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O preço da ideologia: impressões de dois governos

Os limites da liberdade de expressão e seus debates, quanto a atuação do Poder Judiciário

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A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de impor medidas cautelares ao pastor Silas Malafaia reacende o debate sobre os limites da liberdade de expressão e a atuação do Poder Judiciário.

O ministro Alexandre de Moraes, no âmbito do inquérito que apura atos antidemocráticos, determinou uma série de restrições ao pastor, justificando que suas declarações públicas configuram risco à ordem pública e ao Estado Democrático de Direito.

Malafaia foi alvo de busca e apreensão pela Polícia Federal após desembarcar no aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. Ele retornava de um voo de Lisboa. Segundo a decisão, as condutas do pastor, “em vínculo subjetivo” com o ex-presidente, “caracterizam claros e expressos atos executórios” dos crimes de coação no curso do processo e obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa.

A decisão é enfática ao afirmar que a liberdade de expressão não é um direito absoluto e não pode ser usada como escudo para atacar instituições democráticas.

O ministro Moraes aponta que Malafaia, valendo-se de sua visibilidade como líder religioso, tem fomentado a deslegitimação do Poder Judiciário, questionado a lisura do processo eleitoral e insuflado a população contra decisões judiciais. Para o STF, essa conduta extrapola o direito constitucional e se enquadra como abuso de direito.

Ainda que a linha entre a crítica contundente e a incitação à desordem seja tênue, a cronologia dos fatos apresentada pela investigação indica que as ações contra o pastor não são isoladas.

Elas se sucedem a uma série de manifestações e citações em relatórios da Polícia Federal, evidenciando uma preocupação crescente do sistema de Justiça com o impacto de suas falas.

A determinação de que Silas Malafaia seja levado à Polícia Federal para depor formalmente, mesmo que nas dependências de um aeroporto, levanta um ponto sensível e preocupante: a semelhança com a condução coercitiva, uma prática que, embora amplamente utilizada na Operação Lava Jato, foi declarada inconstitucional pelo próprio STF.

Em 2018, na ADPF nº 444, o Supremo decidiu que a condução coercitiva de investigados para interrogatório violava os princípios da presunção de não culpabilidade, da dignidade da pessoa humana e, principalmente, do direito ao silêncio.

A Corte entendeu que levar alguém à força para depor, sem que tenha se recusado a comparecer a um chamado anterior, tratava o indivíduo como culpado antes de qualquer condenação e o expunha de forma desnecessária.

A decisão de conduzir Malafaia para prestar depoimento, mesmo que em um local não convencional, ecoa essa prática. Independentemente das acusações contra ele ou de sua ideologia, a medida abre um precedente perigoso.

Aplaudir essa ação, sob a justificativa de que a pessoa é “alvo de crimes”, é contraditório para quem defende o garantismo penal e os direitos individuais.

As medidas cautelares impostas a Silas Malafaia, sobretudo a restrição de sua liberdade de ir e vir e de se comunicar com outros investigados, se justificam, na visão do STF, pela necessidade de proteger a ordem pública.

No entanto, a forma como o depoimento foi solicitado levanta questões sobre se o Judiciário está, por vezes, negligenciando os princípios que ele próprio ajudou a solidificar. A luta contra os abusos da Lava Jato não pode se tornar uma mera substituição de alvos.

Afinal, como o próprio ditado popular nos ensina, “o pau que bate em Chico, bate em Francisco”.

O Estado Democrático de Direito não se fortalece pela exceção, mas pela coerência no respeito às garantias fundamentais, que devem ser universais, independentemente de quem seja o investigado.

EDITORIAL

O sistema de transporte faliu?

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem e devem agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público

15/12/2025 07h15

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A crise do transporte coletivo em Campo Grande chegou a um ponto que ultrapassa o desconforto cotidiano do usuário e passa a provocar perplexidade institucional. Um serviço essencial, que garante o direito de ir e vir, simplesmente ameaça parar, enquanto parte das instituições que deveriam atuar na defesa do interesse público assiste a tudo à distância, como se o problema fosse apenas administrativo ou financeiro.

O transporte público não é um favor concedido por concessionários nem um serviço opcional do poder público. Trata-se de uma obrigação legal e constitucional, que deve ser prestada de forma contínua, adequada e eficiente.

Ainda assim, a combinação de atrasos no pagamento de subsídios por parte do Município e crises financeiras alegadas pela concessionária – que, diga-se, precisa ser muito mais transparente sobre sua real situação – resultou na convocação de uma paralisação marcada para hoje.

Esperamos, sinceramente, que ela não ocorra. Mas o simples fato de ser cogitada já é um sinal grave de falência do modelo atual.

