A denúncia entregue pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul à Justiça sobre o furto de quase 100 quilos de cocaína de dentro do 1º DP de Aquidauana complicou de vez a situação do então delegado titular do local, Eder Oliveira Moraes, preso pelo crime. Em escutas telefônicas grampeadas de conversas dele com a advogada Mary Stella Martins de Oliveira, outra acusada do caso, ele sugeriu "interceptar" carro com promotores que cumpriram mandados de busca e apreensão na cidade e na casa dela. Para o MPE, o plano era de matar os servidores do judiciário se isso servisse para impedir que se descobrisse sua participação no caso.
A conversa que veio à tona aconteceu em 11 de junho, após o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) entrar no caso junto da Corregedoria da Polícia Civil. Na ocasião, estava em suspeita a participação de Mary Stella no caso. E foi feita uma busca em sua e escritório particular.
No mesmo dia, segundo os autor na Justiça, Moraes comprou um novo chip de celular para conversar com a cúmpllice.
Segundo a transcrição da conversa, o tom foi duro. Para não descobrirem sua participação no caso, o delegado sugeriu que o veículo do MPE fosse "interceptado" na BR-262 antes que chegasse em Campo Grande.
O entendimento dos promotores é que a quadrilha faria de tudo, inclusive matar os ocupantes do veículo, para reaver as provas, principalmente um dos celulares da advogada por onde os dois conversavam. A ideia foi refutada por ela.
DETALHES
Ainda de acordo com a denúncia, o MPE apontou que Moraes deixou destrancada a janela da sala onde ficou a carga de cocaína de propósito, para facilitar o acesso dos contratados ao local.
Os 101,1 quilos de cocaína foram apreendidos pela Polícia Rodoviária Federal no dia 30 de maio. A droga teria como destino São Paulo (SP). O primeiro contato do delegado com a advogada para organizar o furto aconteceu no dia 3 de junho.
Segundo a denúncia, a imensa quantidade de droga, de qualidade pura, disponível sob seus cuidados, despertou a cobiça de Moraes. Na organização do crime, o delegado e Ronaldo Alves de Oliveira, marido de Mary Stella, calcularam que poderia ganhar até R$ 25 mil por quilo.
Ainda de acordo com a denúncia, o delegado indiciou o trajeto dos contratados para o serviço fazerem até a sala, não só quebrando a tranca interna da janela e deixando a do banheiro aberta, como deixando luzes acessas e apagadas de forma estratégica.
O CASO
A Corregedoria da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul descobriu que o furto de quase 100 quilos de cocaína de dentro do 1º DP de Aquidauana foi o estopim de um esquema de corrupção policial que vai além da negociação de drogas e outros itens apreendidos pelos investigadores: extorsão e venda da liberdade de presos pelo antigo delegado titular do local, Éder de Oliveira Moraes.
O Correio do Estado apurou que há pelo menos três anos Moraes, preso desde o dia 24 de junho, atuava em parceria com a a advogada Mary Stella Martins de Oliveira, outra detida pela Corregedoria no caso do furto da cocaína.
O acordo era claro: no início, presos de menor potencial ofensivo, como devedores de pensão e portadores de pequena quantidade de droga, eram extorquidos pelo delegado, que exigia pagamento de uma quantia para liberá-los sem registro da ocorrência.
Com o tempo, Mary se envolveu com Moraes e acusados presos por crimes de maior potencial, como roubos e tráfico, tinham a advogada recomendadapara fazer sua defesa. Novamente não se era feito o registro oficial dos procedimentos policiais. E a dupla dividia entre si a propina paga.
Nas investigações da Corregedoria, houve a apreensão de celulares e autorização de acesso a dados dos telefones dos dois, que ligaram o envolvimento do delegado, a advogada e seu marido, mais um dos detidos pelo caso, que já havia sido preso com 200 quilos de cocaína no interior de São Paulo e, em 2012, foi preso com 900 quilos de maconha no Estado.
Moraes é policial há 19 anos e já trabalhou nas delegacias de Rio Negro, Juti e Rio Verde. Ele estava há quatro anos como delegado em Aquidauana. Desde fevereiro a suspeita da relação dele com a advogada fez com que o Gaeco investigasse seus passos.
Mary, por outro lado, foi ex-procuradora jurídica da prefeitura de Aquidauana. Em 2010 foi condenada a três anos e seis meses de detenção por contratar, sem licitação, dois advogados para representar o município em um ação contra a Receita Federal.
A própria denúncia feita pelo MPE aponta como improvável não só a recuperação da droga, como a identificação dos compradores. Dois deles, identificados em extratos bancários da advogada, tiveram o pedido de prisão recusado pela Justiça.
O delegado foi denunciado por peculato e Lei de Drogas (concorreu para que outrem trouxesse consigo, transportasse, guardasse, vendesse e fornecesse drogas, sem autorização e em desacordo com a lei).
Além dele e do casal, outras cinco pessoas foram acusadas formalmente.