Conforme anunciado no dia 16 de fevereiro pelo Governo Federal, as bolsas de formação, de pesquisa e de outros benefícios voltados à educação, sofreram reajustes. Os novos valores foram publicados na manhã desta quinta-feira (23), na portaria do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológica (CNPq), do Diário Oficial da União.
Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), as bolsas não sofriam ajuste há aproximadamente 10 anos.
No Brasil, são duas as principais instituições responsáveis pelo fomento da pesquisa, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), vinculado ao MCTI, e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), atrelado ao Ministério da Educação (MEC).
Esses reajustes foram um dos estandartes de campanha que o atual Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva (PT), fez uso no último pleito, de 2022.
Segundo o Governo Federal, o aumento atenderá 87 mil bolsistas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e 78 mil do CNPq, em todos os estados e no Distrito Federal.
Além disso, segundo Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG), passados quase 10 anos sem ajuste, houve perda de 75% do poder de compra dos bolsistas brasileiros. Para Luciana Santos, a situação se agravou com o menosprezo à ciência durante o governo de Jair Bolsonaro, cujo mandato se encerrou no ano passado.
"Ocorreram drásticos cortes no financiamento da pesquisa do país. Mas o tempo da negação da ciência passou. A ciência voltou a ser uma prioridade nesse país", afirmou.
Na prática
No rol desses ajustes, está a acadêmica do curso de Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Mariana Silveira, de 21 anos, bolsista de Residência Pedagógica da CAPES.
Mariana, que mora sozinha e veio do interior (da cidade de Aquidauana) para cursar sua graduação na Capital, conta que o ajuste das bolsas é um avanço, sobretudo porque os valores dos produtos básicos para sua sobrevivência subiram nos últimos anos.
Bolsa essa que, de 2013 a janeiro de 2023, era no valor de R$ 400 e agora, com o ajuste de 75%, passa a ser de R$ 700.
“O reajuste nas bolsas é ótimo e vai melhorar muito a minha qualidade de vida, visto que tudo aumentou nesses últimos anos e o valor da bolsa estava defasado”, pontua a acadêmica.
Além disso, Mariana conta que o auxílio é uma ação afirmativa importante, não apenas para sua formação acadêmica, mas também para viabilizar sua permanência em uma instituição de educação superior pública, bem como a manutenção das suas demandas acadêmicas.
“A bolsa me ajuda na mobilidade para ir à escola na qual faço estágio e também me ajuda a me manter na universidade, visto que vim de outra cidade para estudar e moro sozinha”, finaliza.
Com uma realidade parecida, a acadêmica e bolsista do curso de jornalismo, também da UFMS, Vitória Martins, de 22 anos, lida com adversidades para manter-se na faculdade.
A graduanda, vinda de Corumbá, informa que mesmo com o subsídio das ações afirmativas do governo, como as bolsas e os auxílios, ainda encontra dificuldades para manter-se na sua graduação, sobretudo pensando nos desafios que envolvem o acesso ao ensino superior. Para ela, cada mês era tomado por uma gama de incertezas.
O dinheiro, segundo a acadêmica, subsidia apenas (e com dificuldade), as demandas da casa, “para não passar fome”.
Vitória conta que não tem o privilégio de apenas estudar e que precisa trabalhar para complementar sua renda e viabilizar tanto sua sobrevivência, quanto a permanência na faculdade. A acadêmica vê com bons olhos os ajustes.
Ela diz ainda que, após o aumento das bolsas depois de quase 10 anos, pode ser um respiro e um alívio para a garantia da formação superior, bem como uma importante ferramenta da democratização do conhecimento.
“O valor da bolsa aumentando vai me ajudar a ter uma vida mais tranquila, com menos perrengue. Talvez até consiga aproveitar mais a universidade socialmente sem me preocupar tanto em ter que trabalhar e estudar em um curso integral, além de que vai me ajudar a pagar as contas”, discorre.
A graduanda ainda diz ainda que, conforme os preços dos produtos básicos aumentaram, a dificuldade em manter-se na faculdade também seguiu a mesma direção. Com isso, Vitória pontua que, como o custo de vida tem ficado cada vez mais elevado, manter-se em um ensino superior público se torna cada vez mais desafiador.
“Os dinheiros (das bolsas) que eu recebia era só pra pagar conta, fazer minhas comprinhas assim de casa pra não passar fome e pagar meu aluguel pra morar aqui. Agora tipo as outras coisas eu não tinha”, pontua.
Além disso, para ela, é de grande dificuldade sair de sua cidade natal para tentar a vida acadêmica na Capital sem ações afirmativas que contribuam para que ela tenha acesso às questões básicas de sobrevivência.
