brasil.

Apesar de ser uma doença mais fácil de diagnosticar, rastrear e barato de tratar, em relação ao HIV, por exemplo, ainda não conseguimos o enfrentamento adequado para a redução significativa entre as mulheres jovens e também em fetos recém-nascidos.

"Então, temos um problema sério no Brasil, tanto com relação à população adulta jovem e,  consequentemente, na população em idade reprodutiva, e daí o aumento na transmissão vertical." Para a médica, a sífilis é um desafio que ainda não conseguiu resultados positivos, diferentemente do que foi conseguido em relação ao HIV.

Subdiagnóstico

Helaine apontou que, “infelizmente”, a população da área da saúde subdiagnostica a infecção. O exame que se realiza para fazer a identificação da sífilis através do sangue é o VDRL (do inglês Venereal Disease Research Laboratory), teste não treponêmico, mais usado no Brasil.

Ele não é específico do treponema, mas tem a vantagem de indicar a infecção e acompanhar a resposta ao tratamento. Outro teste é o treponêmico, que fica positivo e nunca mais negativo.

A ginecologista explicou que o que tem acontecido, na prática, é o profissional da saúde ao ver o exame treponêmico positivo e o não treponêmico negativo, assumir que aquilo é uma cicatriz e não precisa tratar.

“Esse é o grande erro. A maioria das grávidas estará com um teste não treponêmico ou positivo ou com título baixo. Aí, ela mantém o ciclo de infecção que infecta o parceiro sexual e seu feto dentro do útero”. A interpretação inadequada da sorologia do pré-natal tem sido um problema, segundo a médica.

Outro  problema é o não tratamento da parceria sexual.

“Muitas vezes, os parceiros ou são inadequadamente tratados ou não tratados,  e aí as bacatérias continuam circulando na gestante e no parceiro que não foi tratado e ele reinfecta a mulher grávida e, novamente, ela tem risco de infectar a criança.”

O não diagnóstico adequado, a não valorização da sorologia no pré-natal acabam levando ao desfecho de uma criança com sífilis congênita.

A Febrasgo promove cursos de prevenção e tratamento das Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) aos profissionais de saúde, além de produzir vários materiais técnicos de esclarecimento da população de médicos para que abordem de modo adequado as pacientes. 

Helaine Martinez participa ainda do grupo de transmissão vertical do Ministério da Saúde, que tem, há muitos anos, protocolo clínico e diretrizes terapêuticas da transmissão vertical de sífilis, HIV e hepatites virais. O material está disponível online para qualquer pessoa que queira acessá-lo.

“A gente fala que não é falta de informação. Mas precisa aplicar e estudar para ter o conhecimento adequado. Hoje a ocorrência de sífilis congênita é um dos melhores marcadores da atenção pré-natal”.

Infectados

A população que mais infecta agora por sífilis e HIV no Brasil é a situada entre 15 e 25 anos e também a terceira idade. “A população jove, porque caiu o medo em relação às infecções sexualmente transmissíveis, e acabou abandonando os métodos de barreir. Quanto ao HIV, não existe mais aquele terror, porque é uma doença crônica tratável. Isso fez com que os adultos jovens baixassem a guarda na prevenção das infecções sexualmente transmissíveis”.

Já a terceira idade, com o consequente aumento da vida sexual ativa, com uso de remédios como o Viagra, que melhora a performance sexual dos homens mais velhos, e a falta do receio, porque não tem o risco de gravidez, contribui para o abandono dos métodos de barreira.

Um problema sério no Brasil é que a maioria das mulheres grávidas, mais de 80%, não tem sintoma da doença durante a gestação. Elas têm a forma assintomática, chamada forma latente. Com isso, se o exame não for interpretado da maneira adequada, a doença não será tratada e ela vai evoluir para a criança infectada.

Helaine Martinez afirmou que o homem também tem grande prevalência da doença assintomática atualmente. A partir do momento em que o indivíduo entra em contato com o treponema, ele desenvolve uma úlcera genital, que pode também ser na cavidade oral. Aí, esse cancro, na maior parte das vezes, aparece no órgão genital externo, na coroa do pênis. Já na mulher, a lesão fica escondida no fundo da vagina ou no colo do útero. Não é comum ela ficar na vulva. Portanto, ela passa despercebida para a mulher.

Riscos

O que acaba acontecendo é que no homem, mesmo sem tratar a sífilis, a lesão desaparece. Se ele não tiver agilidade e buscar atendimento, a lesão pode desaparecer, ele acaba não sendo tratado e acumula alto risco de transmitir para sua parceira sexual. 

Tanto a lesão da parte primária, que é o cancro, desaparece sem tratamento. Pode aparecer uma vermelhidão no corpo todo que também desaparece mesmo sem tratamento. O grande problema da sífilis é que a doença tem um marcador clínico de lesão na fase primária e secundária, mas a parte latente é assintomática e, mesmo nessa fase, o homem transmite a doença. A maioria desses homens não tem sintoma e, se não fizerem exame, não são identificados, indicou a especialista.

O único método que identifica o paciente é raspar a lesão e fazer a pesquisa do treponema porque, na fase inicial, os exames laboratoriais do sangue do paciente podem ser negativos. Mas eles positivam em média em duas ou três semanas.

Carnaval

A ginecologista afirmou que com a proximidade das festas carnavalescas, o contágio por sífilis é uma ameaça constante, porque as práticas sexuais com proteção nem sempre são utilizadas nessa época do ano.

“O abandono dos métodos de barreira tem feito crescer, infelizmente, as infecções sexualmente transmissíveis”.

Ela lembrou que, atualmente, já existe um recurso para o HIV, que é a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição). Trata-se de um medicamento antirretroviral tomado por pessoas sem HIV 24 horas antes de a pessoa se expor a uma relação de risco, para prevenir a infecção. O medicamento reduz o risco em mais de 90% quando usado corretamente, através de comprimidos diários ou injeções, sendo ideal para populações-chave em maior risco e disponível gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil.

Sem tratamento, a infecção pode evoluir para a fase secundária, caracterizada por um exantema difuso (manchas na pele), que atinge inclusive as palmas das mãos e as plantas dos pés. A doença também pode provocar alopecia em “caminho de rato” e condiloma plano (lesão genital).

“A fase secundária apresenta grande quantidade de treponemas circulantes (altos níveis da bactéria no sangue). Em gestantes, a chance de acometimento fetal chega a 100% quando a gestante apresenta a sífilis recente, o que torna o diagnóstico e o tratamento ainda mais urgentes”, destacou a médica. 

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