Mais grave ainda é a ausência, até aqui, de uma participação ativa e contundente de instituições que podem – e devem – agir de ofício diante de um flagrante caso de interesse público. O silêncio do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, do Tribunal de Contas e da Defensoria Pública causa estranheza.

Estamos falando de um serviço que afeta diretamente milhares de trabalhadores, estudantes, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social. Não há como tratar esse impasse apenas como um conflito contratual entre prefeitura e concessionária.

Essas instituições existem justamente para atuar quando direitos coletivos são ameaçados. Têm instrumentos legais para exigir informações, fiscalizar contratos, mediar soluções e, se necessário, responsabilizar gestores e empresas.

A crise do transporte público é um típico caso em que a atuação preventiva e firme poderia evitar danos maiores à população.

Esperamos, portanto, uma atuação urgente dessas instituições na mediação do impasse, antes que a cidade seja penalizada com a interrupção de um serviço vital. E, se o conflito acabar inevitavelmente judicializado, que o Judiciário aja como deve agir: com celeridade, sensibilidade social e foco no interesse público, e não apenas na letra fria dos contratos.

Afinal, quando um sistema essencial entra em colapso e as instituições se omitem, a pergunta deixa de ser retórica e passa a ser inevitável: o sistema de transporte público faliu ou falharam as instituições que deveriam garantir o seu funcionamento? Instituições existem para funcionar – e precisam fazê-lo de fato, especialmente quando a cidade mais precisa.

ARTIGOS

Às portas do Judiciário - contratos bancários fraudulentos

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais

13/12/2025 07h45

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Após as fraudes praticadas contra aposentados, pensionistas e beneficiários do INSS terem vindo à tona, cresceu enormemente o número de demandas judiciais que visam ao cancelamento de contratos de empréstimos, principalmente os realizados de forma virtual.

Embora exista regulamentação para a contratação na modalidade à distância, por resolução do Banco Central, as instituições bancárias e financeiras, em geral, não adotam as diretrizes legais, gerando contratos nulos por natureza, os quais acabam sendo invalidados judicialmente.

Tratando-se de situações que envolvem idosos, os atos abusivos praticados pelos bancos provocam, por força do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei nº 10.741/2003), maior reprimenda judicial, sendo passível de apuração não só no âmbito cível, como também no criminal, tendo em vista a proteção especial em razão da vulnerabilidade presumida.

Contudo, embora a regra seja clara, temos nos deparado com situações em que vítimas de fraudes têm sofrido não só com os descontos promovidos a título de parcelas mensais não contratadas, como de serviços não autorizados, que torna indigno o valor líquido das aposentadorias, benefícios ou pensões a receber.

Em boa hora, felizmente, o Judiciário tem determinado o cancelamento desses contratos, condenando as instituições que assim atuam não só à restituição dos valores ilegalmente descontados, mas ao pagamento da devida indenização por danos morais, decorrente da lesão causada aos direitos de personalidade, amplamente consagrados na Constituição Federal.

O que atordoa é o percurso que a vítima dessas situações percorre até o momento em que se livra de vez do infortúnio das cobranças.

É que, embora seja cabível, juridicamente, um pedido antecipado de decisão que suspenda os descontos que vão incidindo sobre o já tão comprometido valor a receber, nem sempre esse pleito é concedido ou o é de forma tardia, o que vai pondo a vítima dessas fraudes em situação financeira mais delicada.

O ideal seria que a regra fosse no sentido de se determinar judicialmente a suspensão imediata dos descontos ilegais, já que a parte mais vulnerável (que é sempre o consumidor) não dispõe de meios econômicos para reverter uma situação de miserabilidade a que pode chegar, diferentemente dos afortunados bancos.

No entanto, para que as tutelas judiciais provisórias sejam concedidas, exige-se o preenchimento de requisitos legais mínimos, previstos na Lei Processual Civil, quais sejam: probabilidade do direito; perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo; e reversibilidade dos efeitos da decisão.

Nos casos em que o banco não comprova a pactuação por contrato firmado ou quando a suposta contratação se deu de forma virtual, mas não se comprovou idoneidade da assinatura eletrônica, deve o negócio ser cancelado.

Caso haja comprovação de má-fé por parte do banco, impõe-se a restituição dos valores descontados em dobro. Não se comprovando, entretanto, o que é mais incomum, deve o valor ser restituído na modalidade simples, o que significa devolver somente o valor cobrado.

Para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, entretanto, não se exige nessas situações, por exemplo, que tenha havido negativação do nome da vítima nos serviços de proteção ao crédito, mas a própria má-fé já valida a condenação nesse sentido.

Ainda é árdua a luta dos que sofrem com esses abusos, todavia, a Defensoria Pública é uma forte aliada do consumidor, especialmente os mais vulneráveis.

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