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O alerta que vem dos pulmões: o avanço da síndrome respiratória aguda grave em MS

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Nos últimos meses, Mato Grosso do Sul tem enfrentado uma escalada preocupante nos casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG). O que antes era uma condição mais comum em períodos específicos de sazonalidade viral, agora se apresenta como uma ameaça crescente à saúde pública, pressionando hospitais, afetando principalmente as crianças e levantando uma pergunta urgente: por que estamos retrocedendo?

Segundo dados da Secretaria de Estado de Saúde, só até abril de 2025, já foram notificados 1.755 casos de SRAG e 119 mortes em todo o Estado. Em Campo Grande, a situação é tão crítica que a prefeitura decretou estado de emergência. Unidades de saúde estão superlotadas e há relatos de desassistência em função da demanda crescente.

Há um fator silencioso, mas decisivo, por trás desses números: a queda na cobertura vacinal. O Brasil, que já foi referência mundial em imunização, enfrenta desde 2016 uma preocupante redução nas taxas de vacinação, especialmente entre crianças. Em 2023, mais de 60% dos municípios brasileiros não atingiram a meta de 95% de cobertura vacinal recomendada pelo Ministério da Saúde. Em Mato Grosso do Sul, a adesão à campanha contra a influenza, por exemplo, não chegou a um terço da população-alvo.

Essa falha coletiva de proteção deixa um terreno fértil para a circulação de vírus como a influenza, o vírus sincicial respiratório (VSR) e o rinovírus, que hoje são os principais causadores dos quadros graves de SRAG no Estado. A consequência direta é o aumento de internações, a sobrecarga do sistema e, tragicamente, a morte evitável de pacientes vulneráveis – muitos deles, crianças entre 1 ano e 4 anos.

No entanto, a baixa vacinação não é o único fator que contribui para o agravamento da situação. Outros elementos agravam esse cenário:

1. Circulação simultânea de múltiplos vírus respiratórios: influenza A e B, VSR, rinovírus e Sars-CoV-2 têm convivido nos mesmos períodos, ampliando a gravidade clínica e o número de infecções;
2. Redução da imunidade natural: o isolamento da pandemia reduziu a exposição natural a vírus, especialmente em crianças. Agora, sem imunidade prévia e sem vacina, enfrentam infecções mais severas;
3. Condições climáticas desfavoráveis: oscilações bruscas de temperatura e aumento da umidade favorecem a propagação viral e complicações respiratórias;
4. Superlotação em espaços públicos e instituições: escolas, creches, hospitais e transportes públicos voltaram a ser ambientes de fácil disseminação de agentes infecciosos;
5. Desinformação e hesitação vacinal: a influência de fake news e as teorias negacionistas têm gerado medo e resistência, atrasando a imunização em massa;
6. Fragilidade na Atenção Básica: a falta de estrutura e recursos em muitas unidades de saúde dificulta o atendimento precoce e eficiente;
7. Aumento das comorbidades: o crescimento de doenças como obesidade, asma, diabetes e hipertensão agrava o quadro clínico dos infectados.

O cenário exige respostas firmes e coordenadas. A vacinação, além de segura e gratuita, é a principal barreira contra o agravamento das infecções respiratórias. Precisamos recuperar a confiança da população nos imunizantes, combater a desinformação e retomar campanhas de vacinação massivas, com estratégias que alcancem desde centros urbanos até os rincões do Estado.

Negligenciar a vacinação é abrir espaço para o retorno de doenças que já estavam sob controle. O que está em jogo não é apenas a saúde individual, mas o pacto coletivo que sustenta nosso sistema de proteção social.
É hora de agir com responsabilidade, empatia e firmeza. O pulmão de Mato Grosso do Sul pede socorro – e a resposta começa com a vacinação.

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Editorial

O leito que falta: um problema de todos

O leito que falta hoje pode ser o de qualquer um de nós amanhã. E, nesse ponto, o problema deixa de ser só do outro: é, e sempre foi, um problema de todos

17/05/2025 07h15

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É triste constatar que, em pleno 2025, Mato Grosso do Sul ainda não apresenta projetos consistentes para enfrentar a crescente escassez de leitos hospitalares na rede pública. Mais preocupante do que a ausência de iniciativas é a aparente indiferença de parte dos gestores públicos diante de um problema que, cedo ou tarde, afetará diretamente toda a população, inclusive quem hoje acredita estar protegido por planos de saúde privados.

A raiz da crise é complexa, mas há fatores evidentes e evitáveis. A baixa capacidade de investimento dos entes públicos tem um papel central, sem dúvida, mas não se pode ignorar o impacto desastroso da forma como são utilizadas as emendas parlamentares no orçamento da União. A lógica paroquial, que transforma recursos públicos em moedas de troca para atender interesses eleitorais locais, é corrosiva. Em vez de investimentos estruturantes na saúde, como a abertura de novos leitos hospitalares, o dinheiro é pulverizado em pequenas obras, compra de tratores ou projetos sem descrição clara. Atende-se a poucos, e mal.

Essa fragmentação do Orçamento revela uma distorção grave na nossa democracia representativa: a prioridade deixou de ser o bem público e passou a ser a manutenção de currais eleitorais. Enquanto isso, problemas estruturais se acumulam, sem resposta adequada. A saúde pública sente esse impacto de maneira particularmente dura. A cada novo surto, crise sanitária ou aumento de demanda, o sistema entra em colapso – não por falta de profissionais ou de capacidade técnica, mas por pura ausência de leitos disponíveis.

