Artigos e Opinião

EDITORIAL

Regressão generalizada

Os indicadores apontam que, em vez de evoluir, a sociedade está regredindo, com políticos cada vez piores e clãs cada vez mais perigosos

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Ontem, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) desencadeou a quarta fase da Operação Successione, a qual pretendia cumprir 20 mandados de prisão.

Conforme explicações da instituição, o objetivo é desmantelar uma quadrilha que estaria utilizando os mais diferentes métodos de violência para controlar o jogo do bicho em Campo Grande depois que a família Name foi deposta, durante a Operação Omertà.

Entre os detidos está o ex-deputado estadual Roberto Razuk, de 84 anos. Não chega a ser novidade para absolutamente ninguém, nem eleitores nem autoridades policiais ou judiciais, que ao longo de décadas ele faturou alto com a exploração da jogatina.

Mesmo assim, ou talvez justamente por conta do poderio financeiro que esta atividade lhe proporcionava, foi deputado estadual por duas vezes, entre 1987 e 1995. Não bastasse isso, sua mulher, Délia Razuk, foi prefeita de Dourados e seu filho, Neno, está atualmente no segundo mandato de deputado estadual.

Conforme os investigadores, ele foi preso justamente porque tentava ocupar, à força, um espaço que havia sido deixado por Jamil Name, um ex-chefão da jogatina com histórico muito parecido ao seu.

Jamil foi preso em setembro de 2019 e, em junho de 2021, aos 82 anos, acabou morrendo em uma penitenciária federal no Rio Grande do Norte, para onde havia sido levado por conta das acusações de que seria o chefe de uma milícia armada.

Assim como no caso de Razuk, absolutamente todos conheciam a origem do poder financeiro dos Name. Mesmo assim, durante décadas se mantiveram, e ainda se mantêm, na cúpula do poder político em Campo Grande, embora parte do clã esteja cumprindo pena.

Em um país polarizado entre lideranças políticas com fichas extremamente manchadas, seja por roubalheira, seja por outros crimes da mesma gravidade, não é de se estranhar que determinados clãs se perpetuem no poder político e financeiro.

Além disso, nada garante que a “derrocada” desses clãs signifique, por si só, o fim da criminalidade e uma passagem para um degrau superior nas relações sociais.

Ao mesmo tempo, uma possível troca dos dois principais do País (Lula e Bolsonaro) não significaria que seriam substituídos por representantes mais republicanos ou moralmente mais corretos.

Pelo contrário, os indicadores apontam que, em vez de evoluir, a sociedade como um todo está regredindo, com políticos cada vez piores e clãs cada vez mais perigosos.

E, em meio a escândalos de corrupção e supersalários no Judiciário, no Tribunal de Contas, no Ministério Público, no Legislativo e numa infinidade de prefeituras, acreditar nos Poderes constituídos está cada vez mais difícil.

Sendo assim, resta a clara impressão de que a sociedade local está atravessando, e nem mesmo é possível precisar há quanto tempo, um explícito “salve-se quem puder”. Por isso, o voto depositado nas urnas a cada dois anos é baseado na sensação de que literalmente não existe luz no fim do túnel.

Então, votar em um representante de bicheiro, de milícia, de facção criminosa ou de contrabandista ou num lobista (este último o pior de todos) parece não fazer nenhuma diferença.

É evidente que esperar uma sociedade ou político ideal seria ilusão e ingenuidade, já que a lei da selva insiste em não abandonar a raça humana.

Mas, enquanto vierem praticamente só maus exemplos de cima para baixo, da elite financeira, política e judiciária e, principalmente, das autoridades que deveriam zelar pelo cumprimento das leis, a probabilidade de a evolução social vir por meio do voto é muito baixa, para não dizer impossível.

