O declínio da indústria brasileira extrapolou a economia e se tornou uma questão social e política crítica. Diante de um novo ambiente internacional, em que as grandes economias se preparam para se defender das políticas predatórias de nações mais avançadas, a fragilidade da economia, em especial de sua capacidade de inovação, transformou-se em um obstáculo para a melhoria dos salários e a geração de empregos decentes e mais qualificados. Uma trava real para a redução das desigualdades sociais.
Embora o País tenha conseguido criar empresas globalmente competitivas e incentivar um número crescente de startups de tecnologia, o aumento do nível e da qualidade da inovação continua sendo o maior desafio para a elevação da produtividade.
Não é segredo que o financiamento é caro, que o ambiente regulatório nem sempre é amigável e que a tributação e a infraestrutura amarram o País. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e os planejadores públicos conhecem muito bem esses obstáculos, presentes na Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (Pitce), de 2004, na Política de Desenvolvimento Produtivo (2008), no Plano Brasil Maior (2011) e no Inova Empresa (2013).
Essas políticas industriais estimularam a inovação, mas não conseguiram alterar o padrão de baixo desempenho que marca a economia. Atualmente, o Nova Indústria Brasil (NIB), por maior que seja a sua importância, tampouco será suficiente para dar o salto que a economia precisa.
Isso porque a inovação brasileira está concentrada em setores não tecnológicos ou de baixo nível tecnológico, que competem muitas vezes até mesmo com técnicas modernas, mas sem a mesma intensidade
e sem oferecer o mesmo potencial de crescimento que os segmentos de alto desempenho, que geram tecnologias e impulsionam o novo ciclo tecnológico que sacode o planeta.
Esse novo ciclo tem no seu coração o digital, a começar pela inteligência artificial (IA), em que o Brasil revela enorme atraso. A economia não elevará seu patamar de eficiência, sofisticação e competitividade apenas com a intensificação de políticas que se mostram necessárias, mas oferecem repetidamente mais, embora do mesmo.
Os tímidos indicadores de digitalização, o volume muito abaixo da média mundial de robôs industriais e o enorme atraso em semicondutores, para não falar das patentes, tornam flagrante a fragilidade endêmica da nossa economia, que tende a se manter em um padrão intermediário, incapaz de gerar crescimento constante, limpo e sustentável para competir internacionalmente e atender às necessidades básicas da população.
Nossa especialização em produtos de menor valor agregado e em commodities, que caracteriza a economia há décadas, prendeu o País em uma armadilha de baixa e média capacidades tecnológicas, o que somente será rompido com políticas focalizadas, intensivas em investimento e conhecimento. Para escapar dessa armadilha, o País precisa de mudanças transformadoras conduzidas por um corpo especializado, como uma Agência de Projetos de Tecnologias Avançadas, para atuar como um catalisador para inovações de ruptura.
No mundo em vertigem que vivemos, é preciso ousar além da lógica tradicional de fomento à inovação. As abordagens recorrentes de política industrial, ainda que possam ajudar, não conseguirão reduzir o deficit tecnológico atual se uma parcela do investimento disponível não se concentrar em poucos projetos de vulto. Desde o Proálcool, o Brasil implementa políticas que atendem empresas, universidades e pesquisadores, mas não resolvem projetos de interesse nacional efetivamente transformadores.
Uma proposta de criação de uma iniciativa de projetos tecnológicos de alto impacto nasceu no Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável (CDESS) no início de 2023 e foi aprovada pelo presidente da República em 2024. Embora ainda não tenha se tornado realidade, esse programa pode apresentar resultados no médio prazo e alavancar a criação de uma agência de inovação de alto desempenho, que reúna pessoal qualificado do BNDES, da Finep, da Embrapii, da ABDI e da Embrapa.
O Brasil tem competência para dar esse salto e responder a um mundo em que as tecnologias mais avançadas tenderão a ficar confinadas em seus países de origem.