Campo Grande, a capital do Estado, é um retrato fiel dessa negligência. A reportagem que segue nesta edição revela o que aqueles que dependem do SUS já sabem de cor: há filas para internações, pacientes aguardando vagas em prontos-socorros superlotados e famílias angustiadas com a falta de uma estrutura minimamente adequada. E o pior: mesmo em um cenário tão crítico, as autoridades parecem pouco mobilizadas para reverter a situação.

A lógica do clientelismo que se impôs sobre a política brasileira cobra seu preço. Em vez de técnicos capacitados e compromissados com o planejamento de longo prazo, temos apadrinhados políticos ocupando cargos estratégicos. Em vez de projetos estruturantes, temos soluções paliativas – quando muito. Em vez de visão de Estado, temos cálculos eleitorais. O resultado é a perpetuação de problemas como a falta de leitos hospitalares, que compromete a vida e a dignidade de milhares de cidadãos.

É urgente que o debate sobre emendas parlamentares ganhe centralidade no debate público. O Brasil precisa rever profundamente a forma como distribui e fiscaliza o uso desses recursos. Não se trata de eliminar o instrumento, mas de transformá-lo em ferramenta de desenvolvimento real e equitativo. A saúde deve ser prioridade, e isso precisa estar refletido em cada decisão orçamentária.

É uma pena que, enquanto isso não acontece, o cidadão comum continue enfrentando corredores lotados, espera indefinida e sofrimento evitável. O leito que falta hoje pode ser o de qualquer um de nós amanhã. E, nesse ponto, o problema deixa de ser só do outro: é, e sempre foi, um problema de todos.

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Hierarquia em postos de trabalho: lutas e dilemas

16/05/2025 07h45

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As responsabilidades dos postos de trabalho são diversas e complexas e respondem a uma hierarquia estrutural das empresas. Recentemente, fiz mais uma entrevista em uma organização para uma vaga disponível e, mais uma vez, ofereceram-me uma colocação que não tinha nada a ver com a minha formação e experiência profissional. Era um posto de assistente administrativo, para atender, no balcão, as pessoas que necessitam de encaminhamento e orientação. Sendo psicóloga de formação, com pós-graduação em Psicoterapia de Orientação Analítica, encerrando mais uma em transtorno do espectro autista (TEA), e professora de Libras, me assustei com a completa invisibilidade do meu currículo para a empresa.

Para revidar esta proposta, perguntei à pessoa que estava me entrevistando se não havia uma vaga para a área de Psicologia. Percebi que o que eu estava perguntando era irreal para a empresa, porque este posto não é, em geral, ofertado para pessoas com deficiência (PCDs). Ainda que eu sonhe com esse posto, o mercado de trabalho não reserva esse espaço para mim. Existe somente uma compreensão: as organizações só empregam PCDs em razão da Lei de Cotas, artigo 93 da Lei nº 8.213/91, porém, não garantem a inclusão nem minimizam as discriminações.

Ter algum tipo de deficiência não pode anular a capacidade e as habilidades dos profissionais. Como podemos mostrar isso para a sociedade? Como podemos nos empoderar para enfrentarmos essas barreiras?

As dificuldades e os empecilhos da aceitação social da diversidade são marcas que vieram com a escravidão portuguesa, com as propagandas de governos sobre o branqueamento da população e com o apagamento de classes desfavorecidas. Os preconceitos se multiplicaram durante mais de dois séculos, e nos encontramos diante de uma batalha de titãs. Não podemos esmorecer. Temos de nos fortalecer por meio de cursos de formação, da divulgação de textos, de fazer com que as leis sejam cumpridas, criando associações, grupos de trabalho, grupos de estudos, entre outras atividades que possam nos legitimar como grupo social.

Podemos criar projetos e planos de carreira para desmantelar essa cultura empresarial de rejeitar a troca de saberes e conhecimentos na hierarquia dos postos de trabalho. Precisamos também garantir nosso lugar, para que possamos nos desenvolver e conseguir crescer junto com os demais funcionários. Não falo sozinha, pois, sempre que discuto com meus colegas nas redes sociais, vejo que eles e elas também se manifestam nesse sentido de não lhes darem oportunidade de avançar em suas carreiras profissionais.

Apesar de estarmos tão avançados nos meios de comunicação e nas tecnologias da informação, parece que os preconceitos não caminham paralelamente. Pelo contrário, parece que se acentuam. Ainda que aceitemos os tratamentos indevidos pelas empresas, precisamos combater as indiferenças, as humilhações e as dificuldades de relacionamento para alcançarmos vagas de trabalho condizentes com nossa formação e experiência profissional.

Menciono aqui as pessoas com autismo, que podem e devem trabalhar, pois sofrem de uma condição que não pode ser vista como uma deficiência. Trata-se de um transtorno do neurodesenvolvimento do indivíduo que interfere na capacidade de interação social, linguagem, comunicação e comportamento e que pode ser tratado por meio de terapias.

Atualmente, temos muitos diagnósticos de TEA tardios, pois o transtorno inclui uma variedade de características, mas, com acompanhamento especializado, são pessoas e profissionais capacitados para estudar e trabalhar.

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