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ARTIGOS

Léa Garcia e a fragilidade do nosso patrimônio imaterial

Do ponto de vista antropológico, a trajetória de Léa é uma etnografia da resistência; mulher negra em um país estruturado pelo racismo, ela abriu caminhos em um território dominado por papéis estereotipados e pouco generosos às atrizes negras

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Poucos nomes no Brasil atravessam com tanta força as fronteiras da arte, da representatividade e da memória quanto o de Léa Garcia. Nascida em 1933, no Rio de Janeiro, e falecida em 2023, aos 90 anos, ela poderia hoje, com 95 ou 96 anos, estar ainda entre nós, ativa, lúcida e reconhecida como patrimônio vivo da nossa cultura.

Mas o que se percebe é que, mesmo diante de uma trajetória que rompeu barreiras históricas, a preservação da memória de Léa, e por extensão de tantos outros mestres e artistas negros, permanece frágil e marcada pelo esquecimento institucional.

Léa Garcia começou sua carreira no Teatro Experimental do Negro, ao lado de Abdias Nascimento, e logo brilhou em “Orfeu da Conceição”, de Vinicius de Moraes. No cinema, tornou-se referência internacional com “Orfeu Negro” (1957), obra vencedora do Oscar e da Palma de Ouro, pela qual recebeu indicação como melhor atriz em Cannes.

Na televisão, foi inesquecível como Rosa em “Escrava Isaura”, além de dezenas de outros papéis que atravessaram gerações. Ao longo da carreira, conquistou prêmios no Festival de Gramado e o respeito de públicos dentro e fora do Brasil.

Do ponto de vista antropológico, a trajetória de Léa é uma etnografia da resistência. Mulher negra em um país estruturado pelo racismo, ela abriu caminhos em um território dominado por papéis estereotipados e pouco generosos às atrizes negras.

Seu corpo em cena, sua voz e sua presença significaram mais do que atuações: foram afirmações políticas, marcas simbólicas de uma identidade coletiva que encontra na arte um espaço de reconhecimento.

Do ponto de vista da museologia, Léa Garcia é um patrimônio imaterial. Sua vida poderia ser pensada como um acervo vivo, capaz de articular teatro, cinema e televisão em torno de uma mesma narrativa: a luta pela visibilidade da mulher negra.

Mas esse acervo se dispersa, muitas vezes relegado a lembranças pessoais, reportagens ou prêmios isolados. A pergunta que se impõe é: onde estão as instituições que deveriam salvaguardar e musealizar uma trajetória como essa? Onde está o museu que resguarda seus figurinos, seus roteiros, suas entrevistas e sua memória oral como parte da história do Brasil?

Essa reflexão nos leva a um ponto crucial: o Brasil não é carente de heróis nem de personalidades talentosas que quebraram paradigmas. Nossa história está repleta de figuras como Léa Garcia, que transformaram contextos adversos em conquistas coletivas.

A atriz como Rosa da telenovela “Escrava Isaura” (1976/1977) - Foto / Divulgação

O que nos falta não são exemplos inspiradores, mas sim mecanismos sólidos de preservação da memória. O patrimônio imaterial, que deveria ser sustentado por políticas públicas e por instituições fortes, revela-se frágil, sujeito ao esquecimento e à perda. Cada vida como a de Léa Garcia deveria ser tratada como uma obra-prima da memória nacional, não apenas como lembrança episódica em datas de falecimento.

A ausência de um processo sistemático de preservação não diminui a grandeza dessas figuras, mas empobrece o País, que perde a chance de transmitir às próximas gerações a riqueza de sua própria história.

A trajetória de Léa nos obriga a discutir temas urgentes: museus e cinemas de memória negra, que ainda são raros; o legado pedagógico de sua obra, que poderia ser usado como instrumento de ensino nas escolas; e a enorme lacuna da presença negra nos currículos de artes e ciências sociais.

O Brasil também falha em criar prêmios retrospectivos que celebrem artistas negros em vida, preferindo uma homenagem póstuma e fragmentada.

O resultado é uma museologia seletiva, que exibe a contribuição da matriz africana e dos povos originários em papéis coadjuvantes, sem jamais confrontar de frente a versão colonizada da história do Brasil, aquela que ainda insiste em se narrar a partir de padrões estéticos e intelectuais europeus.

A museologia crítica nos mostra que a contribuição negra e indígena não deve ser adorno, mas núcleo central da narrativa histórica. Ao invisibilizar essa centralidade, reforçamos a desigualdade simbólica que ecoa na sociedade.

Essa leitura pode ser aprofundada por diferentes autores. Abdias Nascimento nos lembra do Teatro Experimental do Negro, berço da afirmação identitária e política que moldou Léa.

Homi Bhabha fala do “entre-lugar”, e Léa viveu justamente essa intersecção: reconhecida internacionalmente em Cannes e no Oscar, mas invisibilizada estruturalmente no Brasil. Paul Gilroy, com seu conceito de Atlântico Negro, permite lê-la como figura que circula entre o Brasil, a diáspora e o mundo, traduzindo em sua arte essa condição transnacional.

E também as cosmologias afro-brasileiras, como o Povo de Jeoroi, lembram que toda trajetória negra carrega dimensões espirituais, ancestrais e coletivas, que ultrapassam o indivíduo e se transformam em herança simbólica.

A museologia contemporânea já nos ensina que preservar não é apenas guardar objetos, mas registrar trajetórias, dar espaço a narrativas de grupos marginalizados e reconhecer no presente o que deve ser legado ao futuro. Se Léa Garcia tivesse nascido em outro país, possivelmente já teria um museu, um centro cultural ou um arquivo dedicado à sua obra.

