Durou pouco a chamada "primavera gay" na TV aberta, que culminou no primeiro beijo lésbico numa novela brasileira, em maio, no SBT. Tanto a emissora de Silvio Santos como a Globo deram nos últimos 60 dias uma guinada nos rumos da dramaturgia, e passaram a dar ordens implícitas ou explícitas a seus autores, para que baixem a bola de cenas gays nas histórias. Oficialmente, a decisão se deve a uma suposta "overdose" do tema.
Um ajudante de novelista da Globo, que pede para não ser identificado, disse em entrevista que recebeu "aviso verbal" do autor para que não perdesse tempo elaborando personagens e cenas gays --sejam entre homens ou mulheres--, pois seriam cortadas.
Cerca de três semanas atrás a Globo interveio em "Insensato Coração", vetando ousada cena gay em motel, entre o casal Hugo e Eduardo (Marcos Damigo e Rodrigo Andrade). Também o autor Aguinaldo Silva foi informado há três meses pela emissora de que deveria evitar polemizar com o assunto (gay) em "Fina Estampa", sua próxima novela, que estreia em agosto. Silva, porém, vai incluir um personagem gay "estiloso" na história, interpretado por Marcelo Serrado. Mas não haverá cenas eróticas com ele.
Questionado sobre isso, Silva usou as mesmas palavras que já usara anos atrás, decepcionado com mais um veto da Globo a uma cena homoafetiva: "Beijo gay, só lá em casa".
Não se trata de um comportamento novo. Desde 2008, a Globo já deixou "escapar" ao menos quatro vezes que exibiria uma cena gay, mas acabou desistindo sempre no último momento. Em abril do ano passado, um episódio de "Os Simpsons" teria sido cortado por conter um beijo gay entre Homer e o barman Moe.
Já no caso do SBT a ordem é explícita. Depois de exibir o primeiro beijo lésbico numa novela, entre as atrizes Luciana Vendramini e Giselle Tigre, em "Amor & Revolução", a emissora agora mudou de opinião e a ordem é baixar a bola do tema.
Tiago Santiago, o autor, teve ao menos mais duas longas cenas gays cortadas de sua história. A última deveria ter sido exibida no último dia 7, entre os personagens Jeová (Lui Mendes) e Chico (Carlos Artur Thiré). O novelista do SBT disse que acataria a decisão, mesmo tendo prometido o beijo, além de um outro, entre Vendramini e Tigre.
Na Record, a orientação é implícita e parece ecoar os princípios da Igreja Universal do Reino de Deus, que não considera a homossexualidade algo natural e corriqueiro. Nenhuma trama da emissora até hoje deu destaque a casais ou personagens gays.