Na noite desta terça-feira (3), por volta das 18h, Sineria Oliveira, de 44 anos, voltava do trabalho, pela Av. Duque de Caxias, quando foi abordada por manifestantes bolsonaristas nas proximidades do Comando Militar do Oeste (CMO).
A vítima relatou ao Correio do Estado que as agressões verbais começaram quando ela parou no sinal vermelho, em frente ao acampamento bolsonarista, que aparentemente já estava sendo desmontado.
“Na hora que eu fui trabalhar estava bem vazio em frente ao CMO, mas quando eu estava voltando o trânsito estava bem parado. Quando eu cheguei bem em frente ao sinal, tinha dois carros na minha frente, e parei. Eu estava bem desligada, concentrada só no trânsito”, relatou.
Sineria acredita que os agressores decidiram ofendê-la porque ela vestia uma camiseta vermelha.
“De repente, um homem parou em frente a janela do carro em que eu estava, e começou a gritar comigo, perguntando ‘está feliz agora, sua vagabunda? Já que seu presidente ganhou?’ e eu assustei com aquilo”.
O pânico ficou ainda maior quando Simeria percebeu que o homem carregava um pedaço de pau na mão, descrito por ela como um mastro de bandeira.
“Depois disso, vieram mais três (homens) para perto dele. Eu falei ‘o que está acontecendo?’ e eles começaram a me chamar de ‘vagabunda’, de ‘corna’ e de ‘puta’. Só porque eu estava com camiseta vermelha”, contou, em lágrimas.
Um dos homens chegou a se debruçar em cima do carro, perto da janela em que ela estava.
“Eu entrei em desespero. Fiquei com muito medo, não tive reação. Eu já sofri agressões, então foi muito difícil ter que passar por essa situação, sabe? Você tem que ir trabalhar, voltar do serviço cansada, e ainda tem que passar por essas humilhações. Eu estou transtornada”.
Ao chegar em casa, Sineria ligou para a polícia, que informou apenas que enviaria uma viatura ao local.
O pânico da noite anterior ainda não passou. A mulher, que trabalha como doméstica na casa de uma família, não conseguiu sair de casa para trabalhar hoje, já que o trajeto passa pelo CMO.
“Eu tô em casa, não consegui sair hoje. Eu não sei se eu vou ter condições de sair. É meu caminho para o trabalho, e eu fiquei com muito medo de passar lá em frente. Estou em pânico”.
À reportagem, Simeria explicou que, justamente por essa polarização política, acabou não votando em nenhum dos candidatos à presidência, e que não vestia a camiseta como manifestação política alguma - e mesmo que fosse, não justificaria os ataques.
Durante a entrevista, algumas lágrimas e o desabafo: “Eu sei que todos têm o direito de lutar pelo que querem, só que todos têm o dever de respeitar a opinião de cada um. Ontem eu simplesmente fui julgada e condenada pela cor de uma roupa. Eu acho isso um absurdo. Eu não estava levantando bandeira nenhuma, eu não estava falando nada. Eu simplesmente estava com uma camiseta vermelha. Que país é esse? Você agora vai ter que usar o quê para se defender? Alguém vai ter que falar que cor de roupa que tu tem que usar? Pra que isso, gente? Que absurdo”.
Problemas anteriores
Sineria, que costuma passar em frente ao CMO por ter a Av. Duque de Caxias como seu principal trajeto, também falou sobre outras ocasiões em que a manifestação e o transtorno causado no trânsito prejudicaram sua rotina.
“Desde o início dessa manifestação, passar por lá é bem torturante. Eu tenho um filho autista, e quando eu passo por lá com ele sempre é bem difícil. Ele entra em crise por conta dos barulhos”.
Ela também leva a irmã, que tem câncer, para fazer tratamento. O trânsito lento era um grande obstáculo.
“É bem complicado, porque o trânsito ficava bem parado. Ela sai da radioterapia e não pode pegar sol. Era sempre impossível de passar. E aí ontem sofri essa agressão”, concluiu.
Manifestações
Conforme noticiado anteriormente pelo Correio do Estado, as manifestações de eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tiveram início na noite de 30 de outubro de 2022, após o resultado do segundo turno das Eleições Majoritárias de 2022, em que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi reeleito para seu terceiro mandato de presidente da República, com 50,9% dos votos válidos (60.345.999 votos). Jair Bolsonaro teve 49,1% dos votos (58.206.354 votos).
Insatisfeitos com o resultado, os apoiadores do ex-presidente ocuparam os entornos do Comando Militar do Oeste, pedindo por intervenção militar e se mostrando contrários ao resultado das eleições.
No dia 2 de janeiro de 2023, um dia após a cerimônia de posse de Luiz Inácio Lula da Silva, os eleitores do ex-presidente começaram a esvaziar os acampamentos, conforme apurado pela equipe de reportagem.