O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) abriu investigação para apurar se houve omissão no atendimento do Conselho Tutelar Sul de Campo Grande às denúncias apresentadas sobre a menina Emanuelly Victória Souza Moura, encontrada morta na última terça-feira (27).
A menina foi sequestrada, abusada e esganada até a morte por Marcos Wiliam Teixeira Timóteo, de 20 anos, colega do padrasto da criança. O MPMS deve investigar se houve falha no atendimento e omissão no caso da menina e se isso teve relação com o caso.
“O objetivo é verificar se houve omissão no cumprimento das atribuições legais do órgão e, em caso positivo, se essa omissão guarda relação com o desfecho trágico noticiado”, relatou o órgão.
De acordo com o posicionamento, “o procedimento tramita em caráter sigiloso, conforme previsto em lei, e todas as providências cabíveis serão adotadas a partir da apuração dos fatos. Neste momento, o caso encontra-se em fase de investigação”.
Somente em 2025, Emanuelly foi atendida três vezes pelo Conselho Tutelar. O primeiro atendimento foi no dia 11 de janeiro, quando a menina, acompanhada pela bisavó de Deivid Bernardes, padrasto da criança, e da irmã de dois anos, após passarem por um atendimento odontológico, e Emanuelly relatar na triagem que sua mãe a havia empurrado.
De acordo com o documento, a menina apresentava sinais de negligência e maus cuidados básicos, além de possuir falhas no topo da cabeça, aparentemente arrancados, sendo confirmados pela menina que afirmou que a mãe “arranca quando está brava”.
Ela também teria afirmado ao Conselho que o pai e a mãe batiam nela, inclusive com chineladas no rosto. A bisavó da criança disse não saber da situação.
No mesmo relato, a menina disse que em sua casa mora um tio que já havia batido em suas nádegas, mas não foi possível identificar se se tratava de violência física ou sexual, ou se era apenas um comportamento natural da família.
O Conselho Tutelar afirma que foi realizada uma visita na residência da criança, um corredor com várias casas, onde a família paterna mora. “A casa, apesar de pequena, era organizada e limpa”, consta no documento.
A mãe de Emanuelly, Patrícia Rayana Souza Barbosa, foi orientada a procurar uma unidade de saúde para regularizar as vacinas da filha e, questionada sobre as falhas na cabeça da criança, ela respondeu que era Emanuelly que cortava o próprio cabelo.
“Já teve vários episódios e o primo Danilinho foi quem cortou o cabelo dela, eu não puxo o cabelo de nenhuma delas, a dona Faustina (bisavó) sabe disso, não entendo por que ela está fazendo isso. Não são falhas, são cortes de tesoura que fizeram”, relatou Patrícia.
Os pais de Emanuelly foram chamados a comparecer à sede do Conselho, onde relataram que não faziam uso de nenhuma droga, somente de cigarro, mas que há quatro anos, quando trabalhavam em uma fazenda, fizeram uso de maconha.
“A casa onde a gente mora é um rolo de família. Ali eu pago luz e água, estava com meu primo que estava alugando lá, mas quando vim de Terenos ‘pra’ cá, conversei com ele e ajeitei lá pra eu morar. Ali parece que ninguém cresce na vida, ninguém se dá muito bem ali naquele lugar, eu quero sair de lá, vou me ajeitar para isso depois”, afirmou Devid.
O Conselho também afirma que os pais foram advertidos e orientados quanto ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sobre a responsabilidade dos pais quanto aos filhos e quanto a preservar suas necessidades básicas, como saúde, educação, cultura, segurança e lazer e que se mostraram receptivos às orientações.
Em 19 de março, o Conselho teria sido chamado à casa de Emanuelly, onde foi relatado que a criança e a mãe estariam sendo vítimas de agressões físicas e psicológicas.
Segundo o relato, a criança apresenta “deficiência cognitiva comprovada por laudo e em menos de um mês foi parar duas vezes no hospital”. Além dos maus-tratos, mãe e filha estariam passando fome.
O último registro de denúncia foi no dia 13 de maio, quando foi feita uma denúncia anônima pelo Disque 100, afirmando que a criança é vitima de maus tratos, sofrendo agressão e que teve um dos braços quebrados.
A denúncia ainda ressaltou que “a vítima não é devidamente alimentada, sofre ameaças de morte e de que será enterrada”, além de que falta à escola com frequência em razão das lesões corporais.
Afirmou, ainda, que os suspeitos das agressões são usuários de drogas e vendem entorpecentes na residência. A Polícia Militar foi acionada e teria comparecido ao local.
