A Globo sempre utilizou a faixa das sete para cometer algumas ousadias. A tática de renovar um pouco o estilo de sua dramaturgia nem sempre dá muito certo. Então, é preciso voltar ao básico. “Verão 90” foi o projeto perfeito para a emissora retornar à zona de conforto do horário, ainda mais depois de duas tramas com audiência aquém do esperado: “Deus Salve o Rei” e “O Tempo Não Pára”. A primeira foi uma tentativa de “surfar” no sucesso de produções épicas como “Game of Thrones”, a segunda se inspirou em temas como criogenia e preservação ambiental. Ambas não conseguiram passar dos 26 pontos de audiência e a saída foi fazer uma novela das sete que honrasse o horário. Além do surgimento de uma nova dupla de autoras, Izabel de Oliveira e Paula Amaral, a novela marcou a volta de Jorge Fernando aos Estúdios Globo, depois de dois anos afastado para cuidar de seus problemas de saúde. Concebida como uma grande homenagem à década que dá título ao folhetim, a produção realmente foi farta em referências para o bem e para o mal.
O fato de ter a assinatura de Jorge Fernando, diretor de clássicos do período como “Rainha da Sucata” e “A Próxima Vítima”, já garantiu algum respaldo a “Verão 90”, algo ainda mais evidenciado pela presença de nomes como Claudia Raia e Humberto Martins no elenco. No entanto, apesar das boas ideias, próximo do final da trama já é possível saber o que deu certo ou não na atual novela das sete. A aposta em Jesuíta Barbosa como principal vilão da novela foi um grande acerto. Cheio de recursos, o ator brilhou na pele do irmão mais ambicioso da família Guerreiro. Entretanto, o arco dramático do personagem acabou por fazer Jesuíta se repetir muito em cena. A verdade é que mesmo com uma grande base de temas, a dupla de autoras não conseguiu driblar as eventuais “enrolações” que acontecem em qualquer produção. Sendo assim, a novela foi um show de cenas similares de brigas, prisões, discussões e armadilhas. O casal principal da trama também passou por diversos momentos semelhantes ao longo dos capítulos. Carismáticos, João e Manuzita, de Rafael Vitti e Isabelle Drummond, só não foram apagados pelos outros pares da trama porque conseguiram crescer em cena após um início extremamente infantilizado.
Aliás, de olho em um possível público mais jovem, a novela demorou a encontrar seu tom. Inicialmente, parecia mais uma trama urbana das seis do que um folhetim das 19 h. Aos poucos, a história não só ganhou estofo a partir dos bons momentos dramáticos de Janaína, de Dira Paes, como também teve mais investimento em sua estética, com uma visível melhoria em cenários e acabamento das sequências. Entre as referências temporais, “Verão 90” acabou por tratar as trapalhadas do governo de Fernando Collor sem grande profundidade. E com cenas de gosto muito duvidoso, divertiu evocando o sucesso da lambada e a visita da cantora Madonna ao Brasil, em 1993. O destaque mesmo fica por conta da introdução da telefonia móvel no país, evidenciando o caráter elitista e as configurações limitadas dos aparelhos aos olhos de hoje. Fechando sua audiência em torno de satisfatórios 28 pontos no Ibope, “Verão 90” deixa a sensação de que poderia ter explorado melhor sua década, mas cumpriu sua missão de fazer a faixa das sete voltar a ter repercussão.