Se existe algo vergonhoso na administração pública em Mato Grosso do Sul nos últimos anos, certamente é o desfecho da cobrança de pedágio na ponte sobre o Rio Paraguai, na BR-262, a cerca de 70 quilômetros das cidades de Ladário e Corumbá. Construída com financiamento do Fonplata, a ponte foi inaugurada em 2001 e logo em seguida iniciou-se a cobrança de pedágio, sob o argumento de que o dinheiro seria destinado ao pagamento deste empréstimo e para a manutenção da estrutura de dois quilômetros, além de bancar os custos da concessionária.
O empréstimo foi liquidado, mas somente 21 anos depois é que acabou a cobrança. Neste período, o caça-níquel ficou sob responsabilidade da empresa Porto Morrinho, que, no segundo semestre de 2022, parou de cobrar a taxa e que, durante mais oito meses, ficou recebendo dinheiro público, e muito, para fazer a manutenção da estrutura. Só neste último período foram R$ 6 milhões. Mas, ao fim destes anos todos de cobrança, a ponte estava sucateada a tal ponto que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) se recusou a recebê-la.
Para não correr o risco de ficar intransitável, o governo do Estado continuou colocando a mão no bolso e fazendo reparos emergenciais. Até agora, foram pelo menos R$ 10 milhões. E, para fazer a manutenção que deveria ter sido feita ao longo dos anos, serão pelo menos mais R$ 11,7 milhões, sem contabilizar os tradicionais aditivos, que normalmente acrescentam 25% do valor inicial da obra.
E, tão vergonhosa quanto a falta de manutenção, apesar do faturamento da ordem de R$ 2,6 milhões menais com a cobrança de pedágio, é a inércia da administração estadual diante deste sucateamento. Não existe absolutamente nenhuma ação do Executivo ou do Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) para tentar responsabilizar os donos da empresa Porto Morrinho.
Uma das explicações para isso aparece na investigação da Polícia Federal (PF) relativa à operação Ultima Ratio, aquela que resultou no afastamento de cinco desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) e de um conselheiro do Tribunal de Contas (TCE-MS).
Esta investigação aponta que o empresário Nabor Barbosa Filho, um dos proprietários da empresa que cobrava pedágio, teria tomado um empréstimo de R$ 3 milhões do conselheiro Osmar Jerônimo. Para quitá-lo, teria repassado um apartamento de luxo ao advogado Jayne Félix, que, por sua vez, repassou este apartamento para um sobrinho do conselheiro. Esse passa e repassa, segundo a Polícia Federal, era uma forma de dissimular o pagamento de propina do empresário para o conselheiro.
Mas, por que o detentor de uma concessão pública pagaria propina para um integrante do TCE-MS? Simples: o contrato com a Porto Morrinho foi assinado em dezembro de 2008, época em que Osmar Jeronymo era secretário de Governo na administração de André Puccinelli. Exatos seis anos depois, ele foi nomeado por Puccinelli para assumir a vaga de conselheiro. Ou seja, dá a entender a investigação da PF, o caça-níquel daquela ponte no meio do Pantanal não era destinado exclusivamente para bancar o custeio das praças de pedágio e a manutenção da estrutura. Ao que tudo indica, além do gasoduto Bolívia-Brasil que passa ao lado da ponte, ali também havia um “propinoduto”.
relatório da Ultima Ratio, o delegado responsável pela investigação informa que as informações sobre este suposto “propinoduto” foram repassadas a autoridades estaduais e federais, mas até agora não existem informações de que algo esteja sendo feito para tentar esclarecer essas suspeitas e reduzir o tamanho dos prejuízos.