Apesar de a Constituição Federal de 1988, destinar ao Estado a responsabilidade de viabilizar e permitir o ingresso das pessoas aos níveis mais elevados de ensino, da pesquisa e da criação artística, realidades como as da Vitória e da Mariana se estendem a diversos outros espectros da população brasileira.
Mesmo com indivíduos buscando o acesso ao ensino superior, sobretudo o público, acadêmicos encontram diversos obstáculos que perpassam a garantia de subsídios para assegurar sua permanência na faculdade.
No MS
O Correio do Estado entrou em contato com Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (FUNDECT/MS) para saber os impactos do reajuste na educação e na pesquisa sul-mato-grossense.
Ao Correio do Estado o diretor-presidente da Fundect/MS, Márcio Pereira, conta que o órgão vê com bons olhos o aumento das bolsas de pesquisa, propostos pelo Governo Federal.
“Há muito nossos pesquisadores precisavam desse incentivo. Temos certeza que esse apoio vai aumentar ainda mais a qualidade de nossa produção científica. Em Mato Grosso do Sul estamos atuando também para valorizar os pesquisadores com novos editais de fomento e novas bolsas para os programas de pós-graduação. Ao longo do ano, estão programados os lançamentos de diversas ações neste sentido", explica.
Além disso, a Fundect informa que, com o ajuste das bolsas, serão diversos os impactos aos acadêmicos, como por exemplo:
- Maior segurança de que o pesquisador vai conseguir terminar a pesquisa, com qualidade.
- Diminui as desistências e evasões em programas de graduação e pós-graduação.
- Fomenta o início de novas pesquisas.
- Valoriza os profissionais que trabalham com pesquisa, dando respostas científicas e exequíveis para os problemas que afetam a sociedade.
No que diz respeito ao fato de o último ajuste das bolsas ter acontecido em 2013, a Fundação lamenta a demora de quase 10 anos para o aumento acontecer.
“Foi um período difícil, no qual a Fundect teve papel forte no apoio a Ciência e Inovação com novos editais para atender às necessidades de pesquisa e desenvolvimento do Estado. Podemos citar o edital Carbono Neutro, uma inovação criada no período, e o edital Mulheres na Ciência, que aportaram mais recursos”, informa em nota.
Por fim, a Fundect conta que está caminhando para adaptar as tabelas de bolsas estaduais para acompanhar os reajustes feitos pelo Governo Federal, mas informa que ainda não há uma data prevista para que isso aconteça.
“Devemos fazer uma comunicação oficial nos próximos dias, assim que tudo estiver pronto”, finaliza, em nota.
Ajustes
Conforme as informações do Portal da Transparência da Capes, a UFMS recebeu um montante de aproximadamente R$ 15 milhões, no decorrer de 2022. Os valores foram divididos entre níveis de graduação, sendo que os maiores valores foram destinados para os campos do Doutorado.
Além disso, a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) - R$ 9,6 milhões, já a Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) contou com o fomento de R$ 4,9 milhões.
Por fim, as instituições privadas de ensino, como a Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) e a Uniderp, receberam fomentos de R$ 3,8 milhões e R$ 1, 024 milhão, respectivamente.
Além dos citados, a Capes destinou recursos para bolsistas dos municípios do interior do estado, como Ponta Porã, Aparecida do Taboado, Costa Rica e Miranda.
O aumento percentual das bolsas será de 40% para os alunos do mestrado e doutorado, de 25% para os pós-doutorandos, de 75% para a iniciação científica e de 200% para a iniciação científica júnior.
Com isso, o valor da bolsa de mestrado sobe de R$ 1,5 mil para R$ 2,1 mil; o doutorado vai de R$ 2,2 mil para R$ 3,1 mil. No caso do pós-doutorado, o benefício salta de R$ 4,1 mil para R$ 5,2 mil.
O auxílio para a iniciação científica e docência irá de R$ 400 para R$ 700 e a iniciação científica júnior passará de R$ 100 para R$ 300. o aumento será destinado à todos os estados do Brasil, bem como ao Distrito Federal.
Além das bolsas, serão reajustadas as taxas de bancada para alunos de cursos de doutorado e pós-doutores e os adicionais de bancada das bolsas de Produtividade do CNPq, ambos em 20%. Ao todo, os reajustes implicam aporte de R$ 2,38 bilhões em recursos do Ministério da Educação e do Ministério da Ciência e Tecnologia.
*Matéria atualizada para acréscimo de informações, às 09:08 de 25/02.




