Neste mês, são celebradas as campanhas de conscientização sobre os cuidados com a saúde mental, no entanto, enquanto é debatido o crescimento de casos de internação por tentativas de suicídio em Mato Grosso do Sul, o número de leitos psiquiátricos em Campo Grande caiu: apenas 78 leitos são disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) da Capital, índice que cumpre com apenas 20% do necessário.
Segundo o Ministério da Saúde, as cidades brasileiras deveriam ter um leito psiquiátrico a cada 23 mil habitantes. Dessa forma, Campo Grande deveria ter 390 leitos psiquiátricos, já que o município, conforme o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tem 897.936 habitantes.
Entretanto, o número de leitos na Capital já foi maior. Em 2014, o SUS de Campo Grande disponibilizava 172 vagas psiquiátricas, sendo 10 leitos na Santa Casa de Campo Grande, dois no Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian (Humap) e 160 no Hospital Psiquiátrico Nosso Lar. Atualmente, os 78 leitos do SUS disponíveis estão divididos entre 12 no Hospital Regional de Mato Grosso do Sul (HRMS) e 66 no Nosso Lar.
QUEDA DE LEITOS
Os índices de leitos psiquiátricos disponíveis pelo SUS caíram nos últimos anos, enquanto a população e a demanda foram aumentando. No ano passado, Campo Grande teve 237 pessoas internadas por tentativas de suicídio, segundo dados do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), e 115 vítimas de suicídio até o dia 26 de setembro deste ano, de acordo com a Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp).
O psiquiatra e professor da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) Augusto Bittencourt relata que essa queda no número de leitos psiquiátricos disponíveis foi percebida não apenas em Campo Grande, mas em todo o País.
“As pessoas não conseguem serviço de saúde mental. A gente está tendo uma diminuição de leitos psiquiátricos em todos os estados. Aqui, em Mato Grosso do Sul, a gente tem uma população de risco, que é considerada uma das populações de maiores riscos para suicídio, que é a dos indígenas sul-mato-grossenses. Eles têm uma altíssima prevalência de suicídio, necessitam de uma atenção especial e uma política de saúde pública direcionada para eles”, pontuou o médico.
Para o especialista, o Brasil está indo na “contramão do mundo”, visto que está tendo um aumento e uma prevalência de casos de suicídios e de tentativas, além de quadros de depressão graves, resistência a tratamentos, aumento dos transtornos por uso de substâncias, dificuldades para conseguir acesso ao serviço de saúde mental e medicamentos que não estão inclusos na lista do SUS.
“A gente tem vários medicamentos novos, que foram surgindo ao longo dos anos, e que não são disponibilizados pelo SUS, por exemplo, o que limita muito a prática clínica dos profissionais que trabalham na linha de frente com o atendimento dessas pessoas que estão em sofrimento. Então, o que a gente acaba vendo é que as pessoas estão sofrendo mais, adoecendo mais, do ponto de vista psiquiátrico”, esclarece Bittencourt.
O médico ainda esclarece que em muitos locais do País não há especialistas em saúde mental. Assim, quem acaba atendendo pessoas que tentaram tirar a própria vida são médicos e enfermeiros emergencistas. Esses pacientes, após passar pelo tratamento inicial e saírem da situação de risco, muitas vezes precisam ser encaminhados para um psiquiatra, mas é nessa etapa que surgem mais dificuldades.
ESTADO
Em Mato Grosso do Sul, a Secretaria de Estado de Saúde (SES) informou por meio de nota que tem 21 leitos de saúde mental em hospitais gerais, sendo quatro em Costa Rica, nove em Dourados e oito em Aquidauana.
Já em unidades psiquiátricas, além do Nosso Lar, em Campo Grande, existem 40 leitos no Hospital Psiquiátrico de Paranaíba. Ou seja, dos 79 municípios do Estado, apenas a Capital e outros quatro municípios oferecem atendimento especializado em saúde mental.
A nota da SES acrescenta ainda que “não há habilitação de novos leitos em hospitais psiquiátricos devido a uma mudança de paradigma na política de saúde mental, promovida pela Reforma Psiquiátrica Brasileira, que busca transformar o modelo de cuidado em saúde mental”, e aponta que os leitos de saúde mental em hospitais gerais são para o atendimento de pacientes com transtornos mentais graves e visam uma reintegração mais rápida do paciente à sociedade.
“Os leitos de hospitais psiquiátricos são especializados no atendimento exclusivo de transtornos mentais, com um foco mais restrito nessas questões. Tradicionalmente, esses hospitais mantinham os pacientes internados por períodos mais longos, mas, atualmente, há um esforço para evitar internações prolongadas”, ressalta a SES.
Saiba
A Secretaria Municipal de Saúde (Sesau) tem 80 leitos de observação disponibilizados entre as sete unidades de Centros de Atenção Psicossocial em Campo Grande. Porém, esses leitos são utilizados mais para estabilizar o paciente, não estando relacionados na lista de leitos de internação do DataSUS.