EDITORIAL

PPP para renovar a Saúde no Estado

Toda mudança na Saúde precisa ser medida por aquilo que entrega na ponta. A expectativa é de que a parceria traga mais consultas, mais cirurgias, mais leitos e mais dignidade

05/12/2025 07h15

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A saúde pública brasileira carrega, há décadas, o estatuto de maior desafio da gestão pública. Não há área que concentre tamanha pressão, tamanha demanda e tamanha cobrança social. E não é de hoje. Muitos brasileiros, de diferentes gerações, cresceram ouvindo – e vivendo – a mesma constatação: a Saúde é o grande nó da administração pública.

A partir da Constituição de 1988, quando o Sistema Único de Saúde (SUS) passou a garantir atendimento universal, integral e gratuito, esse desafio se tornou ainda mais complexo. Não por falha do princípio, mas pela imensa responsabilidade de sustentar um sistema tão abrangente em um país tão desigual.

As melhorias são inegáveis. O SUS, reconhecido internacionalmente, é motivo de orgulho para o País. Foi e continua sendo protagonista em políticas de vacinação, em atendimento de emergência e em ações de grande escala, como se viu na pandemia.

A universalidade, que tantos países admiraram e replicaram, é um trunfo inquestionável. Mas esse mesmo sistema convive com filas longas, dificuldades estruturais, falta de profissionais em determinadas áreas e gargalos históricos que parecem nunca se resolver completamente.

A contradição está no centro da experiência do usuário: ao mesmo tempo que o sistema salva vidas todos os dias, também deixa a desejar em muitos cantos do Brasil. Parte disso se explica pelo tamanho do SUS e pela velocidade com que a demanda cresce – sempre maior que a capacidade instalada.

É por isso que iniciativas de modernização e novos modelos de gestão precisam ser analisadas com seriedade. O Estado dá agora um passo que pode ser transformador com a parceria público-privada (PPP) do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul (HRMS).

A proposta vai além de uma simples reforma. Trata-se de repensar toda a operação, com estrutura renovada, equipamentos atualizados, gestão profissionalizada e maior integração entre serviços.

A capacidade ampliada é, talvez, o ponto mais crucial: o Estado há anos necessita de ganho de escala para reduzir filas, aliviar a pressão sobre unidades básicas e especializadas e, principalmente, assegurar que o paciente seja atendido no tempo necessário.

Ao apostar em uma PPP, o governo busca não apenas modernizar o prédio ou adquirir novas máquinas, mas reorganizar o fluxo do atendimento, melhorar processos e oferecer segurança operacional a longo prazo. Isso pode significar um atendimento mais ágil, mais eficiente e menos burocrático.

Pode, também, representar uma mudança cultural para uma máquina pública que historicamente opera sob limitações de orçamento, de pessoal e de gestão.

Resta, porém, o elemento central de qualquer política pública: o resultado concreto para o cidadão. Toda mudança na Saúde precisa ser medida por aquilo que entrega na ponta. A expectativa, legítima e necessária, é de que a parceria traga mais consultas, mais cirurgias, mais leitos, mais estrutura e mais dignidade.

Que a fila ande, que o atendimento humanize, que o sistema funcione. Torcemos para que este modelo, bem implementado e bem fiscalizado, produza exatamente isso: benefícios palpáveis, cotidianos, reais. Porque, ao fim, todo esforço só faz sentido se significar mais saúde e mais vida para a população sul-mato-grossense.

ARTIGOS

Como a negação política está custando milhões às empresas brasileiras

04/12/2025 09h15

Arquivo

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Enquanto líderes corporativos fingem que política não existe no ambiente de trabalho, suas equipes estão se fragmentando silenciosamente. A polarização política não é um fenômeno que para na porta da empresa, ela entra, se instala e, quando ignorada, corrói a produtividade de forma devastadora. Segundo dados da Society for Human Resource Management (SHRM), 71% dos trabalhadores americanos já tiveram conversas políticas com membros de sua equipe de trabalho.

