O julgamento das quatro profissionais de saúde acusadas de colaborar para a realização de 25 abortos, na Clínica de Planejamento Familiar da médica Neide Mota Machado, pode ser o primeiro desta natureza no Brasil e ter duração recorde. Uma psicóloga e três enfermeiras são rés em júri popular, que acontece hoje, às 8h, no Fórum de Campo Grande. As acusadas haviam pedido o cancelamento do julgamento no Superior Tribunal de Justiça, o que foi negado ontem à tarde pelo ministro Félix Fisher. “Pelo número de pacientes que estiveram na clínica e, em tese, praticaram aborto, não conheço um processo com essa dimensão de pessoas”, afirmou o juiz da 2ª Vara do Tribunal do Júri, Aluízio Pereira dos Santos. O julgamento deve durar mais de 30 horas, conforme adiantou o juiz. Só os debates entre acusação e defesa levarão mais de nove horas. Ainda serão ouvidas oito testemunhas de defesa e haverá o julgamento de pelo menos 600 quesitos – perguntas feitas aos jurados, que devem responder entre sim e não. Além disso ainda serão apresentados dois vídeos – um pela acusação e outro pela defesa - antes que as explanações sejam iniciadas. O advogado de uma das acusadas, Renê Siufi, informou que não tem conhecimento de um julgamento desta natureza no Brasil. “Eu até acho muito estranho que, só agora, isso tenha aparecido. Todo mundo sabia, inclusive o Conselho Regional de Medicina e as autoridades”, protestou. O processo que levou as quatro profissionais a julgamento também incluía a médica Neide Mota Machado, proprietária da clínica. Porém, como a médica foi encontrada morta em novembro do ano passado, o nome dela deixou de fazer parte do processo. De acordo com o artigo 126, do Código Penal Brasileiro, provocar aborto em terceiras é crime e a pena pode chegar a quatro anos de prisão. A prática somente é permitida por lei caso seja feita por um médico, quando não há outra forma de salvar a gestante ou se a gravidez for resultado de estupro, conforme consta no artigo 128. Gestantes Pelo menos 700 mulheres já foram indiciadas por abortarem na Clínica. Segundo explicou o delegado Arante Fagundes Filho, atual responsável pelo cartório do 1º Distrito Policial, pelo menos 10 mil fichas de pacientes foram apreendidas na clínica. Após uma triagem, feita pelos investigadores da Polícia Civil, ficou constatado que em 1,2 mil dessas fichas existiam fortes indícios de que as pacientes haviam abortado. Outras fichas ainda foram descartadas, pois houve prescrição do crime. Conforme a lei determina, nestes casos o delito prescreve oito anos depois de ser cometido. O delegado espera finalizar todos os inquéritos (ainda falta concluir cerca de 500) nos próximos seis meses. O juiz da 2ª Vara do Tribunal do Júri, Aluízio Pereira dos Santos, informou que as mulheres que forem condenadas terão de cumprir algumas condições, como comparecer mensalmente ao fórum e apresentar- se em juízo sempre que se ausentarem da cidade por mais de 15 dias. (BG)