Estamos em um ano de eleições federais e estaduais, mas ainda não entramos no prazo de oficialização das candidaturas. Assim sendo, a propaganda eleitoral ainda não está autorizada pela justiça. Mas os políticos sempre dão um jeitinho de burlar as normas disfarçadamente: espalham outdoors pelas cidades e anúncios nos jornais desejando boas festas, comparecem a inaugurações de obras, visitam os bairros carentes, promovem festas e churrascos e fazem outras coisas do tipo. Reparei que nos últimos tempos nossos homens públicos têm apelado para uma estratégia ainda mais sínica de promoção da sua imagem política. Tenho visto nas ruas, praças e outros locais faixas publicitárias onde se podem ler frases do tipo: “a população de nossa cidade agradece o deputado ‘fulano de tal’ pela realização de tal obra”. É óbvio que quem manda confeccionar essas faixas são os próprios políticos homenageados e seus correligionários. Quem mais seria? Eu, particularmente, não sinto que deveria agradecer publicamente aos políticos pelas suas realizações, nem acho que o restante da população tem esse dever. Quando governantes e parlamentares entregam uma obra, eles nada mais estão fazendo que sua obrigação funcional, afinal de contas foram designados pelo povo para ser representantes do interesse coletivo. Não estão fazendo favor a ninguém. Os recursos das obras e das ações sociais não saem do bolso deles, mas do erário público, que é sustentado pelo dinheiro do contribuinte. Aliás, não é pouco o que pagamos de impostos, inclusive para bancar os altos salários e demais benefícios daqueles que nos representam nos poderes executivo e legislativo. Imaginem que absurdo seria se, por exemplo, um professor mandasse colocar uma faixa na frente da escola ou universidade em que leciona onde estivesse escrito: “nós, alunos, agradecemos ao nosso mestre pelas aulas ministradas”. Seria o cúmulo, pois o docente é pago justamente para assumir a obrigação de ensinar. Mas, na política, tudo é diferente. O historiador Victor Nunes Leal, em sua obra magistral intitulada “Coronelismo, enxada, voto” e escrita há várias décadas, já diagnosticava que a tradição política brasileira comporta em larga escala as práticas do clientelismo e do patrimonialismo. Aquele que assume um cargo eletivo trata a coisa pública como se fosse propriedade particular e concede “favores” aos apadrinhados em troca de apoio e votos. Cria-se assim a cultura do “beija-mão”. A carência econômica acaba aprisionando certas pessoas nesse sistema de cooptação eleitoral. Quanto maior a miséria, mais propícias são as condições para se exercer a dominação e a exploração do eleitorado. Para quem tem fome, basta distribuir uma cesta básica. Quem não vota no candidato que se elege corre o risco de não ser contemplado pelas políticas públicas. Acontece que a escolaridade do povo vem crescendo a cada ano. Como reflexo, aumenta a conscientização social. As pessoas não são mais tão ingênuas e alienadas. Muita gente já não se deixa iludir facilmente. Essa é uma das explicações para o enorme descrédito que a nossa sociedade atribui à classe política nos dias atuais. Também, com tantos escândalos vindo à tona, como o mensalão e o caso Arruda, fica difícil mesmo não desconfiar das intenções de nossos políticos.