Nesta quarta-feira (17), por meio de Diário Oficial, o Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) publicou uma recomendação pedindo para que o município longe cerca de 425 quilômetros da Capital coloque fim no contrato firmado, neste ano, com empresa de engenharia tida como pivô em esquemas milionários.
Conforme o MPMS, após uma série de considerações, o município de Ladário têm o prazo de dez dias - a contar a partir da data da intimação/cientificação da recomendação - para revogar/rescindir/anular o contrato de pouco mais de um milhão de reais firmado com a Engeluga Engenharia LTDA.
Ainda conforme o Ministério Público, o contrato em questão foi firmado sem licitação, através do chamado "processo de inexigibilidade", e possui um valor total de R$ 1.080.000,00 pela vigência de 12 meses.
Como bem detalha o portal da transparência do município, a contratação firmada em 12 de março deste ano é referente aos serviços de "apoio técnico na supervisão e fiscalização da execução das obras e serviços, em atendimento às necessidades da Prefeitura de Ladário".
Na mira do MP
Para expedir a recomendação, destinada ao prefeito e ao secretário de infraestrutura e serviços públicos de Ladário, Munir Sadeq Ramunieh e Waldecyr Ferreira de Arruda respectivamente, uma série de fatores foram levados em consideração.
Além de reforçar as condições para que a dita "inexigibilidade" seja adotada, como a falta expressa de concorrência, entre outros pontos, o Ministério aponta que o processo em questão traz uma "total ausência do objeto especificado à excepcionalidade inerente à falta de licitação".
Em outras palavras, o processo de inexigibilidade que rendeu à Engeluga um contrato de R$1 milhão com o município de Ladário só transcreveu "de forma genérica" as hipóteses legais de apoio técnico, sem, em contrapartida, especificar qualquer obra ou serviço.
Ainda segundo o MPMS, a justificativa/necessidade apresentada na solicitação de contratação direta também não faz qualquer apontamento para que se afastasse o princípio da isonomia por meio da competição.
"Pelo contrário, expuseram como fundamento a insuficiência de servidores lotados na Secretária Municipal de Infraestrutura e Serviços Públicos e a consequente finalidade e não oneração do quadro de servidores – efetivos e/ou comissionados – existentes", cita trecho da recomendação.
Abaixo, segue o recorte da solicitação grifado pelo Ministério Público para reforçar essa Consideração em questão:
"Os serviços de consultoria, assessoria e acompanhamento de obras de engenharia, assim como a supervisão e fiscalização da execução das obras e serviços possuem alto grau de complexidade e demandam a interdisciplinaridade de profissionais e equipamentos necessários à sua completa execução.
A Prefeitura Municipal de Ladário não possui no quadro de pessoal efetivo, profissionais de engenharia civil para tais atividades, atuam dois arquitetos do quadro efetivo e dois engenheiros civis comissionados já lotados em atribuições inerentes ao desempenho da máquina pública, o que implica na contratação externa, visando não onerar o quadro de pessoal existente.
Considerando essas adversidades e ainda os prazos necessários para a realização de uma licitação, faz-se necessário que os serviços estejam disponibilizados para que as realizações das obras sejam imediatas de forma a atender inúmeras demandas trazidas das mais diversas localidades."
Para refutar tal apontamento, o MP cita a cláusula do contrato que detalha os 12 serviços a serem prestados, indicando que os atos - como "elaboração de projeto básico e complementos"; fiscalizar, orçar e analisar resposta técnica, por exemplo - "se confundem com a atividade rotineira de qualquer engenheiro".
Agora, os alvos da recomendação precisam atender ao prazo estipulado, inclusive para informar o acatamento ou não da recomendação, o que abriria possibilidade das devidas medidas judiciais para correção da irregularidade e, inclusive, eventual responsabilização de agentes públicos.
Histórico
Criada em 12 de março de 2015 na Capital, desde 2016 a Engeluga aparece por diários oficiais vencendo licitações. Com capital social de R$200 mil (que atualmente já está em R$1,5 milhão) a empresa passou a levantar suspeitas de que estava sendo favorecida em licitações.
Consultas mostram que a Engeluga ainda em 2016 venceu uma licitação da então Fundação de Apoio à Pesquisa, ao Ensino e à Cultura de Mato Grosso do Sul (Fapems), com valor global de R$16.050,00.
Entre seus vínculos iniciais com municípios interioranos, um deles foi a prefeitura de Eldorado–MS, com a empresa contratada em 06 de abril de 2017, por R$149.400,00 para serviço de Assessoria/Consultoria para fiscalização, execução e elaboração de projeto civil e infraestrutura local.
Esse contrato teve cinco termos aditivos totais, com a empresa voltando a pactuar serviços em 22 de junho de 2022. Além de Eldorado, a Engeluga firmou contratos com:
- Nova Alvorada do Sul
- Água Clara
- Itaporã
- Sidrolândia
- Porto Murtinho
- Ivinhema, entre outros
Na maioria das vezes contratada para assessoria/ consultoria na elaboração de projetos civis, Nova Alvorada, por exemplo, gastou R$180 mil para contratar a Engeluga em 08 de maio de 2017.
Além desses, Água Clara desprendeu R$360 mil contratando a empresa, enquanto Itaporã usou R$329,5 mil para elaboração de projetos executivos de duplicação e implantação de iluminação com luminárias LED na MS-156. Outras licitações, porém, foram ainda mais caras.
Justamente a rapidez fora do comum chamou atenção nessas contratações, com processos de inexigibilidade que duravam cerca de cinco dias. Além disso, a coincidência entre datas do que era proposto pela Engeluga e as datas do Estudo Técnico Preliminar sugerem possíveis ajustes prévios.
A suspeita principal surgiu de contrato com valor de R$930 mil, de gerenciamento de obras e serviços municipais, incluindo a elaboração de Projeto Civil e Infraestrutura do Município de Selvíria–MS, com duração de 12 meses, conforme o Contrato de Financiamento e pelo Sistema de Informação ao Cidadão de Selvíria é possível encontrar a inexibilidade, assinada em 07 de outubro de 2022.
Para elaboração de projetos de obras civis e supervisão e fiscalização de obras civis e infraestrutura, Porto Murtinho gastou R$757.110,00 com a contratação da Engeluga, enquanto no contrato com Sidrolândia o valor fica perto do milhão (R$960.000,00. )
Escândalos e suspeitas
Em 08 de fevereiro de 2024, como bem acompanhou o Correio do Estado, a Engeluga Engenharia apareceu como "pivô" no centro de um suposto esquema criminoso, que levantou desconfianças de práticas de peculato, contratação e lavagem de dinheiro.
Justamente a "inexigibilidade de contrato" de R$930 mil entre a Engeluga e o município de Selvíria levantaram suspeitas do MPMS e do Departamento de Repressão à Corrupção e ao Crime Organizado (Dracco), que nessa ocasião em fevereiro de 2024 colocou os agentes na rua para cumprimento de nove mandados de busca e apreensão.
Além desses 930 mil reais em contrato com Selvíria, o Dracco detalhou que os contratos administrativos com municípios sul-mato-grossenses já somavam pelo menos R$ 11.804.947,05, sendo que a Engeluga chegou até mesmo a assumir a reforma e ampliação da sede da Câmara Municipal de Dourados, que também entrou na mira devido aos custos elevados e suspeitas de sobrepreço e superfaturamento na execução do projeto.


