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opinião

Elisa Pinheiro de Freitas:
"Em que ritmo toca Corumbá?"

Graduada, Mestre, Doutora e Pós-doutora em Geografia pela USP e Docente da UFMS ([email protected])

Redação

05/02/2015 - 00h00
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Atualmente, residindo em Corumbá, tenho feito muitas observações sobre esse município que chega a ser até mesmo maior, em termos de extensão territorial, do que alguns estados brasileiros. Não examinar essa realidade que se abre para alguém que provém do Brasil-Atlântico é mesmo um “crime”, sobretudo, para quem passou parte da juventude buscando “treinar o olhar” para captar as contradições no processo de formação e produção do espaço geográfico.

O que mais chamou-me a atenção quando aterrei em Corumbá – não tenham dúvidas caro/a leitor/a – foi a exuberante paisagem: a extensa planície pontilhada por lagoas, o rio Paraguai e o sítio urbano encravado em meio a essa força da natureza que é o Pantanal. Outra singularidade também despertou o nosso olhar: Corumbá-fronteira com Puerto Quijaro e Puerto Suarez – ambas cidades bolivianas.

Sim, agora estamos falando a partir de um, dos vários pontos do Brasil-Fronteira, que só lá, muito de vez em quando, aparece na pretensa imprensa “nacional”. Trocando em miúdos: aparece quando o assunto refere-se a apreensão de armas e drogas ilegais e aí o Brasil-Fronteira assume o papel de “bode expiatório” para os males e dilemas que assolam o Brasil-Atlântico e o Brasil-Central (e observe caro/a leitor/a que nem vamos comentar sobre o Brasil-Amazônico para não tergiversarmos do nosso foco). 

Corumbá, para além de ser a capital do Pantanal, é também uma das faces do Brasil-Fronteira e padece dos males do que vamos denominar de relativa “inércia territorial”. Foi conversando com uma comerciante do município supra citado que busquei sintetizar um conceito que explicasse o que ela disse-me: “Corumbá é a cidade do que ‘já teve’; no presente ‘não tem’, mas que ‘vai ter’ no futuro (assim esperam).

De fato, a história e a geografia não mentem como bem nos oferecem dados dos períodos em que Corumbá era uma localidade pujante. Foi nesta municipalidade que se construiu o primeiro edifício de todo o Mato Grosso (antes mesmo da criação do estado de Mato Grosso do Sul). O casario localizado no Porto Geral também é testemunho de um tempo em que as “estradas líquidas” (lê-se o rio Paraguai e seus afluentes) eram os principais caminhos de articulação desta com outras regiões brasileiras e sul-americanas. A pergunta que não quer se calar e que os/as estudantes da UFMS Campus-Pantanal (os de geografia, sobretudo) fazem sempre que têm oportunidade é: o desenvolvimento re-pousará em Corumbá? A criação da Universidade Federal do Pantanal mudaria a face do município?

Os dilemas são profundos e a relativa “inércia territorial” de Corumbá encobre dinâmicas territoriais que paradoxalmente são “silenciosas” (porque precisam ser para o ‘bem’ dos negócios não lícitos). A condição de ser e estar numa região fronteiriça faz de Corumbá uma porta para, por que não, um Brasil-Pacífico, no sentido de aprofundar a integração com os países vizinhos, tornando possível o acesso do Brasil ao oceano pacífico. Mas, os caminhos que levam “os brasis” para Corumbá são tão rarefeitos que não demoramos a perceber que Corumbá e sua região tende a ser mais polarizada por Santa Cruz de La Sierra (Bolívia) do que por Campo Grande. Separadas por uma distância de aproximadamente 428 km, Corumbá e Campo Grande se conectam por forças tênues, configurando uma situação de quase isolamento geográfico da primeira em relação a segunda, reforçado pela extensa planície pantaneira que apresenta todo um ecossistema próprio e que requer proteção.

Os desafios para o desenvolvimento de Corumbá e sua região, é preciso ressaltar, passam, num primeiro momento, muito mais pela ampliação ao acesso à fronteira (melhoria das vias de circulação, articulação dos diferentes modais de transporte e “compressão” do espaço pelo tempo “aproximando” Corumbá dos outros “brasis”) do que necessariamente pela criação de instituições de ensino superior. É preciso fazer encontrar o tempo lento que toca Corumbá com tempo rápido que emana de regiões mais dinâmicas do Brasil e do mundo. Algumas atividades e atores utilizam-se desse binômio isolamento geográfico-tempo lento e dribla-os habilmente em prol dos próprios interesses, mas Corumbá como um todo não pode ficar prisioneira da sua posição geográfica, para o bem dos que já estão estabelecidos e para a permanência dos que chegam.

editorial

Depurar a polícia para fortalecer a lei

Policiais que se corrompem colocam em risco mais do que suas próprias carreiras, comprometem a integridade de todo o sistema de segurança pública

04/12/2025 08h30

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A investigação conduzida pela Polícia Federal envolvendo dois policiais de Mato Grosso do Sul – um militar e outro civil – suspeitos de ligação com o contrabando é mais do que necessária: é fundamental para a saúde institucional do País. A depuração interna, especialmente quando atinge aqueles que deveriam zelar pela lei, é um dos pilares de qualquer sistema de segurança pública que pretenda inspirar confiança. Porque, para que a polícia funcione a contento, não basta treinar, equipar ou ampliar efetivos, é preciso oxigenar constantemente suas estruturas, renovar práticas e reafirmar o compromisso ético de seus integrantes.

