Autor de denúncias que renderam cinco meses de cadeia ao ex-governador André Puccineli, seu filho, assessores e advogados, em julho de 2018, o pecuarista Ivanildo da Cunha Miranda volta a ser alvo de investigação. Agora, porém, não existe envolvimento de pagamento de propina, mas desmatamento ilegal em uma fazenda no município de Aquidauana, no Pantanal de Mato Grosso do Sul.
O diário oficial do Ministério Público desta segunda-feira (12) traz a público a abertura de um inquérito civil para apurar o desmatamento ilegal de 68 hectares da fazenda São Félix. O desmatamento de seis pontos diferentes que são registrados como reserva ambiental teria ocorrido ainda em 2016 e 2017, época em que Ivanildo estava na "crista da onda".
Somente agora, porém, com o cruzamento de dados de satélite, é que a irregularidade foi constatada e passou a ser investigada pelo MPE. De acordo com a apuração feita até agora, o imóvel já foi alvo de uma multa ambiental e o principal objetivo do inquérito é firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para que a reserva ambiental seja recomposta.
Em notificação emitida nesta sexta-feira (9), a promotora Angélica de Andrade Arruda estipula prazo de dez dias para que Ivanildo, que reside em Campo Grande, apresenta a documentação relativa ao imóvel, informe se já chegou a fazer alguma recomposição da vegetação suprimida irregularmente e se tem interesse em firmar um acordo para corrigir as supostas irregularidades.
DELATOR
Ivanildo da Cunha Miranda ganhoU notoriedade estadual e nacional depois da delação premiada em que entregou um suposto esquema de pagamento de propina de frigoríficos para o ex-governador André Puccinelli.
De acordo com Ivanildo, em troca de incentivos fiscais, frigoríficos pagavam propina a André Puccinelli. Ele próprio revelou que entregava malas de dinheiro aos ex-governador e a pessoas próximas a ele. Confessou, ainda, que parte deste dinheiro ele mesmo embolsava.
Ivanildo chegou a ser condenado na Justiça por ter comprado um avião de US$ 200 mil nos Estados Unidos com o dinheiro que lhe cabia no esquema, principalmente relativo a frigoríficos da JBS.
E com base nestas informações, aPolícia Federal desencadeou a quarta fase da operação Lama Asfáltica, em julho de 2018, e levou à prisão o ex-governador André Puccinelli, que sairia da cadeia somente em dezembro daquele ano. Puccinelli foi governador de 2007 a 2014.
O conteúdo da delação de Ivanildo foi confirmado pelos irmãos Joeley e Wesley Batista, donos da JBS. De acordo com eles, em torno de 30% daquilo que recebiam em incentivos fiscais era devolvido a três governadores de Mato Grosso do Sul.
O esquema, segundo a PF, teria começado ainda na administração de Zeca do PT, passou pela gestão de Puccinelli e seguiu no governo de Reinaldo Azambuja. Parte das devoluções eram feitas por meio de doações legais de campanha, mas outra parcela era entregue em dinheiro vivo, segundo os investigadores.
Embora Ivanildo nunca tenha delatado o ex-governador Reinaldo Azambuja, a operação Vostok, em setembro de 2018, mesmo período em que Puccinelli estava preso, teve como alvo um dos filhos de Azambuja, um deputado (José Teixeira), um conselheiro do TCE (Márcio Monteira, que fora secretário de Fazenda de Azambuja) e o próprio Ivanildo.
Por determinação do Superior Tribunal de Justiça, 14 pessoas foram presas na operação Vostok, mas Reinado Azambuja foi somente algo de mandado de busca e apreensão em sua residência. Todos foram soltos dias depois e até hoje as denúncias, tanto relativas a André Puccinelli quanto a Reinaldo Azambuja, tramitam no judiciário.
REFLEXOS POLÍTICOS
Quando foi preso, em julho de 2018, Puccinelli estava em pré-campanha para concorrer novamente ao governo do Estado. À época, o partido chegou a manter a pré-candidatura, mas teve de recuar diante das recusas da Justiça aos pedidos de soltura.
A convenção partidária que o coroaria candidato estava marcada para duas semanas depois da data da prisão. Seu nome chegou a ser substituído pelo da senadora Simone Tebet (MDB), mas ela desistiu.
Às pressas, quem encabeçou a chapa emedebista foi o então presidente da Assembleia Legislativa, deputado Junior Mochi, que acabou por não chegar ao segundo turno.
Na última disputa ao governo do Estado, Puccinelli ficou em terceiro lugar, com 17,18% dos votos. Ele perdeu para o Capitão Contar (26,71%) e para Eduardo Riedel (25,16%). No segundo turno, escondendo Azambuja, Riedel acabou sendo eleito governador.
Reinaldo Azambuja, por sua vez, está preparando o terreno para ser candidato ao senado na disputa prevista para o próximo ano, quando serão preenchidas duas vagas.