A “5ª Sinfonia de Beethoven”, a trilha de John Williams para “Star Wars”, músicas de Tom Jobim e Egberto Gismonti, todas elas têm algo em comum, que é, de certo modo, a popularização, em maior ou menor grau, do que é conhecido como música de orquestra. Além disso, promovem uma mistura de técnicas que envolve o estilo popular e o erudito.
Esse experimentalismo musical ganhou um novo estágio agora em 2022, e mais intenso em termos de alinhamento com o pop, a partir de projeto executado pela Nova Orquestra, formada por 35 músicos. Eles são do Programa Vale Música, e Mato Grosso do Sul está como protagonista nessa construção, com a presença de 10 músicos de Corumbá, Ladário, Campo Grande e da Bolívia (atuantes em MS).
A Nova Orquestra conseguiu rodar de norte a sul do Brasil, neste ano, com dois espetáculos, para provar que fronteira e idioma não existem na música. Além disso, reverberaram que estilos que podem parecer tão extremos dialogam e rendem muita emoção para quem está em teatros ou em áreas abertas adaptadas para os músicos tocarem.
CELEIRO MUSICAL
No primeiro semestre, houve apresentações de “Exagerado”, com direção artística de Éder Paolozzi, que levou sucessos de Cazuza para Rio de Janeiro (RJ), Vitória (ES), Belo Horizonte (MG) e Belém (PA), entre 5 e 10 de abril.
Neste segundo semestre, um novo experimentalismo foi apresentado, e a Nova Orquestra tocou sucessos da banda de rock pop Charlie Brown Jr. em “Dias de Luta, Dias de Glória”, com regência de Éder Paolozzi. No roteiro, houve uma parada em Mato Grosso do Sul, com show em Corumbá. Houve também apresentações no Rio de Janeiro, em Brasília (DF) e em São Luís (MA), entre 20 e 25 de outubro.
O destino Corumbá nessa rota serviu para garantir uma apresentação na casa de vários profissionais integrantes da Nova Orquestra. A Capital do Pantanal, por conta do projeto Moinho Cultural, tem construído um trabalho que é celeiro de músicos de orquestra.
A cidade já tem três formações em atuação, com a Orquestra de Câmara do Pantanal (com profissionais), a Orquestra Jovem e a Orquestra Base, as duas últimas para ajudar a fomentar novos nomes.
EVOLUÇÃO
Morador do Popular Nova, bairro da região alta de Corumbá, o violeiro e violonista Emanuel Teixeira tem acompanhado essa rota da música na região desde 2005. Ele foi um dos primeiros professores do Moinho Cultural e é integrante da Orquestra de Câmara do Pantanal e da Nova Orquestra, do projeto Vale Música.
Emanuel entende que a música segue um caminho de evolução, e que a mistura de estilos contribui para os ouvidos acostumarem-se a diferentes instrumentos.
“O tempo vai fazendo as coisas evoluírem de acordo com as demandas. Hoje, falando da Nova Orquestra, ela traz a proposta de sair do tradicional, sair do erudito e experimentar que instrumentos vistos como clássicos podem tocar outros estilos. No fim, tudo isso se torna um diferencial. Quem não é habituado a ouvir um instrumento clássico vai se aproximar quando ouvir algo sendo tocado com músicas pop”, observa Emanuel.
Ele mesmo foi influenciado nesse caminho de acréscimo de estilos e de gostos. Sua entrada na música ocorreu a partir da igreja e, nesse contexto, aprendeu a tocar violino de um modo muito diferente do que hoje ele domina. “Com a evolução musical, os sons foram ampliados. É muito maravilhoso”, diz o músico.
Para fazer jus a essa evolução musical, a Nova Orquestra, ao executar sucessos do pop com violinos, violas, celos, flautas, clarinetes, fagotes, trombones, trompetes e trompas, inseriu instrumentos para dialogar e materializar as apresentações para homenagear Cazuza e o grupo Charlie Brown Jr.
Nessa turnê do segundo semestre, a bateria e a guitarra fizeram parte do palco, com o baterista Jonas Cáffaro e o guitarrista Fábio Lima, que não são de Mato Grosso do Sul.
LUGAR DE DANÇA
Nessa mistura de percussão e instrumentos musicais elétricos, o que o espetáculo “Dias de Luta, Dias de Glória”, realizado em Corumbá e em outras três cidades em outubro, quis promover no público foi uma volta às origens do próprio termo “orquestra”.
Originada no grego, a palavra “orquestra” remete a “lugar de dança”.
E muita dança aconteceu nessas apresentações, inclusive com o regente Éder Paolozzi fazendo um convite para que o público apreciasse o som não passivamente nas cadeiras, mas na frente do palco, com danças e com as lanternas dos celulares ligadas, acompanhando os ritmos do palco.
VEIA SEM FRONTEIRAS
O trombonista corumbaense, da Nova Orquestra, Matheus Lucas Félix Magalhães, aponta que a experiência musical em Mato Grosso do Sul é grande, e Corumbá gera um interesse que vem sendo atendido aos poucos.
“Acho incrível uma orquestra que é do Rio de Janeiro vir para Corumbá, ter a troca de pessoas de diferentes partes do País. A gente tem que incentivar muito os alunos, mostrar que é música na veia, que a música é prazerosa, que é algo motivacional”, opina Magalhães, que também é professor do Moinho Cultural.
A experiência entre estilos e o intercâmbio musical são fontes de que Corumbá bebe e acaba sendo favorecida por conta da formação que o Moinho Cultural faz, envolvendo jovens brasileiros e bolivianos. A Nova Orquestra veio experimentar dessa mesma pluralidade e, neste ano, contou com dois músicos bolivianos atuantes em Corumbá.
“A música não tem fronteira nem limites. O idioma da música não importa, não tem problema a língua que você fala, na música o idioma é o mesmo para todo mundo”, traduz o violeiro Diego Alberto Anez. “A gente está muito feliz, é uma oportunidade, uma joia”, completou a violonista Melissa Lazo de Souza.
A violonista ladarense Flávia Sanchez, que foi aluna de Melissa Lazo no Moinho Cultural e hoje toca lado a lado com a ex-professora, sintetiza toda a glória que a mistura de erudito e pop quer gerar. “As pessoas podem se questionar sobre uma orquestra tocar Charlie Brown. A ideia é abrir a mente, a orquestra não precisa tocar só música clássica, pode tocar outros estilos”, provoca.