No Brasil, o cenário é ainda mais alarmante: apenas em 2022, cerca de 1.618 empresas foram denunciadas ao Ministério Público do Trabalho por assédio eleitoral, obrigando funcionários a votar em candidatos específicos. A verdade inconveniente é que a maioria dos gestores está lidando com diversidade política da mesma forma que lidavam com diversidade racial nos anos 1980: fingindo que não existe e esperando que o problema se resolva sozinho. Spoiler: não vai se resolver.

O fato é que existe um custo real da negação corporativa. Não estamos falando de desconforto passageiro ou “climinha” entre colegas, mas sim de discriminação real, exclusão deliberada e retaliação profissional baseada em convicções pessoais. A incivilidade no local de trabalho cresceu 27% apenas entre o segundo e terceiro trimestres de 2024, segundo a SHRM, com diferenças políticas sendo o principal catalisador.

Porém, aqui está o que ninguém te conta: o problema não é a diversidade de opiniões, mas a ausência de inteligência emocional coletiva para transformar essa diversidade em vantagem competitiva. “Não falamos de política aqui” é a frase mais hipócrita do ambiente corporativo moderno, uma verdadeira falácia. Toda decisão empresarial é política: desde a escolha de fornecedores até políticas de diversidade, desde posicionamento sobre sustentabilidade até estratégias de expansão internacional.

A questão não é se sua empresa tem posicionamento político, ela tem. A questão é se você está sendo transparente sobre isso e criando espaços seguros para que diferentes perspectivas contribuam para decisões mais inteligentes. As empresas que abraçam a diversidade política de forma estruturada não apenas reduzem conflitos, elas criam o que chamo de “inteligência coletiva amplificada”. Quando pessoas com visões de mundo diferentes colaboram em ambiente psicologicamente seguro, o resultado são soluções que nenhum grupo homogêneo conseguiria conceber.

Agora, uma alternativa seria uma metodologia que chamo de “diversidade inteligente” – um sistema que transforma diferenças políticas em combustível para inovação. O framework pode operar em quatro eixos, sendo: transparência estruturada – em vez de fingir neutralidade, a empresa declara seus valores fundamentais e cria espaços explícitos para debate construtivo sobre como aplicá-los. Além disso, na gamificação comportamental, os sistemas que recompensam escuta ativa, com questionamento respeitoso, fazem uma síntese criativa de ideias divergentes. 

Um outro ponto importante é ter métricas de colaboração, com dashboards que medem não apenas resultados, mas qualidade das interações entre pessoas com perspectivas diferentes. Por último, é essencial investir em uma liderança modelar, que seja exemplo, com gestores treinados para facilitar, não suprimir, discussões produtivas sobre temas sensíveis.

Por fim, existe uma vantagem competitiva oculta que poucos líderes admitem: as empresas que dominam a arte da diversidade política terão supremacia sobre aquelas que continuam na negação. Quando você consegue fazer conservadores e progressistas colaborarem produtivamente, extrair o melhor do pensamento analítico e sistêmico, transformar tensão ideológica em energia criativa, você não está apenas gerenciando diversidade, está criando uma máquina de inovação com visão de 360 graus em um mundo onde a maioria das empresas ainda enxerga com um olho só.

A meu ver, o futuro pertence aos corajosos. A polarização política não vai diminuir, vai se intensificar. Empresas que continuam fingindo que podem se manter “neutras” estão se preparando para a irrelevância. O futuro pertence às organizações corajosas o suficiente para transformar a diversidade política em vantagem estratégica. Não se trata de promover uma ideologia específica, mas de criar ambientes onde diferentes ideologias podem contribuir para soluções mais robustas, mais criativas e mais resilientes.

A pergunta não é se você vai lidar com diversidade política na sua empresa, mas como você vai fazer isso de forma inteligente ou se vai continuar fingindo que o problema não existe enquanto sua competitividade se deteriora silenciosamente. O respeito no ambiente de trabalho não é concessão, é estratégia. Não é fraqueza, é inteligência competitiva. E, acima de tudo, é a base para qualquer empresa que queira prosperar em um mundo cada vez mais complexo, sem desperdiçar seu ativo mais valioso: a diversidade de pensamento de suas pessoas.

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