Uma polícia não pode ser guiada por convicções pessoais, crenças particulares ou simpatias ideológicas. Sua atuação deve ser ancorada em fatos, provas e legalidade. A independência funcional não é luxo, é condição indispensável para que a instituição cumpra seu papel de proteger a sociedade e manter o funcionamento correto das instituições democráticas. Quando um policial se afasta desse caminho, toda a corporação sente o impacto. Quando dois, três ou mais o fazem, instala-se o risco de corrosão da credibilidade – e confiança perdida é difícil de recuperar.

Policiais que se corrompem colocam em risco mais do que suas próprias carreiras, comprometem a integridade de todo o sistema. Um agente que hoje se alia ao contrabando – atividade historicamente ligada ao crime organizado e ao financiamento de facções – pode amanhã se associar a delitos ainda mais graves. E quando essas “maçãs podres” não são identificadas e afastadas rapidamente, o prejuízo institucional se amplia: a população passa a desconfiar da capacidade do Estado de se proteger de dentro para fora. A sensação de impunidade alimenta a descrença no sistema de Justiça e fragiliza o combate ao crime.

O combate sério à criminalidade começa dentro da própria polícia. Antes de enfrentar quadrilhas nas ruas, é necessário ter a certeza de que ninguém dentro da corporação atua em sentido contrário, prestando serviço clandestino às mesmas organizações que se pretende combater. A depuração interna, quando bem conduzida, eleva o padrão ético da instituição, fortalece o controle e envia à sociedade a mensagem de que corrupção não será tolerada, venha de onde vier.

Em Mato Grosso do Sul, essa necessidade é ainda mais urgente. O Estado, que faz fronteira com a Bolívia e o Paraguai, é um dos principais corredores logísticos de organizações criminosas brasileiras. Do tráfico de drogas ao contrabando, passando pela circulação de armas e mercadorias ilegais, a pressão do crime organizado sobre servidores públicos é permanente. Isso exige das forças de segurança um trabalho redobrado de investigação interna, monitoramento de condutas, treinamento contínuo e políticas firmes de integridade.

É assim que se constrói segurança pública de verdade: com instituições que têm coragem de olhar para dentro, admitir falhas, responsabilizar culpados e preservar quem trabalha corretamente. A Polícia Federal, ao investigar policiais suspeitos de envolvimento com crimes de fronteira, reafirma esse compromisso. O caminho da depuração é duro, mas é o único capaz de garantir que as forças de segurança continuem sendo o que a sociedade espera delas: guardiãs da lei, e não cúmplices de quem a viola.

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ARTIGOS

Multar no trânsito é o suficiente?

Dados corroboram o pensamento de que dirigir pode ser estressante e até mesmo desafiador, principalmente se observarmos um contexto em que muitos buscam vantagem sobre o próximo

03/12/2025 07h45

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Dirigir é um ato de responsabilidade. Ter atenção ao volante e cuidados antes de pegar a estrada – como não ingerir bebidas alcoólicas, por exemplo – são parte do papel do motorista dentro da sociedade, apesar de extremamente necessárias.

Para além disso, a cordialidade e o respeito com os demais condutores são pilares para o cotidiano saudável nas vias. No entanto, o que se percebe é bem diferente.

Uma pesquisa divulgada em 2024 pelo Instituto Real Time Big Data, que analisou o comportamento dos brasileiros no trânsito, revelou que mais de 80% dos entrevistados já xingaram outros motoristas, enquanto quase 70% já realizaram gestos obscenos.

Os dados corroboram o pensamento de que dirigir pode ser estressante e até mesmo desafiador, principalmente se observarmos um contexto em que muitos buscam vantagem sobre o próximo.

Entre ofensas e irresponsabilidades, uma pergunta surge: multar é o suficiente? Para levantar o debate, o olhar deve ser direcionado primeiramente para o ponto de origem. Formar condutores não deve se limitar a preparar para o exame da CNH.

É essencial que o processo estimule a compreensão de que a melhor direção é a defensiva, fundamental para garantir segurança e respeito no dia a dia.

Somado a isso, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) garante que “o maior protege o menor”, de acordo com o artigo 29, parágrafo 2°. A base é precisa e ainda estabelece um limite entre os motoristas, que optam por ignorar a norma a fim de economizar segundos no tempo do trajeto. É em casos como esse que acidentes são flagrados diariamente e o egoísmo nas estradas fica escancarado.

Conectada ao individualismo, a imprudência recebe destaque. É comum telejornais noticiarem tragédias provocadas pela falta de responsabilidade, como acidentes envolvendo pessoas alcoolizadas ao volante e avanços do sinal vermelho.

O cenário, por mais que seja um forte exemplo de condutas que não devem ser seguidas, é rotineiro e, muitas vezes, fatal.

Levar a educação ao trânsito vai além da aplicação de simples multas. É preciso que o condutor compreenda seu papel dentro do convívio social e estabeleça o respeito pelo próximo mesmo que não esteja dirigindo – uma vez que um bom pedestre precede um motorista consciente.

A aplicação de multas nesse contexto é importante, mas corre o risco de ser apenas um paliativo dentro de tantas mudanças a serem feitas.

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