A defesa de Stephanie de Jesus Silva, mãe da menina Sophia Ocampo, 2 anos, e acusada de participação no assassinato da criança, sustenta a tese de que a acusada tem transtornos psiquiátricos e sofria de Síndrome de Estocolmo, além de afirmar que a mulher vivia em relacionamento abusivo e que esses problemas fazem com que ela tenha "prejuízo na capacidade de reação", culpando, desta forma, apenas o padrasto da menina, Christian Leitheim, pelo crime.
A afirmação e apresentação do diagnóstico foi feita pelo psicólogo forense Felipe de Martino Pousada Gomes, testemunha de defesa, durante júri do caso, realizado nesta quarta-feira (4), na 2ª Vara do Tribunal do Júri, em Campo Grande. Ele foi contratado pela própria defesa da acusada, sem remuneração, e realizou avaliações na modalidade telepresencial.
"Em resumo, eu coloquei hipóteses diagnósticas que puderam ser verificadas nesses exames e apresento algumas possibilidades dessas hipóteses, que é a Stephanie indicar transtornos de estresse pós-traumático, transtornos de ansiedade generalizada e episódios depressivos, além de apresentar sinais consistentes com a síndrome de Estocolmo, no contexto de um relacionamento abusivo", disse a testemunha.
"Esses problemas também dizem respeito a um estreitamento cognitivo, dissonâncias e prejuízos na capacidade de reação", acrescentou.
O psicológo afirmou ainda que o histórico familiar de Stephanie também influenciou nos transtornos, sendo supostas ausências paterna e materna, abusos sofridos na infância e violência doméstica em relacionamentos amorosos, que teriam "contribuído de modo significativo para uma vulnerabilidade emocional".
"Esse padrão de apego que se forma na infância, um apego inseguro, pode predispor os indivíduos a buscarem, na forma adulta, os relacionamento abusivos, não somente insconscientemente, como em parte consciente, acaba sendo uma predisposição", disse.
Além de afirmar que havia um relacionamento abusivo com Christian, a defesa também sustenta que Stephanie viveu o mesmo tipo de relacionamento com Jean Ocampo, pai de Sophia. Advogado que representa a acusada usou como exemplo o fato da jovem ter abandonado a faculdade para engravidar, afirmando que seria o sonho dele, e descobriu uma traição no puerpério.
Questionado, o psicológo afirmou que essas situações são características da síndrome de Estocolmo, no fato da pessoa colocar as vontades de outras pessoas a frente das próprias.
Seguindo na tese de que a acusada não agiu na capacidade total de suas faculdades mentais, a defesa afirma que o fato de ter sido abandonada por Jean contribuiu para que Stephanie "caísse nas garras" de Christian, alegando ainda que o rapaz tem um perfil narcisista e que houve "coação psicológica" por parte do padrasto da criança, que a teriam tornado uma pessoa suscetível e emocionalmente afetada.
Com relação aos abandonos, o psicológo respondeu que os padrões e traços já se formaram desde o início da história de vida de Stephanie, não apenas o relacionamento com Jean, mas também antes, que a tornaram uma pessoa suscetível e emocionalmente afetada.
Já no caso da suposta coação de Christian, a testemunha disse que no contexto de violência doméstica, há uma séria de fatores que dificultam a tomada de reação de sair da situação de violência e abuso.
"Na minha opinião, isso tem a mais a ver com uma formação da personalidade desde o início da vida, acumulando com outras experiências desta natureza, não somente essa, mas no quadro vital outras experiências de rupturas, de abandono, de perdas, de traumas, contribuindo para que ela fosse uma pessoa com uma reduçao maior na capacidade de confiar em si mesma, na autoestima, no senso que tem de resolver os próprios problemas", disse.
"É muito comum que as pessoas que passam por essa situação tenham dificuldade de identificar tais situações, porque há um fenêmeno que se chama dissonância cognitiva, mesmo verificando situações que acontecem, cognitivamente tem uma dificuldade de compreendê-los como uma forma de violência. Outro ponto que merece destaque é também um vínculo chamado de paradoxal com o agressor e de natureza patológica. No caso em questão, se identica uma situação extrema, não estamos falando de qualquer situação de violência e abuso, mas situações extremas, por isso existem dificuldades de identificação cognitiva da situação e outra situaçao da natureza de inibir reações, comum em vítimas de violência ter sua capacidade inibida de reagir", concluiu.
A acusação questionou o laudo, dizendo que seria necessária uma equipe multidisciplinar para dar o diagnósticodo pelo psicológo e apontou o fato do laudo ser elaborado após apenas três sessões de cinquenta minutos cada e sem detalhes das situações que caracterizariam os transtornos.
Avaliação
No depoimento, o psicólogo afirmou que trabalha com prestação de consultorias e pareceres técnicos dentro da área de psicologia e foi contratado pela defesa da acusada para fazer a avaliação.
Ele explicou ainda que o psicólogo forense é contratado como um consultor das partes para emitir um parecer técnico, enquanto o perito judicial atua dentro do processo judicial, sendo um profissional determinado judicialmente para fazer exames e laudos.
"No caso em questão, o foco foi fazer uma avaliação psicológica, para esta avaliação responder dúvidas que pudessem trazer esclarecimentos realacionado a possíveis diagnósticos, transtornos psicológicos e questões comportamentais com implicações para o caso", disse a testemunha.
As avaliações foram feitas de forma telepresencial, com o psicólogo no interior de São Paulo e a acusada no presídio, em Campo Grande, em sessões de 50 minutos cada.
Caso Sophia
Sophia morreu no dia 26 de janeiro de 2023. Ela foi levada pela mãe até uma unidade de saúde, onde foi constatado que ela já estava morta há cerca de 7 horas e com ferimentos que indicavam que ela foi agredida e abusada sexualmente.
A mãe só teria encaminhado a menina à Unidade de Pronto Atendimento aproximadamente sete horas após sua morte.
Antes de morrer, a criança deu 30 entradas em unidades de saúde devido à agressões que sofria.
Após o crime, a mãe e o padrasto ainda combinaram uma versão para dar à polícia.