Colunistas

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A polícia é misógina, as demais instituições sociais são misóginas, eu sou misógina e você também é. Esse é o tipo de assunto que as pessoas evitam porque provoca uma paralisia social. O famoso “sempre foi assim, o que podemos fazer?” Mas a misoginia não fica no abstrato – ela se concretiza o tempo todo. É um soco no estômago, ou melhor, uma facada no peito. Três facadas no peito da nossa querida Vanessa Ricarte: mulher, jornalista, amiga, filha, irmã. Brutalmente assassinada na quarta-feira, em Campo Grande, pelo ex-noivo, que não aceitou a separação e a retirou de cena para sempre. 

A misoginia paira no ar quase que em um estado metafísico. Misoginia é o desprezo, aversão ou preconceito contra mulheres. Pode se manifestar de várias formas, como discriminação, violência, desvalorização, assédio e reforço de estereótipos que inferiorizam ou limitam as mulheres. A misoginia está presente em diferentes aspectos da sociedade, incluindo a cultura, a política, o trabalho e as relações interpessoais. O que aconteceu com Vanessa é a corporificação dessa misoginia, algo sobre o qual ninguém realmente quer falar.

A polícia, estruturada em uma lógica patriarcal, foi negligente e mandou Vanessa de volta para o seu algoz quando ela pediu ajuda. Vanessa é assassinada. As redes sociais reagem com desdém ao fato de ela ter se envolvido com uma pessoa que tinha antecedentes criminais. Em seguida, um áudio de Vanessa é publicado, em que ela descreve o descaso com que foi tratada na delegacia, momentos antes de seu assassinato. As redes sociais começam a culpar outra mulher pelo crime, a delegada.

A misoginia funciona como um elemento estruturante social. É uma força que organiza a sociedade. Nos dias que se seguem à morte de Vanessa, essa norma social tenta se reestruturar, não perder força, e nós somos os interlocutores reorganizando essa força. Estruturas hegemônicas, como a misoginia, estão constantemente renegociando seu status de poder nas camadas da sociedade, seja no foro privado, como na instituição da família, seja em estruturas públicas, como a escola, o trabalho, os Três Poderes e a mídia.

A mídia tem o papel de ser um fórum de discussão sobre o público e já avançou em muitas pautas de justiça social. Quando a feminista Nancy Fraser escreveu sua crítica à esfera pública, ela ponderou que a mídia tem a capacidade de transmutar o que a cultura muitas vezes assume como pertencente à esfera privada para a esfera pública. A violência contra a mulher é exatamente um exemplo que Fraser utiliza: a briga de marido e mulher era (e ainda é) frequentemente alinhada à esfera privada, quando, na verdade, é um assunto de foro público.

Essas três facadas no peito foram sentidas, cessaram a vida de Vanessa e evidenciam a misoginia em sua forma mais brutal e insidiosa. A imprensa tem agora uma oportunidade única: abordar temas desconfortáveis, discutir a misoginia estrutural dentro e fora de casa. Não se trata apenas de encontrar culpados, mas de tratar o tema em dimensão sistêmica – e só a imprensa pode fazê-lo. Ela é ainda o espaço público mais referencial para o debate social. Vanessa era uma jornalista competente e acreditava na imprensa. Teve a coragem de se levantar e denunciar seu algoz, quando muitas de nós não tivemos essa coragem. Que esse levante não seja em vão.

ARTIGOS

Pensar fora da caixa

13/03/2025 07h45

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Um texto é sempre uma costura desigual, que insere novas ideias, em que os fios se entrelaçam e podem resultar em um pensamento fora da caixa. Quando falamos em pensar fora da caixa, fora dos ambientes burocráticos, significa que temos mais liberdade para expressar nossas ideias. Queremos abordar conceitos como acessibilidade, possibilidades, credibilidades e interesses no exercício do trabalho e na busca de emprego. 

Desempenhar funções, em diferentes empresas, para os cotistas difere dos demais funcionários. Para aqueles que preenchem vagas de cotas, as funções são as de menos importância, e as pessoas correm o risco de não conseguir atravessar o período de experiência. Por vezes, são dispensados por falta de assistência, a qual poderia modificar a condução das tarefas.

As orientações são imprescindíveis, e os colegas também podem colaborar para melhorar o desempenho das funções. Dada a variedade de deficiências e das características delas, o cotista pode ser contratado para um tipo de trabalho e ter habilidades para outras funções. Neste caso, ele teria de ser alocado em diferentes setores, de modo que ele possa verificar quais são aquelas funções em que ele pode investir mais esforços e obter o sucesso desejado por ele e pela empresa. Esta mobilidade poderia ocorrer com o auxílio dos colegas, que vão acompanhar o trabalho diário.

