O esquema de fraude em licitações e corrupção que chegou a mandar para a cadeia o prefeito de Terenos, Henrique Budke (PSDB), no mês passado, está diretamente ligado ao esquema de corrupção na prefeitura de Bonito, desbaratado nesta semana por equipes do Grupo Especial de Combate à Corrupção (Gecoc), do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS).
Foi durante as investigações que resultaram na Operação Spotless, que deixou o prefeito de Terenos afastado por quase um mês na cadeia – antes de ser liberado pelo Superior Tribunal de Justiça e usar tornozeleira eletrônica – que os promotores do Gaeco chegaram ao empreiteiro Genilton da Silva Moreira.
Dono de uma empreiteira envolvida no esquema de corrupção generalizada na prefeitura de Terenos, Genilton também mantinha relações com outras prefeituras, e o modus operandi era sempre o mesmo: licitações de cartas marcadas para o posterior pagamento de propina extraída dos contratos fraudulentos com a administração pública, que irrigava políticos e membros do 1º escalão dos municípios.
Mais precisamente, a teia de corrupção começou a ser desvendada durante a análise de dados digitais apreendidos na Operação Velatus, conduzida pela 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Terenos.
No dispositivo eletrônico de Genilton da Silva Moreira, empresário residente em Terenos, foram descobertas provas de outras infrações penais, que, com autorização judicial, foram compartilhadas e deram origem à investigação em Bonito.
O esquema em Bonito
Na deflagração da Operação Águas Turvas, que estabelece um contraponto às águas cristalinas, motivo de o município distante 290 quilômetros de Campo Grande ser conhecido no mundo inteiro, quatro prisões preventivas foram decretadas para agentes públicos e empresário diretamente implicados.
Edilberto Cruz Gonçalves, secretário municipal de Administração e Finanças de Bonito; Carlos Henrique Sanches Corrêa, arquiteto e fiscal de obras públicas (o “medidor” do município); Luciane Cíntia Pazette, chefe (diretora) do setor de Licitações e Contratos de Bonito; e Genilton da Silva Moreira, empresário que operava entre Terenos e Bonito, peça-chave na articulação das fraudes.
Esses servidores eram responsáveis por funções estratégicas no processo licitatório: o secretário de finanças tinha influência na liberação orçamentária e na autorização de pagamentos; o fiscal de obras fazia vistorias, medições e emitia pareceres técnicos; e a chefe de licitação tinha acesso antecipado aos editais e tinha poder de definição de exigências que beneficiavam as empresas escolhidas.
O esquema de corrupção em Bonito se dava em contratos de pequenas obras, cujas licitações eram feitas por meio de carta convite, na maioria das vezes. A maioria das obras era para manutenção de pontes de madeira ou reforma de quadras e ginásios esportivos.
Em um dos casos, o arquiteto e “medidor” das obras, Carlos Henrique Sanches Corrêa, enviou a medição de uma obra antes mesmo dela ser licitada.
Propinas e transações
A investigação aponta que, em Bonito, os pagamentos de propina passaram dos R$ 100 mil, repassados por Genilton Moreira ao secretário Edilberto Cruz Gonçalves em diferentes momentos.
Por meio de conversas interceptadas e análise de extratos, foi comprovado que, após a prefeitura efetuar pagamentos às empresas ligadas a Genilton, havia solicitações explícitas de “vantagens” por parte de Edilberto, que encaminhava chaves Pix e indicava intermediários para receber os valores.
Em um caso, após obra de manutenção em pontes no valor declarado de R$ 457 mil por parte da prefeitura, foi identificada mensagem de Genilton confirmando repasse de propina: “Deu certo lá, viu, eu esqueci de te avisar aí”.
Quanto ao fiscal de obras, Carlos Henrique Sanches Corrêa, há evidências de que ele recebia dicas e solicitava pagamentos. Em uma troca de mensagens em dezembro de 2021, ele enviou ao empresário a medição da obra e disse “fica a dica”, ao que Genilton respondeu ironicamente: “O Natal vem pra todos” – frase interpretada pelas investigações como aceno à propina.
Já Luciane Cintia Pazette teria fornecido acesso privilegiado ao empresário: antecipava minutas de editais, compartilhava exigências técnicas e colaborava para moldar os instrumentos licitatórios de modo a favorecer as empresas do esquema.
Terenos
Nas investigações em Terenos, foi revelado que Genilton participou de três licitações fraudulentas e que teria sido designado pelo prefeito e por agentes públicos para modelar orçamentos e manipular os processos com o prefeito da cidade e membros do primeiro escalão.
Coutinho
No esquema de corrupção, apareceu membro de uma família conhecida das investigações do Ministério Público: Sérgio Duarte Coutinho. O empresário, segundo o Gecoc, atuou como intermediário financeiro dos repasses de propina.
De acordo com as apurações, ele recebeu valores transferidos por Genilton como parte da distribuição ilícita, servindo como peça de trânsito entre o empresário e os servidores públicos.
Genilton da Silva Moreira pagou R$ 15 mil em propina para Edilberto Cruz Gonçalves, utilizando Sérgio Duarte Coutinho como intermediário.
O histórico de Coutinho é notório: seus filhos já foram alvos de operações de combate à corrupção, o que sugere que ele atuava em estruturas já acostumadas a movimentar recursos ilícitos em contratos públicos estaduais ou municipais.


Divulgação Polícia Civil