Nota do Conselho Tutelar
Em nota, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Campo Grande (CMDCA/CG/MS) se solidarizou com a família, manifestou pesar diante do crime e afirmou que está à disposição para colaborar com os órgãos de apuração.
Leia a nota na íntegra:
O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Campo Grande/MS (CMDCA/CG/MS) manifesta profundo pesar e consternação diante do bárbaro crime ocorrido no último dia 27 de agosto, que vitimou Emanuelly Victória de Souza de apenas 6 anos de idade.
O CMDCA se solidariza com a família e com toda a sociedade campograndense, que sofre diante de tamanha violência contra uma criança.
O CMDCA informa que está averiguando os fatos relacionados ao caso e acompanhando, no âmbito de suas atribuições e as apurações já em andamento pelos órgãos competentes, como Ministério Público, Poder Judiciário, Conselhos Tutelares e demais integrantes da rede de proteção à infância e adolescência.
O CMDCA, como parte integrante da rede de proteção à infância e adolescência, reafirma seu compromisso de zelar pela garantia dos direitos da criança e do adolescente, conforme previsto no art. 227 da Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e destaca que seguirá atuando para fortalecer as políticas públicas de proteção integral, de modo a prevenir e coibir situações de violência e negligência.
Reiteramos nosso respeito e solidariedade à família da Emanuelly, colocando-nos à disposição para colaborar com os órgãos de apuração e para contribuir, dentro de nossa competência, na busca por respostas e medidas que evitem que tragédias como esta se repitam.
O caso
A menina Emanuelly Victória de Souza, de apenas 6 anos, foi estuprada e morta por um conhecido da família, Marcos Willian Teixeira Timóteo, de 20 anos, apelidado de Gordinho, que foi morto pela Polícia Civil um dia depois de sumir com a criança.
Com ela, ele passou cerca de três horas, quando teria abusado da criança por mais de uma vez, antes de matá-la. Após a morte, ele ainda foi trabalhar com o pai da vítima.
Aproximadamente três horas depois de passar com a menina, Marcos volta, desacompanhado, para trabalhar com o pai e tio de Emanuelly. Por volta do meio-dia, um erro de comunicação entre Kenya e sua prima resultou em longas horas de tranquilidade da família.
“A minha prima mandou uma mensagem falando assim ‘o seu irmão falou para sua mãe trazer a Emanuelly, sua mãe não vai voltar não?’ Só que aí eu li a mensagem e eu mandei assim ‘a minha mãe não vai embora agora, ela acabou de chegar’ e tinha uns quatro dias que eu não via a minha mãe e só mandei assim. Então deu a entender que a Emanuelly estava lá”, explicou Kenya, tia da menina.
Às 18h51min, Marcos se despediu dos “companheiros” de trabalho e foi em direção a uma casa, localizada na Rua Dracena, que fica na rua de trás da viela onde é a residência da família da menina.
Naquele momento, o criminoso aparentou falar, durante poucos segundos, com o morador do casebre e pegou uma ferramenta chamada cavucate, utilizada para cavar. Essa, até agora, foi a última imagem do assassino antes de ser morto em confronto com a polícia.
Após terem acesso às imagens de câmeras de segurança, por volta das 23h, constatando que a menina tinha sido levada, a família comunicou à Polícia Civil o desaparecimento da criança, aproximadamente 15 horas depois dela efetivamente ter sumido. Diante das informações e das imagens, os agentes chegaram à casa de Marcos, localizada na Rua Joaquim Manoel de Carvalho, na Vila Carvalho.
Com aspectos de abandono, os policiais adentraram o endereço e avistaram o chão da cozinha sujo de barro e com marcas de chinelo. Em um dos cômodos, embaixo da cama, a polícia localizou uma banheira de bebê, contendo um volume grande enrolado em uma coberta marrom, presa com fita adesiva.
Ao desenrolar o cobertor, foi encontrada Emanuelly, sem vida e com sinais de violência sexual, às 1h30min da madrugada de ontem. Segundo a delegada titular da Delegacia Especializada em Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA), Anne Karine Trevizan, ela foi morta por estrangulamento.
Horas depois, por volta das 9h, Marcos foi localizado pela equipe do Grupo de Operações e Investigações (GOI), na Região do Inferninho, saída para Rochedo.
Após entrar em confronto com os agentes, o criminoso foi baleado. Ele foi socorrido pela polícia até a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Vila Almeida, mas não resistiu aos ferimentos.