Pensar fora da caixa ajuda a idealizar uma situação diferente para o cotista, que tem maturidade suficiente para ter acesso à acessibilidade e aos conhecimentos produzidos pela empresa, a desenvolver empatias que possam melhorar o ambiente de trabalho e a adaptar as lacunas vindas das deficiências às necessidades da empresa.

No caso do uso da língua brasileira de sinais (Libras), pode ocorrer o que se chama de violência linguística, com a proibição da comunicação entre os surdos e também existe a desvalorização ou negação, ignorando a comunicação entre os mesmos e forçando-os a se adaptar. Durante séculos esta comunicação foi proibida. Schlünzen, Di Benedetto e Santos (2012), ao escreverem a história das pessoas surdas, mencionam que o padre Espanhol Juan Pablo Bonet (1579-1633) criou o alfabeto manual, em que cada palavra tinha um valor simbólico visual. Neste percurso histórico, o drama ainda continuou, pois o alfabeto manual difere do ensino das línguas. A situação vulnerável da pessoa surda ainda continua, e é preciso sempre lembrar que a inclusão e a cidadania dependem das atitudes de toda a sociedade em relação às deficiências. 

Já temos a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015), a qual institui a inclusão da pessoa com deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Precisamos colocá-la em prática, ou seja, encorajar as pessoas a aceitarem uns aos outros e exercer os direitos e os deveres, de modo a garantir que a lei se cumpra e que possamos legitimá-la. 

Então, o que é pensar fora da caixa? Pensar conforme regem as leis e também ter empatia para com pessoas com deficiência, ter prazer em aprender com elas e por elas, ou seja, por exemplo aprender Libras, Braille e, acima de tudo, isso é fazer a diferença.

Convido você a fazer a diferença e a pensar fora da caixa. Vamos?!

ARTIGOS

Mulheres na política, avanços e desafios

13/03/2025 07h30

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É estatístico: a presença feminina na política subiu no Brasil. Os dados eleitorais indicam que houve um crescimento do número de mulheres em todos os cargos em disputa nas eleições municipais de 2024, em comparação ao pleito anterior, realizado em 2020. Esse é um avanço que merece ser relembrado e comemorado de forma especial agora em março, quando é celebrado o Mês da Mulher.

Os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indicam que, nas eleições municipais de 2024, quase 730 mulheres foram escolhidas para assumir os postos mais altos das prefeituras de seus respectivos municípios. Em comparação a 2020, o aumento foi de 7%. Já para os cargos de vice, foram eleitas 1.066 mulheres, em uma escalada de 15%. Elas também conquistaram maior número de cadeiras nas Câmaras Municipais, com crescimento de 12%.

São números significativos, que chegam quando estamos próximos de alcançar os 100 anos da eleição da primeira prefeita do Brasil e da América Latina. Alzira Soriano foi eleita em 1929, no município de Lajes, no Rio Grande do Norte, e abriu as portas do mundo político para as mulheres brasileiras. Se estivesse viva, certamente estaria inquieta em busca de novas conquistas. Desafios não faltam. 

Apesar de ser crescente o número de mulheres eleitas, ainda há no Brasil um ambiente político pouco favorável ao surgimento de grandes lideranças femininas. Atualmente, temos apenas duas prefeitas nas capitais brasileiras, em Aracaju e Campo Grande. Se observarmos as eleições de 2022, veremos que foram eleitas apenas duas governadoras, nos estados do Rio Grande do Norte e Pernambuco, e somente quatro mulheres saíram vencedoras na disputa para o Senado.

Já na Câmara dos Deputados, os dados são mais animadores. A bancada feminina saltou de 77, em 2018, para 91, em 2022. E é justamente dela que vem um dado preocupante: a cota mínima de 30% de candidaturas femininas foi descumprida em mais de 700 municípios brasileiros em 2024.

A Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados divulgou os dados, por meio do Observatório Nacional da Mulher na Política (ONMP), e os encaminhou ao TSE e à Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) com a solicitação de que sejam empenhados esforços para o cumprimento da legislação eleitoral.

E é bom que os partidos estejam mais atentos a esse tema, não simplesmente porque a lei está mais rígida e a fiscalização mais ampla, mas por uma questão de sobrevivência. Temos hoje um novo eleitor, mais bem informado e consciente de seus direitos e dos direitos dos outros, e novas tendências de perfis de candidatos eleitos, com maior representatividade de mulheres e minorias na política.

Os tempos mudaram. Felizmente.

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