O primeiro paciente em Mato Grosso do Sul a ser entubado em 2020, contaminado pela Covid-19, saiu do hospital para incorporar o 'Bom Velhinho'
Certamente, há alguns anos, se alguém comentasse ao fotógrafo e cinegrafista Edgar das Neves Pereira, de 55 anos, que ele seria o Bom Velhinho, isso geraria boas risadas.
Embora possua várias referências como “Neves” no sobrenome e o fato de ter nascido no dia 25 de dezembro, curiosamente, o destino deu a pista de que ele veio ao mundo para representar o Bom Velhinho.
"Nunca tive intenção de ser o Papai Noel, sabe? Nem gostava muito. Acho que isso talvez tenha vindo da época em que era criança e tinha aquela imagem de ganhar apenas um presente. Na verdade, isso aconteceu a convite de um amigo, que me emprestou a roupa. Mas nunca tinha pensado nisso, nunca tinha querido ser o Papai Noel."
O campo-grandense lembra, de quando era criança, como muitas pessoas nascidas no final do ano, que não gostava. A única festa de aniversário feita pela mãe foi quando Edgar tinha apenas 1 ano. Ou seja, ele não lembra da comemoração.
"Olha, para uma criança não é bom fazer aniversário no dia 25 de dezembro, primeiro porque ela só ganha um presente, né? Em casa somos seis irmãos e só eu ganhava um presente. Meus irmãos ganhavam no dia do aniversário deles e depois do Natal. E eu não tinha festa de aniversário nem que fosse um bolo, porque 25 de dezembro é Natal, é aquela comemoração, então assim era chato", contou Edgar.
A surpresa veio por volta dos 30 anos de idade, quando a professora Deanie Ortiz Pereira, esposa de Edgar, compensou a falta de comemorações adequadas ao organizar com os amigos da igreja a tão esperada festa de aniversário.
“Me vendaram, cheguei lá, todo mundo com balão e chapéuzinho, colocaram na minha cabeça chapéuzinho de aniversário. Então, assim foi legal, mas realmente para uma criança não é legal comemorar aniversário nessa data.”
Imagem Divulgação Convite inesperado
O fotógrafo comenta que, em certa ocasião, deixou a barba crescer e, por volta dos 40 anos, apesar de ser jovem, branqueou muito cedo. O que veio a calhar, já que um amigo, proprietário de uma produtora, estava à procura do Papai Noel.
“Ele precisava de um Papai Noel para uma propaganda de uma loja e ele me convidou. Falou que estava difícil de achar, eu já estava de barba, se ofereceu para comprar a roupa e perguntou se eu topava. Disse que sim”, comentou Edgar.
As primeiras filmagens foram de madrugada na loja, e outros takes foram feitos durante o dia para a alegria da criançada, inclusive adultos parando para tirar fotos.
Não é que a barba rendeu? Certa vez, recebeu o convite para fotografar a festa de Natal com familiares de um cliente, com a condição de que fosse trajado de Papai Noel.
“Eu te contrato com a condição de você ir vestido de Papai Noel, porque a minha tia, ela tem 74 anos, tem um sonho de receber o presente do Papai Noel, um desejo que tem desde criança e nunca teve essa oportunidade por morar em uma chácara.”
Das Neves entrou no clima, e após fazer o registro, começou a distribuir os presentes para a criançada da família. Por fim, ficou a senhora, que foi presenteada com uma boneca.
“A irmã dela comprou uma boneca que entreguei e até a peguei no colo, como se fosse uma criança. Levantei e ela, com o presente na mão, ria muito, festejou muito, foi um sonho realizado”, destacou Edgar.
Nasceu de novo
Edgar das Neves Pereira ficou conhecido em todo o Estado por, em 2020, ter sido infectado com a cepa mais agressiva da Covid-19, sendo o primeiro paciente a ser entubado.
A ferocidade do vírus fez com que ficasse em coma por cerca de 21 dias.
“Eu fiquei 40 dias no Regional, fui o primeiro caso grave a sair vivo. Até dei muitas entrevistas na época. O primeiro Natal que passei após receber alta, passei em casa com a minha família. Fiquei fechado por conta da contaminação, mas sou muito grato a Deus por ter me permitido passar por essa experiência. Fiquei muito mal, na verdade foi um milagre. Eu caí e levantei da morte.”
A recuperação durou quatro meses e, posteriormente, a pessoa que nunca imaginou se caracterizar como Papai Noel, com o convite do amigo, passou a fazer trabalhos em escolas.
Mesmo com roupas do dia a dia, em uma situação em que estava na escola, uma criança se aproximou perguntando se ele era o Papai Noel por conta da barba. A resposta não podia ter sido diferente:
“Sou o Papai Noel, mas é segredo, não conta para ninguém, tá? Estou disfarçado.”
Na ocasião, a criança, em sua inocência, queria pedir a troca de presente, dizendo que escreveu algo na cartinha, mas havia mudado de ideia.
Agora, Edgar é avô. Dezembro entrou no calendário e, na próxima Feira do Panamá, estará na praça recebendo doações, tirando fotos e acolhendo crianças.
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