O que mudou no debate internacional sobre governança não foi apenas a linguagem – foi a lógica do controle. Por muitos anos, o termo compliance sustentou as práticas internas de proteção, ancorado no antigo modelo das “Três Linhas de Defesa” do Institute of Internal Auditors (IIA).
Nesse arranjo, riscos, compliance e auditoria operavam de forma reativa, enquanto a integridade era tratada de modo restrito.
Em 2020, o IIA atualizou o modelo, retirou o termo “defesa” e reposicionou a governança como eixo integrador das três linhas.
A atenção passou da reação ao risco para a criação de valor, confiança e coerência institucional. Essa inflexão consolidou a compreensão de que a integridade não é função do compliance, mas o resultado de uma governança orientada por valores.
No Brasil, a mudança ganhou força com o Decreto nº 11.129/2022, que regulamentou a Lei Anticorrupção e redefiniu o programa de integridade. O decreto ampliou a visão antes centrada somente na prevenção de ilícitos, determinando que o programa promova cultura de integridade orientada por valores e propósito – e não apenas obediência formal.
O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa aprofundou essa evolução em Sistema de Integridade: Fundamentos e Boas Práticas (2025), distinguindo o sistema de integridade dos programas de integridade e, sobretudo, dos programas de compliance.
“Enquanto o programa de compliance se concentra na conformidade com leis, regulamentos e políticas internas, o sistema de integridade vai além, promovendo uma postura ética proativa baseada em convicções genuínas e valores intrínsecos.” Os programas passam a ser componentes de um sistema mais amplo, que integra cultura, liderança e governança para assegurar coerência ética.
A Controladoria-Geral da União reforça essa direção no Guia de Diretrizes para Programas de Integridade (2024), ampliando o alcance da integridade para além das normas anticorrupção. O documento a reconhece como compromisso com valores, responsabilidade social e sustentabilidade.
O programa de integridade deixa de ser apenas um instrumento de conformidade e prevenção, passando a consolidar valores e promover uma cultura ética e transparente. Integridade torna-se, assim, o estado de coerência entre discurso, conduta e propósito.
Essa mudança dialoga com a agenda EESG, que inclui o vetor econômico-financeiro como parte da sustentabilidade corporativa.
A integridade opera como fio condutor que alinha resultados, impactos sociais e responsabilidades ambientais. Garante que o lucro não se dissocie do propósito, que a performance respeite as pessoas e que o crescimento seja equilibrado e duradouro.
Tudo isso esclarece o papel da governança. Ela não é o “chapéu” sob o qual estariam o compliance e a integridade, mas o sistema que os viabiliza e conecta – o “como” que assegura coerência entre propósito, valores e estratégia.
O compliance é o instrumento da conformidade; a integridade, o estado de coerência ética que resulta dessa boa governança.
Em síntese, o compliance garante fazer o certo conforme a lei; a integridade assegura fazer o certo por convicção; e a governança transforma essa convicção em resultados duradouros.
Num mercado que premia a coerência, a integridade tornou-se a régua que sustenta o valor econômico, legitima o social, protege o ambiental – e dá sentido à governança.


