A preocupação em se evitar uma nova catástrofe no Pantanal, como ocorreu no ano de 2020, diante dos incontroláveis incêndios, gerou alerta internacional para apontar que há 246 km² no bioma com classificação de grande perigo para incêndio. Essa área equivale a cerca de 37 mil campos de futebol.
Por conta dos recentes incêndios, os pesquisadores chegaram à conclusão de que uma área comparada a 9,2 mil campos de futebol ainda não conseguiu ser recuperada após o fogo recente.
Essas regiões em alerta vermelho podem propagar o fogo para outras partes do bioma e causar um prejuízo milionário.
Esse alerta foi feito a partir de estudos do Laboratório Ecologia da Intervenção (UFMS) e do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais do Departamento de Meteorologia da UFRJ (Lasa), com apoio do Ministério Público Estadual, além da participação do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia e da Universidade Charles Darwin (Austrália).
Para conseguir identificar as áreas de maior risco para incêndios no Pantanal, que tem 138.183 km², os pesquisadores buscaram base meteorológica de tendência de risco de incêndio no período de 1980 a 2020.
Ainda foram analisados outros critérios, como intensidade do fogo registrado, ocorrência de registro em 2021, a reincidência de incêndios entre 2003 e 2020 e a situação da vegetação nativa ao longo de cursos d’água.
Para restaurar as áreas com grande e médio potencial para regeneração natural, o custo previsto nesse estudo é de US$ 123 milhões.
Esse valor foi estimado com base no alto custo logístico que o Pantanal oferece, por conta de sua dimensão e dificuldade de acesso, e a necessidade de aplicação de diferentes técnicas de restauração, dependendo da sub-região do bioma e a diversidade vegetal encontrada.
Os pesquisadores ainda apontam que os proprietários das fazendas têm possibilidade de realizar essa restauração de forma mais barata do que com a contratação de empresas especializadas.
Para garantir que o alerta tivesse alcance mundial, esse estudo foi publicado no jornal científico Elsevier, que está entre as seis empresas que dominam a publicação científica no mundo. O Correio do Estado teve acesso à pesquisa.
O incêndio no Pantanal tem potencial para se alastrar porque o fogo acaba sendo levado pelo vento, como foi mostrado em 2020 e 2021 pelos bombeiros. A vegetação seca e a dificuldade de acesso, em alguns locais, também contribuem para que as chamas se alastrem.
Há regiões que exigem mais de 4 horas de viagem, por via terrestre, para que os brigadistas consigam chegar. Esse tempo de resposta possibilita que o fogo alcance muitas áreas.
“Nós identificamos 246 km² com grande risco de incêndio, com grande probabilidade de megaincêndios, com tipos de vegetação que possuem espécies vegetais que podem queimar mais facilmente. Identificamos que, enquanto 179 km² tiveram grande ou médio potencial de regeneração, 66 km² tiveram baixo potencial e precisam de ações de restauração. Por volta de 3.120 km² tiveram severa degradação por conta dos incêndios recentes”, apontou o estudo, que foi assinado pelos pesquisadores Paula Isla Martins, Liz Barreto Coelho Belém, Judit Kriszta Szabo, Renata Libonati e Letícia Couto Garcia.
É fato que os incêndios não chegam a alcançar toda a área do Pantanal. Isso porque a intervenção humana está diretamente ligada a essas ocorrências, de acordo com levantamentos que estão sendo feitos por entidades públicas responsáveis pela fiscalização.
O fogo pode ser responsável por danos ambientais e prejuízo econômico. Quando ele fica descontrolado, pastagens são atingidas, a criação da pecuária corre risco de ser atingida e o trade turístico que atua no bioma também recebe o impacto negativo, com redução de venda de pacotes.
Em todo o Pantanal (em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso), a estimativa é de que haja cerca de 20 mil proprietários rurais, além de 32 mil negócios, de acordo com dados do Sebrae.
“Em 2020, a maior área alagada do mundo sofreu uma das mais severas tragédias de sua história, com quase 1/3 de sua área queimada. Além disso, 43% de área afetada pelo fogo no Pantanal em 2020 não tinha sido queimada nas últimas 2 décadas. O fogo descontrolado ocorreu por conta de uma combinação de prolongada seca e atividade antropológica [atividade humana], incluindo problemas elétricos, queima de lixo, coletores de mel, fogo acidental em lixo e manejo de pastagem”, identificaram os pesquisadores a partir de estudos prévios feitos em 2020.
PERIGO IMINENTE
O período de seca na região do Pantanal entrou em seu quarto ano seguido em 2022, e a previsão é de que dure pelo menos até 2024.
O Ministério do Meio Ambiente já decretou estado de emergência para Mato Grosso do Sul no período de maio a dezembro deste ano, para garantir que brigadas de incêndio sejam contratadas de forma extraordinária para estarem preparadas para o combate.
Além disso, 529.450 hectares foram identificados no bioma com grande acumulado de biomassa, material de alta combustão e que serve para propagar um incêndio.
Essas áreas, que foram identificadas no estudo do Laboratório Ecologia da Intervenção (UFMS) e do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais do Departamento de Meteorologia da UFRJ (Lasa), com apoio do Ministério Público Estadual, coincidem com regiões que podem ter vegetação seca e uso de terra em uma conversão feita para projeção de uso em 2050.
“Esse estudo oferece cenário para que haja prioridade de ações, considerando a prevenção de incêndios e a mitigação de danos por meio de restauração pós-fogo. (....) Esses dados mostram que áreas de grande risco de fogo sobrepõem áreas que futuramente podem ser convertidas em terras [com uso humano]. Essas áreas estão perto do Pantanal-Cerrado, local conhecido como arco de desmatamento, no Alto-Pantanal”, apontaram os pesquisadores, em tradução livre do estudo.
Entre 2021 e este ano, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), o Sebrae-MS e o Corpo de Bombeiros conduzem trabalho de prevenção a incêndios, com a realização de oficinas e palestras para funcionários de gerentes de fazendas nos municípios de Corumbá, Aquidauana, Miranda, Rio Verde de MT e Porto Murtinho.
Essa medida tenta alinhar estratégia de política do Plano ABC+, que o governo federal lançou para redução de emissão de gases poluentes pelo agronegócio.