Colunistas

Artigos

Justiça abre um novo paradigma no tratamento off-label dos pacientes com câncer

Natália Soriani, especialista em Direito da Saúde

Continue lendo...

Em uma decisão marcante para o direito à saúde dos pacientes com câncer, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) condenou a Sul América Companhia de Seguro Saúde S.A. a fornecer o medicamento oncológico pembrolizumabe (keytruda) a uma beneficiária de plano de saúde, mesmo em caráter off-label.

Essa determinação da Justiça estabeleceu um importante precedente para pacientes que necessitam de tratamentos não previstos na bula do medicamento.

O pembrolizumabe é um imunoterápico utilizado no tratamento de diversos tipos de câncer, como melanoma, câncer de pulmão e linfoma de Hodgkin. 

Contudo, no caso em questão, a paciente foi diagnosticada com um sarcoma pleomórfico de alto grau, uma forma rara 
e agressiva de câncer, para a qual o uso do pembrolizumabe não tem aprovação específica.

A decisão foi embasada em laudo médico que indicou o medicamento como a melhor alternativa terapêutica, dada a gravidade e a urgência do caso. O TJSP também frisou o respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao direito à saúde, garantidos pela Constituição Federal de 1988.

Apesar de o uso off-label não estar regulamentado para certas condições, ele pode ser essencial para a sobrevivência e a qualidade de vida de pacientes com doenças graves e sem outras opções terapêuticas disponíveis.

A decisão também reafirmou a responsabilidade dos planos de saúde em garantir acesso a tratamentos prescritos por médicos, ainda que não constem especificamente em suas diretrizes, desde que amparados por evidências científicas e pela singularidade do quadro clínico.

Para os profissionais do Direito, esse caso sublinha a importância de uma defesa bem fundamentada em favor dos pacientes, unindo conhecimento técnico e sensibilidade. O sucesso da beneficiária reforça a necessidade de uma abordagem jurídica que considere as peculiaridades de cada caso clínico.

Em tempos de Outubro Rosa, esse precedente pode influenciar futuras ações judiciais, promovendo uma interpretação mais ampla e humanizada das coberturas de planos de saúde, especialmente em tratamentos oncológicos e em outras áreas de alta complexidade médica.

Dessa forma, a decisão do Tribunal paulista trouxe à tona a constituição de um marco na luta pelo direito à saúde e à vida digna, reafirmando a necessidade da Justiça para que se adapte às demandas reais dos cidadãos brasileiros.

ARTIGO

Receita Federal "paz e amor" precisa encontrar eco na realidade

Receita Funciona é um programa voltado ao diálogo entre a Receita Federal do Brasil (RFB) e a sociedade civil, representada por entidades de classes de âmbito nacional

11/10/2024 07h11

Continue Lendo...

O Receita Funciona é um programa voltado ao diálogo entre a Receita Federal do Brasil (RFB) e a sociedade civil, representada por entidades de classes de âmbito nacional, como centrais sindicais, confederações nacionais e representativas de categorias econômicas.

A intenção é louvável, pois, em regra, as relações entre o Fisco e os contribuintes não é das mais amistosas, de modo que a proposta tente a trazer ambas as partes para a mesa, a fim de discutirem questões relevantes e – quem sabe – construírem em cooperação soluções inovadoras, mais justas e adequadas no que se refere à conformidade fiscal.

É evidente que quando a resposta é dada “de cima para baixo”, essas tendem a ser mais difíceis de serem vistas com bons olhos.

Porém, se construídas democraticamente – ao menos é essa a nossa visão acerca do projeto –, elas são mais propensas a serem aceitas e cumpridas. Porém, como sempre, nem todos os temas poderão ser submetidos ao Receita Funciona.

Segundo o art. 6º da Portaria RFB nº 466/2024, não serão abrangidos pelo projeto: matérias para as quais haja trâmite processual específico; arguição de constitucionalidade de lei ou tratado; solicitação de informações que podem ser obtidas por meio da Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação); atendimento e andamento processual relativos a contribuintes específicos; e denúncias.

Enfim, o programa busca tratar especificamente a respeito das dificuldades que os contribuintes têm de se adequarem às exigências tributárias e aduaneiras, com a participação ativa desses.

Os que estiverem interessados em realizar essa tratativa devem realizar o protocolo do requerimento perante o site servicos.receitafederal.gov.br.

Para além disso, outra proposta que segue a mesma linha do diálogo é a tratada na Portaria RFB nº 467/2024.

Nela, a Receita, buscando evitar conflitos entre si e os contribuintes, institui o Procedimento de Consensualidade Fiscal – Receita de Consenso no âmbito da Secretaria Especial da RFB.

O foco desse programa é a composição consensual de conflitos entre o Fisco e os contribuintes que possam advir da qualificação de fatos tributários e aduaneiros.

Instituiu-se o Centro de Prevenção e Soluções de Conflitos Tributários e Aduaneiros (Cecat), que deverá ser composto, preferencialmente, por indivíduos com capacitação específica para o exercício das atividades e que serão escolhidos a partir de processo seletivo.

A busca, portanto, será capacitar o Cecat com servidores que tenham credenciamento para atuarem com técnicas de consensualidade, buscando solucionar controvérsias de qualificação de fatos diretamente com os contribuintes e, com isso, evitar – ou até mesmo extinguir – processos administrativos e/ou judiciais.

