De imóvel desvalorizado a vergonha de receber visita, moradores dos Bairros Nova Campo Grande e Jardim Carioca têm reclamado do mau cheiro que viria do frigorífico da JBS, localizado na Avenida Duque de Caxias, em Campo Grande, e que tem impactado diretamente no dia a dia dessas pessoas.
Emanoelly Siqueira, de 40 anos, mora no Bairro Nova Campo Grande há 15 anos e disse que já passou mal inúmeras vezes por causa do mau cheiro. Ela reforça que a luta dos moradores não é para fechar a fábrica de farinha de osso, mas para que seja oferecida melhor qualidade de vida a eles.
“Em momento algum queremos que o frigorífico feche, muitos trabalhadores da fábrica residem na nossa região. Nós queremos, de fato, que nos tirem o título de ‘bairro fedido’, ‘bairro malcheiroso’, pois nós temos os imóveis desvalorizados e sentimos vergonha de receber visitas em nossas casas”, afirmou.
Além das residências, a moradora cita que há escolas próximas à região, sobre as quais ela relata ficar preocupada em saber como as crianças comem com a companhia ingrata do odor.
“As pessoas estão trancadas dentro de casa quando o cheiro chega. Fecham janelas, fecham tudo e fazem o que? Fica passando mal dentro de casa”, complementa.
Outro bairro que reclama de forma intensa do cheiro que viria da unidade é o Jardim Carioca, onde mora Cleonice Martins, de 45 anos. Ela disse ao Correio do Estado que as expectativas para aprovação do projeto são altas, já que é uma solução que os moradores esperam há anos.
“É uma demanda que é muito importante para nós da região. É o que eu gostaria, que o nosso poder público olhasse com carinho para nós, que a JBS tomasse uma atitude. Acredito que uma empresa desse porte poderia estar buscando um lugar adequado para estar fazendo esse processo, que não fosse em meio à população”, diz Cleonice.
Ela completa que chegou a morar em outros bairros, como no Jardim Aeroporto e Santo Antônio, e que o mau odor alcança até essas regiões. Porém, nada igual ao Jardim Carioca, onde, segundo ela, o odor é tão forte que causa náuseas e dores de cabeça.
“A gente não quer prejudicar a empresa, até porque é uma geradora de empregos para toda a nossa região, é uma empresa muito importante para todos, o que a gente gostaria é que solucionasse esse mau cheiro”, acrescenta a moradora.
Maria Cristina Alves, de 61 anos, mora no Residencial Lavanda, também localizado no Jardim Carioca, e pede uma solução o mais rápido possível, mas sem prejudicar aqueles que dependem, no sentido financeiro, da fábrica para sobreviver.
“A gente sabe que o mau cheiro está incomodando bastante e isso precisa ser resolvido o quanto antes. O que a gente pede é que seja feita uma verificação completa, que olhem o local direitinho para realizarem esse serviço. Mas também é importante que o serviço não pare, porque aqui muita gente depende disso como fonte de renda. Então, a nossa preocupação é que a solução venha, mas sem prejudicar quem tira o sustento daqui”.
Há 24 anos no bairro Nova Campo Grande, Fábia Britez, de 50 anos, afirma que o cheiro sempre foi insuportável, e ainda o descreve como se fosse odor de sebo queimado. Por causa disso, a casa dela está desvalorizando, e ela atribui 100% de responsabilidade ao problema causado pelo frigorífico.
“A minha casa, se ela estivesse em qualquer outro bairro, acho que, pelo menos, ela valeria 30%, 40% a mais. A gente constrói, a gente deseja morar no local, eu tenho um carinho imenso pelo bairro, tanto que eu comprei esse terreno vazio, eu construí a minha casa, coloquei tudo do bom e do melhor, para uma empresa fazer isso”, explica.
“Uma empresa desse tamanho não tem a pachorra de resolver um problema simples. A gente não mora em invasão, a gente não se apossou de terreno que não podia, a gente tem documento, a gente comprou terreno, a gente pagou o Crea, a gente paga IPTU, então, ou seja, somos todos organizados. O poder público tem dois pesos, duas medidas”, complementa.
NOVELA
Há dois anos, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) acompanha as reclamações dos moradores sobre o mau cheiro, por meio de um inquérito civil.
Em maio de 2024, durante reunião, o órgão apresentou proposta de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) aos representantes da JBS, que recusaram o acordo. Na argumentação, a empresa disse que as condições impostas no documento já haviam sido cumpridas, e por isso optaram por não aceitá-lo.
Diante disso, o MPMS instaurou uma Ação Civil Pública contra o frigorífico e recomendou a instalação de uma cortina arbórea, a fim de mitigar impactos ambientais, neste caso, o mau cheiro e suas consequências. Além disso, a JBS foi multada em R$ 100 mil, valor que poderia aumentar, a depender do descumprimento da ordem.
Na última vistoria, feita em maio, após a empresa dizer que havia cumprido o acordado, o MPMS concluiu que algumas medidas não foram cumpridas, e outras, sim, reforçando a necessidade de todas serem realizadas de forma correta.
Além do MPMS, no mês passado o deputado estadual Pedro Pedrossian Neto (PSD) ingressou com um projeto de decreto legislativo na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (Alems), que pretende sustar a licença de operação para a fábrica de farinha de ossos do frigorífico, como mostrou reportagem de ontem do Correio do Estado.
Ontem, em entrevista à TV Alems, o parlamentar sugeriu que este setor de produção se mude para o Indubrasil, polo industrial de Campo Grande, como alternativa para sanar o problema de vez.
Neste momento, o projeto já foi distribuído à Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) da casa de leis, sendo determinado que o deputado estadual Paulo Duarte (PSB) será o relator que vai determinar a constitucionalidade da suspensão da licença. Se aprovado, deverá ser submetido à votação dos parlamentares.
Até o fechamento desta matéria, a JBS não se pronunciou acerca da possível suspensão da licença ambiental, mesmo com a tentativa de contato por parte do Correio do Estado.




