Estudante na Escola Municipal Nerone Maiolino, que fica localizada no bairro Vida Nova, um aluno autista voltou a ser alvo de maus tratos nessa unidade, com a própria mãe abrindo boletim de ocorrência após viver a "última gota d'água" quando buscou seu filho com hematoma de corte após uma série de marcas e relatos de exclusão durante todo o ano letivo.
Como narra Ana Paula Aparecida Pereira, mãe do adolescente Yan Gabriel de apenas treze anos, diagnosticado com Transtorno de Espectro Autista nível 3, o aluno estuda há anos na escola Nerone Maiolino.
Estudante no período matutino, a mãe conta que ao buscar o filho na escola, Yan teria indicado à mãe que a professora o teria agredido, verificando sinais de arranhões e marcas de unha na pele do filho.
Vivendo o que chama de "saga da mãe atípica", Ana diz que segue em luta e não é a primeira vez durante esse ano letivo que seu filho aparece com marcas na região do braço, que ela aponta ser compatível com hematomas de quem foi segurado à força ou puxado.
"Meu filho é privado às vezes de um recreio, de uma convivência maior, não participa das coisas e apresentações... Eles pegam, quando vai fazer uma atividade, vai lá e tira três, quatro, meia dúzia de fotos para dizer que o Yan participou e já retira ele também", relata.
Ao Correio do Estado, a genitora detalhou que no dia que percebeu a violência só saiu da escola após acionar a polícia, registrando um boletim de ocorrência de maus tratos qualificado, uma vez que o crime teria sido praticado contra pessoa menor de 14 anos.
"Meu telefone não estava conseguindo fazer ligação, eu pedi um na escola, ninguém me arrumou nem sequer um celular, nem da escola. Com muito custo, eu consegui ligar e só sair de lá com a polícia, porque se eu tivesse ido pra minha casa, a conversa ia ser outra", cita.
Segundo a mãe, o medo nesse momento era que, caso não registrasse de imediato o ocorrido, a unidade poderia alegar que o ferimento havia acontecido em casa.
"Porque a polícia é testemunha também que eu estava saindo da escola com meu filho daquele jeito. Aí, segui todos os trâmites. Delegacia, Corpo Delito, Conselho... para ver se esse quadro muda a minha esperança", confessa.
Violência e maus tratos
Ana Paula expõe que, muitas mães atípicas às vezes não encontram forças para levar em frente as agressões que seus filhos sofrem, mas teme que esses episódios evoluam e algo mais grave aconteça.
"Hoje é um arranhão, amanhã falta um dente, depois é um empurrão que pode lançar a cabeça do meu filho contra o solo... Eu temo pela vida do meu filho nessa escola. Tenho medo de uma hora quererem matar o Yan, mas tenho que levá-lo na escola", diz.
Feito o exame de corpo de delito, a mãe destaca que a própria médica legista confirmou que nesse caso o ferimento era compatível com cortes provocados por unhas.
Já junto ao Conselho Tutelar, Ana foi orientada de que o órgão buscaria um parecer da diretora, mas comenta o temor de que a unidade escolar apenas conte uma "história triste" e uma "desculpa esfarrapada" sem que as coisas mudem de fato.
"Não é de hoje que eu pego meu filho com marcas, ele é autista não verbal e disseram que meu filho fala palavrão na escola, sendo que ele não fala nem mãe. Eles não tem argumento... 'ah, o guri estava agitado e segurei o braço dele', segurar é uma coisa, cravar a unha é outra", diz.
Enquanto mãe, ela conta que a escola já chegou a sugerir que uma professora ministrasse aulas para Yan em casa, o que ela diz que não irá aceitar uma vez que esse é o desejo da escola.
"Não vou tirar o Yan dessa escola, é isso que eles querem, que eu desista, que eu fale que não vou trazer mais, não querem ele na escola. Falei não! Ele vai na escola, vai brincar, porque se eu receber a professora duas vezes na semana na minha casa, cadê a proposta pedagógica? Cadê a tal da inclusão? Ele não é igual a todos, por quê tem que ir para casa?", questiona.
Através do setor de comunicação da Prefeitura de Campo Grande, a Secretaria Municipal de Educação (Semed) foi procurada para prestar esclarecimentos, bem como evidenciar a posição da Escola e do corpo responsável pela unidade, porém, até o fechamento da matéria não foi obtido retorno.
Problemas há tempos
Há aproximadamente dois anos, na mesma Escola Municipal Nerone Maiolino, Yan já havia sido alvo de maus-tratos e falta de cuidados diante da ausência de assistente educacional inclusivo.
De marcas de unha pelo corpo; não deixar a criança brincar no intervalo; encontrar o filho trancado no banheiro com a professora e até todo defecado, as reclamações se acumulam.
Entre 2022 e 2023, a Rede Municipal de Ensino registrou um salto de 3,2 mil alunos com algum tipo de deficiência para mais de quatro mil estudantes entre um ano letivo e outro.
Porém, no que diz respeito ao total de alunos autistas no período, nota-se uma redução de 1,4 mil estudantes diagnosticados com TEA em 2022 para 1.277 em 2023.
Na época, a saga por uma educação de qualidade teve um triste episódio de descaso, quando Ana encontrou seu filho todo defecado ao buscar a criança na escola.
"Fui pegar meu filho e ele estava todo 'cagado', com fezes até no cabelo, na orelha. Eles tentaram limpar meu filho, trocaram ele com a roupa que mando na mochila, mas o despreparo é nítido", comentou.
Sobre o episódio de encontrar o filho defecado, através da Semed, a direção da unidade escolar justificou à época que a situação aconteceu próximo ao horário da saída, e o aluno foi levado para o banheiro, momento em que a mãe chegou para buscá-lo, conforme o texto.
Ainda, a nota da Semed aponta que: "conforme relatado pela escola, a professora estava acompanhada de outra profissional que a auxiliava no momento em que realizava a higiene do aluno".
"É a coisa mais triste você ir buscar seu filho na escola e ele todo cheio de merd*. Disseram que deram um banho, porque eu mando roupa reserva, mas que ele tinha feito na sala e foi tirando a roupa, pisando em tudo. Pelo que eu sou mãe eu sei, ficou muito tempo com as fezes e ele começou a enfiar a mão na roupa e jogar para fora, a ficar nervoso e pisotear. Já fui pegar meu filho até ensanguentado, tem uma marca na testa que derrubaram ele e não sei nem como. E eu tive que me virar, para levar no posto, no médico, tem a cicatriz até hoje", conclui a mãe.


Mato Grosso do Sul está em alerta para tempestades (Reprodução / Inmet)


