Artigos e Opinião

EDITORIAL

Amadorismo e falta de transparência

O silêncio imperou sempre, como se dirigentes de um órgão público pudessem ignorar as normas e fazer aquilo que lhes interessa ou convêm

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Desde o começo de setembro do ano passado, o Correio do Estado vem publicando reportagens sobre o fim do contrato da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) com o Consórcio Cidade Morena, responsável pela instalação e a manutenção de 93 radares e lombadas eletrônicas nas vias de Campo Grande.

Inicialmente assinado em 2018, o contrato foi renovado, recebeu sete aditivos e foi estendido por mais cinco anos. Depois disso, determina a legislação, é necessário fazer nova licitação. Isso, porém, não ocorreu. Mesmo assim, motoristas continuaram sendo multados, conforme deixam claras as ocorrências no Diário Oficial de Campo Grande, publicadas pelo menos três vezes por mês.

Também nunca foi publicizado nenhum tipo de renovação ou contrato emergencial. E, como os motoristas continuaram sendo multados e boa parcela fez os pagamentos, o consórcio está sendo pago por meio de uma engenhoca jurídica chamada reconhecimento de dívida. 

O Correio do Estado buscou inúmeras vezes explicações sobre a legalidade da emissão das multas, já que não havia contrato. O silêncio imperou sempre, como se os dirigentes de um órgão público pudessem simplesmente ignorar as normas legais e fazer aquilo que lhes interessa ou convêm.

Isso é vedado em qualquer setor da administração pública, que dirá num setor que envolve os proprietários dos mais de 660 mil veículos registrados no Município.

Se existe fundamentação para emissão de multas e pagamento do consórcio, o mínimo que se esperaria é transparência, o que costuma dar credibilidade às decisões tomadas por homens públicos.

Exatamente por conta desta falta de transparência é que, agora, o ex-prefeito de Campo Grande, que é advogado e foi o responsável pela assinatura do tal contrato em 2018, está recorrendo à Justiça para exigir a anulação de milhares de multas, devolução do dinheiro e que o consórcio seja obrigado a restituir pouco mais de R$ 5 milhões que recebeu desde então.

Seu principal argumento é o de que no setor público ninguém pode contratar ninguém sem o devido embasamento legal.

A confissão de que o contrato realmente havia vencido é o fato de ter sido anunciada nova licitação. Até agora, o certamente está em andamento. Mesmo assim, as multas continuam sendo emitidas. Na quarta-feira, foram testados os equipamentos das empresas interessadas.

Agora, a Justiça pode até indeferir o pedido feito pelo ex-prefeito e manter a validade das milhares de multas. Porém, um administrador público com um mínimo de responsabilidade e competência precisa, pelo menos, ser transparente e dar explicações à sociedade.

Estar à frente de uma instituição de trânsito é diferente de estar à frente de uma igreja. É inadmissível que em um assunto tão delicado, que interfere no dia a dia de milhares de pessoas, ocorra tamanho amadorismo, para ser brando. Se o advogado Marquinhos Trad apelou à Justiça, é porque lhe deram indícios de que algo muito estranho ocorreu.

Alguém poderia até alegar que a ação judicial é fruto de alguma tentativa de vingança do ex-prefeito. Fosse assim, já teria protocolizado uma infinidade de outras ações. Se lhe tivessem sido dadas explicações, possivelmente não se prestaria ao papelão de ouvir um não do magistrado.

Não se trata de defender o fim dos radares, o que possivelmente resultaria no aumento dos acidentes e das mortes. Porém, as normas legais existem e precisam ser cumpridas. 

EDITORIAL

O sistema de transporte faliu?

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem e devem agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público

15/12/2025 07h15

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A crise do transporte coletivo em Campo Grande chegou a um ponto que ultrapassa o desconforto cotidiano do usuário e passa a provocar perplexidade institucional. Um serviço essencial, que garante o direito de ir e vir, simplesmente ameaça parar, enquanto parte das instituições que deveriam atuar na defesa do interesse público assiste a tudo à distância, como se o problema fosse apenas administrativo ou financeiro.

O transporte público não é um favor concedido por concessionários nem um serviço opcional do poder público. Trata-se de uma obrigação legal e constitucional, que deve ser prestada de forma contínua, adequada e eficiente.

Ainda assim, a combinação de atrasos no pagamento de subsídios por parte do Município e crises financeiras alegadas pela concessionária – que, diga-se, precisa ser muito mais transparente sobre sua real situação – resultou na convocação de uma paralisação marcada para hoje.