É importante ressaltar que o Receita de Consenso não discutirá demandas com indícios de sonegação, fraude ou conluio; crimes contra a ordem tributária; crimes de descaminho ou contrabando; infrações puníveis com pena de perdimento; e questões que tratem de fatos geradores cujo prazo de decadência para o lançamento do crédito tributário seja inferior a 360 dias, contados da data do requerimento para instauração do procedimento no programa.

Ressalta-se, ainda, que a concordância com o Termo de Consensualidade – documento final para dirimir a discussão – resultará no compromisso de adoção, por todas as partes envolvidas, da solução nele contida e, mais importante ainda, da renúncia ao contencioso administrativo e judicial na parte consensuada.

Entretanto, a RFB está empenhada no espírito consensual, o que não é lá muito comum para órgãos de Estado.

Se não for esse o espírito do Fisco, os projetos tendem a simplesmente serem inócuos, principalmente em decorrência das graves crises que têm sufocado os pagadores de impostos no País.

Outro ponto de indiscutível importância para o sucesso da proposta consensual é que o Estado “renuncie” a uma de suas blindagens mais características e abusivamente utilizadas para fugir de soluções conciliatórias: a indisponibilidade e supremacia do interesse público.

Até mesmo porque não haverá consenso se a negociação parte do princípio de que um ponto de vista deve prevalecer.

Na verdade, não se trata de renunciar o irrenunciável, mas adequá-lo à finalidade compositiva das normas citadas acima.

É preciso que o Estado brasileiro se posicione com real interesse na composição amigável e consensual, e não se utilize de subterfúgios para atrasar discussões administrativas e/ou judiciais legítimas dos contribuintes, ou, ainda, violando o princípio da boa-fé.

Construir por meio de instrumentos legais uma narrativa de Receita Federal “paz e amor” que não encontra eco na realidade não é suficiente para quem tem pesadas obrigações tributárias a cumprir para prover a União.

 

Assine o Correio do Estado

ARTIGO

Lazer saudável como alternativa às bets

Promessa de ganhos fáceis pode parecer atraente, mas comportamento ao longo do tempo gera ciclos de endividamento, agravando a situação de vulnerabilidade

11/10/2024 07h06

Continue Lendo...

O lazer sempre ocupou um espaço central na vida humana, atuando como válvula de escape e uma maneira de expressar nossas identidades culturais. 

Na visão de Pierre Bourdieu, o gosto por determinadas formas de entretenimento reflete não só preferências individuais, mas também posicionamentos sociais e culturais, influenciados pelas estruturas de poder e classe.

Essa análise é relevante quando observamos o crescimento alarmante das apostas on-line no Brasil.

O interesse cada vez maior da população por jogos de azar, como as bets, não é apenas uma questão de entretenimento.

Trata-se de um reflexo de um cenário social e econômico que empurra milhões de pessoas para uma busca desesperada por soluções rápidas para seus problemas financeiros.

A promessa de ganhos fáceis pode parecer atraente, mas a realidade é que esse comportamento ao longo do tempo gera ciclos de endividamento, agravando a situação de vulnerabilidade.

E vamos lembrar que, mais ou menos um ano atrás, estávamos aqui discutindo sobre as lives NPC e agora o que vemos nos jornais é o nível de endividamento por conta dos jogos de azar. Coincidência? Diria que não.

Mas tem algum jeito de revertermos isso? Antropologicamente, o lazer saudável deveria contribuir para a coesão social, promovendo bem-estar e fortalecendo os laços comunitários.

O filósofo e sociólogo Roger Caillois reforça a ideia de que o jogo, quando em sua forma mais pura, deve ser uma experiência lúdica, em que o prazer e o desenvolvimento cognitivo e social estão no centro.

No entanto, 
o lazer transformado em uma busca incessante por lucro, como vemos no caso das bets, desvirtua esse propósito, levando ao isolamento e à angústia.

O impacto desse fenômeno de curto prazo já é evidente nos números crescentes de endividamento, porém, a médio/longo prazo, as consequências se espalham por diversos setores da sociedade: desde a redução do consumo em áreas essenciais até o aumento da pressão sobre os sistemas de saúde mental e assistência social.

De acordo com informações divulgadas pelo Banco Central sobre o mercado de jogos de azar e apostas on-line no Brasil, aproximadamente 24 milhões de pessoas físicas participam de jogos de azar e apostas no País e 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família destinaram R$ 3 bilhões às casas de apostas virtuais somente em agosto.

Dados como esse mostram que a espiral de dívidas não afeta apenas o indivíduo, mas compromete também 
o futuro das famílias e do próprio tecido social.

Promover um lazer saudável que privilegie a cultura, o esporte e atividades que gerem valor a longo prazo é fundamental para mudar essa trajetória.

Em vez de buscarmos saídas rápidas e arriscadas, precisamos refletir sobre como nossos padrões culturais de consumo de entretenimento podem ser repensados, a fim de fomentar uma sociedade mais equilibrada e menos suscetível a armadilhas financeiras.

O entretenimento tem o poder de libertar ou destruir, dependendo de como escolhemos vivê-lo.

 

Assine o Correio do Estado

NEWSLETTER

Fique sempre bem informado com as notícias mais importantes do MS, do Brasil e do mundo.

Fique Ligado

Para evitar que a nossa resposta seja recebida como SPAM, adicione endereço de

e-mail [email protected] na lista de remetentes confiáveis do seu e-mail (whitelist).