No Brasil, seguimos dependentes da memória frágil, dispersa, de iniciativas isoladas. Por isso, falar de Léa Garcia hoje é também falar de nós mesmos. É um convite para que repensemos nossas prioridades culturais, para que não deixemos que a grandeza de nossas personalidades se perca. Porque preservar Léa é preservar o Brasil.

Já passou da hora de nos darmos conta de que as escolhas sobre o que é lembrado ou esquecido passam pelo comando das pastas governamentais, pois são aqueles que dirigem os mecanismos estatais de preservação do patrimônio que decidem, queira-se ou não, o que será memória e o que será silêncio.

Enquanto a gestão cultural se limitar a viver apenas o presente, confundindo cultura com entretenimento e recusando olhar pelo retrovisor, a identidade do nosso povo seguirá se desfazendo diante dos nossos olhos.

Correio B

Exposição literária destaca identidade cultural de MS

Mostra dará destaque às obras de Manoel de Barros, Hélio Serejo e Maria da Glória Sá Rosa

04/12/2025 18h00

Divulgação

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Será inaugurada amanhã (5) a exposição “Literatura Regional de MS: Pantanal, Prosa e Poesia” que promete explorar a essência, a estética e as  influências que moldam a escrita sul-mato-grossense. Montada na “Gibiteca Mais Cultura”, a mostra permanecerá aberta ao público até abril de 2026.

Os grandes destaques da exposição são Manoel de Barros, cuja poesia reinventou o olhar sobre o Pantanal; de Hélio Serejo, cronista das tradições e histórias de fronteira; e Maria da Glória Sá Rosa, referência na pesquisa e crítica literária.  

Outro destaque da exposição é o eixo temático que aborda os fluxos migratórios e suas contribuições para a formação sociocultural do estado. A presença japonesa, síria, libanesa e indígena será apresentada como elemento fundamental na constituição das narrativas e das linguagens literárias consolidadas ao longo do tempo.

O público poderá conhecer como essas influências moldaram costumes, expressões artísticas e modos de viver que se refletem na literatura regional.

O espaço físico da mostra será ornamentado com elementos visuais inspirados no Pantanal, entre eles a icônica imagem do carro de boi atravessando as águas, símbolo da narrativa e da memória afetiva do estado.

O projeto é realizado com recursos da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), Política Nacional Cultura Viva (PNCV), Sistema Nacional de Cultura (SNC), do Governo Federal, através do Ministério da Cultura (Minc), operacionalizado pelo Governo de Mato Grosso do Sul, por meio da Fundação de Cultura de MS.

SERVIÇO

Exposição: Literatura Regional de MS: Pantanal, Prosa e Poesia
Abertura: 5 de dezembro de 2025 (sexta-feira)
Horário: 9h
Local: Rua Sacramento, 800 – Bairro Seminário, Campo Grande (MS)
Período de visitação: Dezembro de 2025 a abril de 2026
Agendamento de visitas: pelo telefone (67) 3365-0405 ou pelo WhasApp (67) 99115-0283
 

pagonejo bão

Alexandre Pires traz show da nova turnê para Campo Grande em 2026

O cantor é o único brasileiro na lista dos 100 maiores artistas latinos do século 21 da Billboard e apresentará show inédito na Capital

04/12/2025 15h00

Alexandre Pires fará show em Campo Grande em agosto de 2026

Alexandre Pires fará show em Campo Grande em agosto de 2026 Foto: Divulgação

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O cantor Alexandre Pires, único brasileiro na lista dos 100 maiores artistas latinos do século 21 pela Billboard, fará show da nova turnê 'Pagonejo Bão' em Campo Grande, em agosto do ano que vem.

A apresentação será no dia 1º de agosto de 2026, no Bosque Expo.

Alexandre Pires é reconhecido tanto no Brasil como internacionalmente, com discografia em espanhol e português. Esse histórico soma-se às suas turnês nacionais e participações em grandes eventos.

Na nova turnê, o cantor transcende a barreira de estilos musicais, unindo dois ritmos populares no Brasil, sendo o pagode e o sertanejo.

O projeto Pagonejo Bão nasceu na ideia de aproximar dois universos da música popular brasileira em uma apresentação dinâmica, calorosa e dançante. 

Assinantes do Correio do Estado tem até 50 % de desconto nas atrações do Pedro Silva. ASSINE AGORA.

No palco, Alexandre Pires revisita clássicos que marcaram sua trajetória, tanto do período à frente do grupo Só Pra Contrariar quanto da carreira solo, além de interpretações em dueto com nomes contemporâneos e arranjos que valorizam voz e violão, percussão e instrumentação acústica típica do gênero sertanejo.

O projeto foi gravado ao vivo em 2025 em datas especiais e já ganhou registros em áudio e vídeo. 

No show, Alexandre Pires mistura os maiores sucessos do pagode com o espírito do sertanejo, reunindo repertório romântico, swing e novas interpretações ao vivo.

"Pagonejo Bão é um projeto de coração: é resgatar memórias, mostrar que música boa atravessa estilos e celebrar o público que canta comigo há décadas”, disse Alexandre Pires.

No repertório, o cantor deve apesentar sucessos do Só Pra Contrariar, como Domingo, Essa Tal Liberdade e Mineirinho, além de clássicos do sertanejo, como Evidências, Pense em Mim e É o Amor.

Serviço

Data: 1º de agosto de 2026
Abertura das portas: 20h
Início do show: 22h
Local do show: Bosque Expo
Valores: serão divulgados em breve
Onde comprar: Stand Comper Jardim dos Estados; pela internet no site www.pedrosilvapromocoes.com.br.
Classificação: 18 anos
Realização: Pedro Silva Promoções & Jamelão

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