Esperamos, sinceramente, que ela não ocorra. Mas o simples fato de ser cogitada já é um sinal grave de falência do modelo atual.

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem – e devem – agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público. O silêncio do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública causa estranheza.

Estamos falando de um serviço que afeta diretamente milhares de trabalhadores, estudantes, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Não há como tratar esse impasse apenas como um conflito contratual entre prefeitura e concessionária.

Essas instituições existem justamente para atuar quando direitos coletivos são ameaçados. Têm instrumentos legais para exigir informações, fiscalizar contratos, mediar soluções e, se necessário, responsabilizar gestores e empresas.

A crise do transporte público é um típico caso em que a atuação preventiva e firme poderia evitar danos maiores à população.

Esperamos, portanto, uma atuação urgente dessas instituições na mediação do impasse, antes que a cidade seja penalizada com a interrupção de um serviço vital. E, se o conflito acabar inevitavelmente judicializado, que o Judiciário aja como deve agir: com celeridade, sensibilidade social e foco no interesse público, e não apenas na letra fria dos contratos.

Afinal, quando um sistema essencial entra em colapso e as instituições se omitem, a pergunta deixa de ser retórica e passa a ser inevitável: o sistema de transporte público faliu ou falharam as instituições que deveriam garantir o seu funcionamento? Instituições existem para funcionar – e precisam fazê-lo de fato, especialmente quando a cidade mais precisa.

ARTIGOS

Às portas do Judiciário - contratos bancários fraudulentos

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais

13/12/2025 07h45

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Após as fraudes praticadas contra aposentados, pensionistas e beneficiários do INSS terem vindo à tona, cresceu enormemente o número de demandas judiciais que visam ao cancelamento de contratos de empréstimos, principalmente os realizados de forma virtual.

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais, gerando contratos nulos por natureza, os quais acabam sendo invalidados judicialmente.

Tratando-se de situações que envolvem idosos, os atos abusivos praticados pelos bancos provocam, por força do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003), maior reprimenda judicial, sendo passível de apuração não só no âmbito cível, como também no criminal, tendo em vista a proteção especial em razão da vulnerabilidade presumida.

Contudo, embora a regra seja clara, temos nos deparado com situações em que vítimas de fraudes têm sofrido não só com os descontos promovidos a título de parcelas mensais não contratadas, como de serviços não autorizados, que torna indigno o valor líquido das aposentadorias, benefícios ou pensões a receber.

Em boa hora, felizmente, o Judiciário tem determinado o cancelamento desses contratos, condenando as instituições que assim atuam não só à restituição dos valores ilegalmente descontados, mas ao pagamento da devida indenização por danos morais, decorrente da lesão causada aos direitos de personalidade, amplamente consagrados na Constituição Federal.

O que atordoa é o percurso que a vítima dessas situações percorre até o momento em que se livra de vez do infortúnio das cobranças.

É que, embora seja cabível, juridicamente, um pedido antecipado de decisão que suspenda os descontos que vão incidindo sobre o já tão comprometido valor a receber, nem sempre esse pleito é concedido ou o é de forma tardia, o que vai pondo a vítima dessas fraudes em situação financeira mais delicada.

O ideal seria que a regra fosse no sentido de se determinar judicialmente a suspensão imediata dos descontos ilegais, já que a parte mais vulnerável (que é sempre o consumidor) não dispõe de meios econômicos para reverter uma situação de miserabilidade a que pode chegar, diferentemente dos afortunados bancos.

No entanto, para que as tutelas judiciais provisórias sejam concedidas, exige-se o preenchimento de requisitos legais mínimos, previstos na Lei Processual Civil, quais sejam: probabilidade do direito; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo; e reversibilidade dos efeitos da decisão.

Nos casos em que o banco não comprova a pactuação por contrato firmado ou quando a suposta contratação se deu de forma virtual, mas não se comprovou idoneidade da assinatura eletrônica, deve o negócio ser cancelado.

Caso haja comprovação de má-fé por parte do banco, impõe-se a restituição dos valores descontados em dobro. Não se comprovando, entretanto, o que é mais incomum, deve o valor ser restituído na modalidade simples, o que significa devolver somente o valor cobrado.

Para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, entretanto, não se exige nessas situações, por exemplo, que tenha havido negativação do nome da vítima nos serviços de proteção ao crédito, mas a própria má-fé já valida a condenação nesse sentido.

Ainda é árdua a luta dos que sofrem com esses abusos, todavia, a Defensoria Pública é uma forte aliada do consumidor, especialmente os mais vulneráveis.

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